|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Setor imobiliário de SP dribla a lei para ocultar doadores
Entidade que doou R$ 6,5 mi em 2008 foi usada por sindicato, proibido de contribuir
Associação foi a segunda maior doadora individual das eleições; sindicato diz que criou a entidade para fortalecer o setor imobiliário
FELIPE SELIGMAN
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O setor imobiliário de São
Paulo, coordenado pelo Secovi,
o sindicato da categoria, usou
uma entidade para driblar a legislação eleitoral -que proíbe
doações de sindicatos- e ocultar os verdadeiros responsáveis
pelas doações feitas pelo setor.
Nas eleições de 2008, ela foi a
segunda maior financiadora individual do país, direcionando
R$ 6,5 milhões a candidatos,
governistas e de oposição, em
sua quase totalidade paulistas.
Atrás apenas da construtora
OAS no ranking do financiamento em 2008, a AIB (Associação Imobiliária Brasileira)
não tem website, não tem escritório em funcionamento, é desconhecida no local informado à
Receita onde funcionaria sua
sede e, segundo seu presidente,
Sergio Ferrador, não tem associados nem receita fixa.
A Folha conversou com sete
candidatos beneficiados pela
AIB. Quase todos afirmaram
que as doações ocorreram em
negociação não com a associação, mas com o Secovi-SP, que
se autodenomina "o maior sindicato do setor imobiliário da
América Latina". A lei proíbe
que sindicatos ou entidades de
classe façam doações eleitorais.
Segundo os políticos, o setor
tem um dos lobbies mais organizados do país e, por isso, centraliza a decisão sobre quem
serão os beneficiados pelas empresas do ramo, informação
confirmada pela AIB. Ferrador
diz que o objetivo é apoiar
"quem está governando" para
defender interesses do setor.
Salto desde 2002
Além de passar por cima da
proibição, a doação por meio da
associação impede que seja feita a ligação entre o real doador
e o beneficiário. A maioria dos
entrevistados falou na condição do anonimato. Alguns dos
que se identificaram disseram
que não conheciam a entidade
antes da doação.
"Recebi a doação na terça da
semana da eleição, depois que
uma revista me apontou como
o melhor vereador da cidade.
Só vim conhecer [a associação]
na quinta", disse José Police
Neto (PSDB), o que mais recebeu recursos entre os candidatos a vereador de São Paulo,
R$ 270 mil. Ele é líder do governo Gilberto Kassab (DEM) na
Câmara e relator do projeto de
revisão do Plano Diretor da cidade, que define entre outras
coisas as regras para o setor
imobiliário. Nega que seja influenciado pelas doações.
"A doação veio via partido",
diz a vereadora Juliana Cardoso (PT-SP), cuja candidatura
teve R$ 40 mil da associação.
As doações da AIB em 2008
foram distribuídas, entre outros partidos, a sete candidatos
do PT, dez do DEM e 13 do
PSDB. Elas assistiram a um salto desde 2002, quando foram
doados R$ 426 mil. Em 2004,
R$ 296 mil. Dois anos depois,
foram R$ 2,4 milhões.
"Se a associação é constituída
como pessoa jurídica para simular uma situação irreal, ela
está burlando a Lei Eleitoral,
que proíbe a doação da entidade sindical", disse Marcus Vinicius Coelho, presidente das comissões de Direito Eleitoral e
de Legislação da OAB.
O presidente do TSE, Carlos
Ayres Britto, não quis comentar o caso sob o argumento de
que pode ter de julgar o episódio. Afirmou apenas que pediu
informações à Receita sobre os
doadores, para detectar se houve descumprimento da lei, que
limita o valor das doações.
No caso de pessoas jurídicas,
elas não podem ultrapassar 2%
de sua renda bruta do ano anterior. Em relação à AIB, sua receita em 2007 não poderia ser
inferior a R$ 324 milhões.
A AIB diz que vale o faturamento somado das empresas
doadoras, o que é contestado
por Coelho: "Não há dúvida de
que o faturamento deve ser o da
pessoa jurídica doadora".
O TSE elaborou o ranking
dos 20 CNPJs individuais que
mais doaram em 2008 a pedido
da Folha. Os R$ 6,48 milhões
doados pela AIB a colocam na
segunda posição, mas algumas
grandes empresas doaram
mais, se somados os CNPJs de
suas controladas e associadas.
No endereço que a AIB informou à Receita, em São Paulo, o
administrador do prédio, Nildo
Pinheiro, disse desconhecer a
entidade. Lá funciona um projeto social -do Secovi.
Texto Anterior: Painel Próximo Texto: Outro lado: Para entidades, ação conjunta do setor é legal Índice
|