São Paulo, terça-feira, 14 de maio de 2002

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JANIO DE FREITAS

Uma decisão suprema

Desde que apenas possível e insinuada, a indicação de Gilmar Ferreira Mendes, por Fernando Henrique Cardoso, para o Supremo Tribunal Federal provocou reações que, afinal indicado o nome ao exame do Senado, já levaram na semana passada ao adiamento desse exame e, marcado para amanhã, se não é uma incógnita, é ao menos uma expectativa tensa. A indicação feita por Fernando Henrique ergue a discussão sobre a necessidade de novos modos para preenchimento de vagas no STF.
Gilmar Mendes foi o assessor jurídico de Fernando Collor na Presidência, sendo desnecessário lembrar o que foi o período. Foi adotado por Fernando Henrique para a mesma função, na qual começaram seus entreveros com o Supremo e com o Congresso, a cada vez que, em um ou no outro, eram rejeitados projetos ou medidas de governo por inconstitucionais ou outra impropriedade jurídica.
Passado da assessoria jurídica ao cargo de advogado-geral da União, Gilmar Mendes elevou sua agressividade com o Judiciário em geral e o Supremo em especial, chegando a defini-lo como "manicômio judiciário" - no qual pleiteia ao Senado sua entrada.
A mensagem de indicação está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado. Na quarta-feira passada, o exame foi iniciado, com a presença de Gilmar Mendes, e suspenso por pedido de vistas do senador Eduardo Suplicy, em seguida à apresentação de um requerimento do ex-presidente da Ordem dos Advogados Brasil Reginaldo de Castro.
Pela importância desse documento que requer ao Senado os procedimentos minimamente indispensáveis, mas costumeiramente relegados, na nomeação para a mais alta corte de Justiça, transcrevo-o na íntegra. Está dirigido ao presidente da Comissão, senador Bernardo Cabral.
"Reginaldo Oscar de Castro [seguem-se os dados de identificação", com fundamento no art. 90, IV combinado com o art. 383, letras "a" e "d" do Regimento Interno do Senado Federal, vem expor e afinal requerer a V. Excia. o seguinte:
"O requerente, advogado e, obviamente, cidadão brasileiro, militante assíduo nos tribunais superiores, também ex-presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, do qual, como V. Excia., é Membro Honorário Vitalício, tem conhecimento de que a referida mensagem presidencial [de indicação de Gilmar Mendes" limitou-se a anexar o curriculum vitae do indicado, sem comprovar a inexistência de ações judiciais em que seja parte o candidato.
"A circunstância ganha especial relevo tendo em vista fatos públicos e notórios que dão conta da existência de ações penais e de improbidade administrativa movidas contra o dr. Gilmar Ferreira Mendes, conforme notícias constantes dos sítios na internet do Supremo Tribunal Federal e da Justiça Federal, Seção Judiciária do Distrito Federal.
"Não se pretende que seja pura e simplesmente recusado o nome do indicado, mas sim que o Senado Federal, no uso da grave responsabilidade constitucional de sabatinar os futuros membros do Supremo Tribunal Federal, exija "amplos esclarecimentos sobre o candidato", nos termos precisos da letra "a" do art. 383 do Regimento Interno dessa Casa.
"De qualquer cidadão candidato a financiamento de imóveis no Sistema Financeiro da Habitação ou para compra direta de qualquer imóvel, mínimo que seja, exigem-se certidões negativas dos cartórios judiciais de distribuição, de natureza cível, criminal, na Justiça comum e na Federal, quanto mais para ingresso em cargo público máximo da magistratura nacional.
"Ademais, a letra "d" do mesmo art. 383 permite que a Comissão realize investigações e requisite das autoridades competentes informações complementares, de tal forma a viabilizar ampla avaliação do essencial requisito da reputação ilibada, que deverá ser preenchido pelo candidato.
"Portanto, revela-se indispensável a complementação da mensagem presidencial com a juntada [pela Comissão" de certidões negativas e positivas, bem como as informações da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Distrito Federal, onde [Gilmar Mendes" tem inscrição, sobre eventuais processos éticos a que responde, permitindo-se ao candidato amplo direito de justificá-los perante essa egrégia comissão, afastando qualquer inquietação da opinião pública brasileira sobre aquele que poderá ser um dos membros vitalícios da mais alta corte de Justiça do país.
"Diante do exposto, pede e espera o peticionário seja convertida em diligência a apreciação da proposta do exmo. sr. presidente da República, incluída na pauta extra dessa Comissão para a sessão a realizar-se amanhã, 8 de maio [quando houve o adiamento", para que seja complementada a documentação imprescindível à certeza de que o eminente candidato, não obstante os processos a que responde, é um cidadão que satisfaz o requisito constitucional da reputação ilibada."
A Associação dos Magistrados Brasileiros emitiu nota oficial, no fim de semana, em que questiona a modalidade de nomeação dos ministros do Supremo e repele a indicação de Gilmar Mendes. A nota deverá chegar hoje aos senadores. O relator, na Comissão, é o senador Lúcio Alcântara, integrante da bancada governista.



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