São Paulo, domingo, 14 de agosto de 2005

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MEMÓRIA

Deposto do governo de Pernambuco pelo regime militar em 64, presidente nacional do PSB estava internado havia 57 dias

Ícone da velha esquerda, Arraes morre aos 88

Chico Ferreira - 9.dez.1989/Folha Imagem
Miguel Arraes, então governador de Pernambuco, com Lula e Leonel Brizola em comício durante o segundo turno das eleições de 1989


FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

Morreu na manhã de ontem, em Recife (PE), o presidente nacional do PSB, deputado federal Miguel Arraes de Alencar, 88.
Segundo o médico de Arraes, Ciro de Andrade Lima, a morte foi causada por um "choque séptico [infecção] refratário a medicação, provocado por infecção respiratória agravada por insuficiência renal".
O parlamentar estava internado na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do hospital Esperança havia 57 dias. O velório será realizado no Palácio Campos da Princesa, sede do governo do Estado.
O corpo chegou ao palácio às 18h40 de ontem. Cerca de cem pessoas, que já estavam no local, cantaram o Hino Nacional e bateram palmas como homenagem.
A expectativa da Polícia Militar é que 200 mil pessoas devam ir ao velório. O enterro de Arraes está previsto para hoje, às 16h, no cemitério de Santo Amaro, em Recife. Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decretou luto oficial por três dias e disse que vai comparecer ao enterro. O prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB), também afirmou que vai a Recife.
O estado de saúde de Arraes agravou-se na madrugada de ontem, com a constatação de que a infecção pulmonar, problema que o levou à hospitalização do deputado, havia se generalizado. Sua pressão sangüínea caiu bruscamente, e, às 11h40, ele morreu.
Fumante por 72 anos, Arraes foi internado em 17 de junho, inicialmente com suspeita de dengue. No hospital, o parlamentar apresentou ainda problemas cardíacos e renais. Foi submetido a uma traqueostomia e a duas cirurgias para conter hemorragias no duodeno e no pulmão esquerdo.
Até a noite de sexta-feira, o deputado estava "consciente e orientado", segundos os médicos.
Sua pressão arterial, entretanto, vinha sendo mantida com a ajuda de medicamentos. Máquinas ajudavam-no a controlar a respiração. Os rins pararam de funcionar na semana passada, obrigando os médicos a submetê-lo a sessões diárias de hemodiálise.
O anúncio da morte do líder socialista provocou alvoroço no saguão do hospital. Políticos, parentes e amigos começaram a chegar ao local por volta do meio-dia.

Carreira
Miguel Arraes de Alencar nasceu em 1916, em Araripe (CE), mas construiu sua carreira política em Pernambuco, Estado que governou por três vezes.
Formado em direito, o deputado era aliado de Lula, apesar de manter divergências políticas com o PT pernambucano. Seu neto e único herdeiro político, o ex-ministro da Ciência e Tecnologia Eduardo Campos, é pré-candidato ao governo em 2006.
Lula chegou a visitar o parlamentar no hospital, durante passagem por Recife, no último dia 20. O presidente entrou na UTI e disse: "Você precisa se levantar daí, está na hora de voltar para a luta". Arraes acenou com os dedos polegares voltados para cima.
Quase mitificado no interior do Estado, onde era tido como intransigente defensor dos pobres, Arraes foi deposto pelo regime militar, em 1964, durante seu primeiro mandato no governo.
Preso por quase um ano em Fernando de Noronha, conseguiu um habeas corpus e buscou exílio na Argélia, onde ficou até 1979. Beneficiado pela Lei da Anistia, voltou a Recife em setembro de 79. Em 1986, conquistou seu segundo mandato como governador, derrotando José Múcio Monteiro. Em 1994, retornou ao poder pela terceira vez, batendo Gustavo Krause, ambos à época do PFL.
Nesse mandato, foi acusado, com seu neto e então secretário da Fazenda, de envolvimento em irregularidades com a negociação de precatórios. Os dois foram inocentados pela Justiça, mas o episódio abalou sua campanha para a reeleição, em 1998.
Disputando o cargo com o ex-aliado Jarbas Vasconcelos (PMDB), Arraes, tido até então como um político imbatível nas urnas, sofreu sua maior derrota política. Jarbas foi eleito com um milhão de votos de diferença.

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