São Paulo, sábado, 14 de março de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRIME EM ALAGOAS
Políticos do Estado custam até R$ 50 mil; para "gente do povo, basta raiva", afirma acusado
"Gangue fardada' tem "tabela da morte'

ARI CIPOLA
da Agência Folha, em Maceió

O motorista José Carlos Pereira, 21, acusado de envolvimento com o crime organizado alagoano, revelou ontem em depoimento à Justiça a "tabela da morte", utilizada por pistoleiros de aluguel no Estado. Pereira está preso.
Segundo ele, a chamada "gangue fardada" cobra R$ 50 mil para matar um deputado estadual ou líder político regional "importante". A morte de um trabalhador rural varia de R$ 500 a R$ 1.000. Prefeitos, diz ele, são assassinados por R$ 30 mil. Para vereadores, R$ 15 mil.
"Gente do povo e queima de arquivo dentro da quadrilha é de graça, basta a raiva", disse Pereira, que é ligado ao delegado de Olho d'Água das Flores, Carlos Camilo.
O delegado foi um dos primeiros a ser preso nas operações de combate ao crime organizado alagoano, iniciada em janeiro passado.
Desde 93, oito políticos alagoanos foram assassinados.
A morte do vereador Renildo José dos Santos ganhou destaque nas publicações da Anistia Internacional. Homossexual, ele teve o corpo esquartejado. Partes foram encontradas a até 150 km uma da outra.
Pereira prestou ontem seu segundo depoimento ao juiz da 11ª Vara Criminal de Maceió (AL), Hélder Loureiro, e confessou sua participação, com o delegado Camilo, em assaltos a bancos, postos de combustível e Correios. Ele disse que o delegado é "peixe pequeno" e que fez assassinatos em Pernambuco e na Paraíba.
Porém, ele não revelou os nomes dos chefes, nem das vítimas do delegado e justificou: "trabalhei apenas como motorista, por isso não sei de onde vinham as ordens". Camilo já prestou dois depoimentos ao juiz e nega as acusações.
O grupo é conhecido como "gangue fardada" devido ao grande número de policiais envolvidos. Das 42 pessoas presas, 32 são PMs de várias patentes.
Pereira "decidiu abrir o jogo" depois de ter sido ameaçado de morte no presídio São Leonardo na tarde de anteontem por um irmão do delegado que está preso.
Preocupado com a segurança de Pereira, o juiz decidiu transferi-lo do presídio para uma solitária dentro de uma delegacia de Maceió. O local não foi divulgado.
Desde o início, foram assassinados o subtenente da PM Ednor dos Santos e o sargento Jaime Manoel da Silva Júnior, em emboscadas. A polícia acredita em "queima de arquivo". Documentos achados com o subtenente fizeram a Polícia Federal suspeitar de que ele seria um "tesoureiro do grupo".
As declarações de Pereira reforçaram a tese de entidades de direitos humanos de que o crime organizado seria ainda um grupo de extermínio, eliminando moradores pobres da periferia de Maceió.
Nos últimos 50 dias, foram localizados quatro cemitérios clandestinos no Estado, onde foram encontradas 32 ossadas humanas.
Seis delas foram localizadas no litoral norte de Maceió, a 700 metros da casa que a polícia diz que servia de "quartel-general" dos homens ligados ao delegado Camilo. Lá foram encontradas armas e coletes a prova de bala.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.