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RELIGIÃO
A Terço Bizantino Ltda. se destina à venda de artigos religiosos; sacerdote diz que firma nunca funcionou
Padre Marcelo registrou empresa em SP
ARMANDO ANTENORE
da Reportagem Local
O padre Marcelo Rossi -a mais
nova estrela da Igreja Católica- é
sócio de uma empresa que se destina à produção e comercialização
de artigos religiosos.
Ele possui metade das cotas da
Terço Bizantino Ltda. - ME, criada
no dia 13 de outubro de 1997 e que
tem como sede um sobrado em
Santana, bairro paulistano da zona
norte. Os outros 50% pertencem à
mãe do sacerdote, Vilma Aparecida Mendonça Rossi.
As informações constam do contrato que constituiu a sociedade e
que está arquivado na Junta Comercial de São Paulo. O acesso à
documentação é público.
Na sexta-feira, em entrevista à
Folha, por fax, o padre confirmou
que registrou a Terço Bizantino,
mas ressaltou que a firma nunca
funcionou nem contratou empregados (leia texto abaixo).
O sacerdote também apresentou
a cópia de um recibo emitido pela
Receita Federal.
O documento, de apenas uma
página, se refere à declaração de
rendimentos da empresa. E mostra
que a Terço Bizantino afirmou ter
permanecido "inativa" durante
"todo o ano-calendário de 1997".
O nome da sociedade coincide
com o de um objeto muito difundido pelo padre. Trata-se de um rosário que se origina da tradição
teológica oriental. Exibe 110 contas, e pode-se rezá-lo mais rapidamente que o da liturgia ocidental,
com 165 contas.
Padre Marcelo costuma pregar
que o terço bizantino "é instrumento de cura física e arma contra
a depressão e o maligno".
Olhos claros, 1m94 de altura, 31
anos, ex-frequentador de academias de musculação, o sacerdote
ganhou notoriedade nacional nos
últimos meses, quando passou a
frequentar programas de televisão
e capas de revistas.
Tornou-se o principal representante da Renovação Carismática,
movimento que rejeita o engajamento de religiosos em questões
político-sociais e adota ritualística
parecida com a dos cultos evangélicos pentecostais (como os da
Igreja Universal).
O padre se converteu, ainda,
num fenômeno do mercado fonográfico, depois de lançar, em setembro, pela PolyGram, o CD
"Músicas para Louvar ao Senhor".
O disco, com 13 faixas, já vendeu
2,7 milhões de cópias.
"É um recorde. Nenhum artista
da gravadora alcançou tamanha
cifra em tão pouco tempo", diz
Ana Fonseca, diretora de business
affairs da PolyGram. A multinacional de origem holandesa se instalou no Brasil há quatro décadas.
O motor do sucesso são as missas
que o sacerdote conduz semanalmente em Interlagos, zona sul de
São Paulo, num terreno batizado
de Santuário do Terço Bizantino,
onde fica o galpão desativado de
uma indústria.
As cerimônias lembram shows
de rock e, não raro, ultrapassam as
duas horas de duração. O padre divide o altar com uma banda, que
dispõe de guitarras, bateria e amplificadores. Canta, inventa coreografias (a mais famosa é a "aeróbica do Senhor") e vê seus gestos se
disseminarem por um telão.
Antes, durante e depois das quatro missas semanais, cinco barracas localizadas dentro do santuário vendem uma série de produtos,
incluindo terços bizantinos.
Lucros e prejuízos
O contrato que se encontra na
junta paulista define a empresa
dos Rossi como uma "indústria e
comércio de artigos religiosos, ramo este que poderá ser ampliado,
reduzido ou modificado".
Esclarece que a firma tem prazo
de duração "indeterminado" e capital social de R$ 20 mil. Os sócios
estão autorizados a "abrir filiais e
sucursais em qualquer parte do
território nacional".
A sigla ME que compõe o nome
da sociedade significa microempresa. Tal designação se aplica às
firmas que apresentam faturamento anual de até R$ 120 mil.
A sexta cláusula do contrato permite que os sócios façam retiradas
mensais "a título de pró-labore"
(remuneração por gerenciarem a
empresa).
A cláusula seguinte estabelece as
regras para a distribuição de lucros
e prejuízos. "Serão divididos ou
atribuídos entre os sócios proporcionalmente."
Pôster
Ninguém sabe com exatidão
quantas pessoas frequentam as
missas no santuário. Fala-se em 30
mil, 40 mil, 60 mil fiéis. Vêm não só
de todo o Brasil, como também da
Argentina e do Paraguai.
Consomem 100 mil hóstias por
mês. Lotam o galpão de 8.000 metros quadrados e, com frequência,
se espalham pelos arredores do
edifício -uma área livre que soma
mais 12 mil metros quadrados.
O terreno pertence à multinacional alemã Bekum, do setor metalúrgico. Já serviu de depósito e hoje está à venda.
Enquanto a empresa não arranja
comprador (quer R$ 7 milhões),
aluga a área para o santuário, embora não revele por quanto nem o
nome do locatário.
Entre as mercadorias comercializadas nas cinco barracas que rodeiam o galpão, chama atenção a
revista "Católicos", publicação
mensal da diocese de Santo Amaro, que custa R$ 3,50 e oferece um
pôster autografado do padre Marcelo.
Outros produtos também ostentam a imagem ou a assinatura do
sacerdote. São livros, CDs, vídeos e
fitas cassetes.
Uma parte tem marcas conhecidas. O livro "Missa de Libertação",
por exemplo, é da editora Vozes.
Mas há aqueles que não fornecem
nenhuma informação sobre o fabricante (caso do vídeo "Missa do
Dia dos Pais").
Há, ainda, os rosários -que, às
vezes, trazem pequenas etiquetas
com a inscrição "Terço Bizantino
-ME", seguida de um telefone.
Sem se identificar, a reportagem
da Folha ligou anteontem para o
número. Quem atendeu disse:
"Terço Bizantino, boa tarde". E explicou que ali funciona um escritório. "Mas não vendemos nada. Só
damos informação sobre missas."
A lista telefônica de São Paulo indica que o número está no mesmo
endereço onde o padre registrou a
empresa. O dono do telefone é o
próprio sacerdote.
Colaboraram
Ivan Finotti, da Reportagem Local,
e Cleber Pinho da Silva, encarregado administrativo
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