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ELIO GASPARI
Lula confunde Congresso e torcida
Nosso Guia usa o poder do
governo junto às centrais
sindicais para desrespeitar
a Câmara dos Deputados
LULA ESTÁ construindo uma
relação imperial e desrespeitosa com o Congresso. Disse o
seguinte na semana passada, um dia
depois de uma decisão da Câmara
que estendeu aos aposentados o
reajuste de 16,6% concedido aos trabalhadores que ganham salário mínimo:
"Eu digo sempre, a votação do salário mínimo no Congresso Nacional, ontem, não foi uma coisa séria,
porque o que estava lá para ser votado era um acordo que tinha sido feito pela primeira vez na história do
Brasil, com todas as centrais sindicais e todos os aposentados, representados pelas centrais sindicais".
Lula oferece um reajuste de 5%
aos 13 milhões de aposentados do
INSS. Os 16,6% da Câmara custariam R$ 8 bilhões anuais. A maior
parte desse dinheiro iria para cidadãos que ganham menos de R$ 500
por mês. Nada a ver com o Bolsa-Ditadura de Nosso Guia (R$ 4.294
mensais, em maio passado). Há fortes argumentos contra o novo índice de reajuste, e o presidente da República dispõe do poder de veto para esterilizar a iniciativa.
Como o próprio Lula diz, "quando
a gente é oposição, pode gargantear,
pode blefar". Quando a mesma gente é governo, o presidente não deve
dizer que uma votação da Câmara
"não foi uma coisa séria". Nem mesmo quando os deputados absolvem
seus companheiros do mensalão.
Lula tem 30 anos de vida pública,
27 dos quais na oposição. Só ele sabe
quanto tempo consumiu garganteando e blefando. Parolagens e
mistificações não são atributos exclusivos do governo (como achava
Lula) nem da oposição (com acha
Nosso Guia). As 53 palavras do seu
discurso carregam um entendimento desordenado do que é o Congresso e do que são as entidades que
defendem interesses de corporações.
"O que estava lá para ser votado"
não era um acordo. Era uma medida
provisória do Poder Executivo. O
Congresso não vota acordos, nem
de centrais sindicais, nem de torcidas organizadas. As centrais sindicais não representam "todos os aposentados". Representam, quando
muito, os sindicatos a elas filiados.
Quem representa aposentados,
vendedores de rapadura e donos de
oficinas mecânicas é o Congresso,
poder republicano estabelecido para isso.
Lula abusa da proteção da inimputabilidade cultural. Quando revela que Napoleão foi à China e Oswaldo Cruz inventou a vacina da febre
amarela, pode-se fingir que isso não
tem importância. Contudo, quando
o presidente da República, formado
nas mumunhas do sindicalismo, sugere que um acordo de centrais sindicais é uma peça legislativa, o erro
deixa de ser banal. É confusão funcional. Chama-se fascismo a organização política na qual o Poder Executivo embaralha centrais sindicais
e Poder Legislativo. O Brasil viveu
esse sonho de governantes e pelegos
durante o Estado Novo.
Lula vem cozinhando uma reforma sindical que tunga os trabalhadores e amplia o poder das centrais.
Ele sabe o que está fazendo. Fortalecer agrupamentos amigos é hábito
antigo.
Em 1979, o governo federal e a indústria paulista louvaram um acordo feito pela Federação dos Metalúrgicos. Ela representava 29 sindicatos. O de São Bernardo pulou, foi à
greve e projetou nacionalmente a
imagem de um sindicalista que inebriava a multidão no estádio de Vila
Euclides. Foi a primeira experiência
de Lula com o êxtase do fracasso,
mas essa é uma história velha.
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