São Paulo, domingo, 14 de outubro de 2007

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Lula admite disputar novo mandato, mas só em 2014

Petista afirma que apoiaria Aécio se ele entrasse no PMDB

Presidente propõe mandato de 5 ou 6 anos, sem reeleição

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva diz que poderá disputar um terceiro mandato em 2014 ou 2015: "A conjuntura do momento vai indicar". Em entrevista à Folha, ele afirmou apoiar a emenda que acaba com a reeleição, desde que o mandato seja estendido para cinco ou seis anos. Quer uma candidatura única à Presidência dos partidos aliados -"se tiver quatro candidatos no campo do governo, o governo vai ficar imobilizado"- e admitiu apoiar o governador Aécio Neves (PSDB-MG): "Se entrasse no PMDB e fosse candidato da base, não teria problema nenhum. Mas precisaria saber se a base quer".


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva concede entrevista à Folha na quarta, que foi acompanhada pelo ministro Franklin Martins

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em conversa de uma hora e meia na manhã de quarta-feira no Palácio do Planalto, Lula rejeitou tentar a re-reeleição em 2010. "Não existe hipótese para o bem do Brasil, para o bem da democracia e para o meu bem".
Bem-humorado, Lula (que completará 62 anos no dia 27) contou que aceitara convite da Aeronáutica para voar num caça a 45 mil pés (13,7 km) de altitude: "Vai dar para ver a curvatura do globo terrestre". Pediu café e fez introdução de cinco minutos sobre as realizações do governo: "Hoje, sou um homem convencido de que o Brasil se encontrou enquanto nação".  

FOLHA - No primeiro mandato, FHC disse: "Governar é fácil". Ulysses Guimarães falou que o poder era "afrodisíaco". O que pensa?
LULA
- Governar não é fácil. Tomar decisões nem sempre é fácil. Muitas vezes há choque do interesse do Estado com interesse de uma parte da sociedade, divergências entre dois ministros, pressão de interesses econômicos. Muito difícil governar. Para governar bem, é preciso determinação de fazer as coisas acontecerem.

FOLHA - O poder é afrodisíaco?
LULA
- Não pelo lado sexual, mas pela adrenalina que toma conta de você. Você não vai mais a um restaurante, a uma festa: você vive por conta disso [poder] e isso te motiva. Às vezes, ligo para os ministros de noite cobrando coisa. Isso toma conta da gente, dá energia. Tinha muitas dúvidas sobre o segundo mandato: sempre achei que no segundo mandato você começaria a entrar na mesmice e iria cansando. Encontrei com o Fernando Henrique no velório do Frias [Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha, morto em abril] e eu estava comentando com ele o segundo mandato. E ele dizia: "Você vai ver depois do segundo ano, quando as pessoas já estão pensando no sucessor". Adquiri consciência de que quero chegar ao final do mandato com os políticos querendo que eu suba em palanque. Não tem nada pior do que chegar ao final sendo recusado pelos seus aliados. Imagina um presidente que não pode ir a um comício porque ninguém quer que ele vá lá.

FOLHA - Se o sr. chegar ao final do mandato com imagem forte não despertará uma onda queremista, o Lula 2010? Muita gente acha que o sr. vai tentar a re-reeleição.
LULA
- Porque no Brasil tem muita gente que não quer levar a política a sério. A alternância do poder é educadora para a construção da democracia. Não existe ninguém insubstituível.

FOLHA - Está vacinado contra a tentação?
LULA
- Não existe hipótese para o bem do Brasil, para o bem da democracia e para o meu bem.

FOLHA - Descarta ser candidato a presidente em 2014 ou 2015 [quando terá quase 70 anos]?
LULA
- Não. Em política, seria infantil da minha parte dizer que vou decidir o meu destino em 2014, 2015. Tenho uma filosofia que aprendi com a minha mãe: "Rei posto, rei morto".
Lembro que Juscelino Kubitschek imaginava voltar depois e não voltou. Não posso trabalhar em momento nenhum com essa hipótese na minha cabeça porque será o meu fracasso. Essa coisa, se tiver de acontecer, a conjuntura do momento vai indicar. Até porque quero dar um exemplo de ex-presidente: quero deixar a Presidência e não vou virar palpiteiro.

FOLHA - Apóia a emenda que acaba com a reeleição?
LULA
- Um mandato de quatro anos é muito pouco. O presidente toma posse em 1º de janeiro. No primeiro ano não faz nada porque o Orçamento já está comprometido. No segundo, quando começa a fazer, tem eleições municipais: seis meses antes da eleição não pode fazer convênio com nenhuma prefeitura. Então, já tem um ano e meio morto. Depois tem outro ano para governar e, no ano seguinte, tem eleição. Um mandato de quatro anos no Brasil é quase inadministrável. Vamos acabar com a reeleição e aumentar o mandato.

FOLHA - Apóia a emenda?
LULA
- Apóio, apóio. Se não aumentar o mandato, é melhor ficar a reeleição. Sei que para a oposição é ruim, porque ela sempre acha um mandato mais longo difícil, uma reeleição difícil, mas é importante que um presidente tenha a possibilidade de concluir um projeto.

FOLHA - Por que o sr. fala em candidatura única em 2010? Não seria melhor lançar vários candidatos e apoiar o que chegasse ao 2º turno?
LULA
- Tenho uma base de apoio com vários partidos. Todo o meu esforço será para uma candidatura única. É um sonho. Vai se concretizar? Não sei. Se tiver quatro candidatos no campo do governo, o governo vai ficar imobilizado. Daqui a pouco vai estar o PT brigando com o PMDB, que briga com o PSB, que briga com o PC do B, que briga com o PR, que briga com o PDT. Ficamos brigando entre nós e deixamos nossos adversários tranqüilos. Precisamos fazer a briga interna e construir a possibilidade de candidatura única. Há o cargo de presidente, de vice, dois senadores, governadores. Tem cargo para todo mundo.

FOLHA - O PT não aceita deixar de lançar candidato a presidente.
LULA
- É normal todo mundo achar que tem de ter candidato. Mas, entre achar e fazer, tem uma diferença muito grande.

FOLHA - Vai tirar licença para fazer campanha se tiver um candidato só?
LULA
- Se estiver ótimo, vou ajudar os candidatos exercendo o mandato de presidente. Não tem nada melhor para ajudar os meus aliados de que o governo estar bem. Se o governo estiver bem, posso continuar fazendo as viagens internacionais e deixando a eleição correr. Se o governo estiver mal, muitas vezes pode acontecer de o governo estar mal e o presidente estar melhor do que o conjunto do governo. Aí tomo a decisão.

FOLHA - Se Aécio entrasse no PMDB, o sr. o apoiaria a presidente?
LULA
- Se entrasse no PMDB e fosse candidato da base, não teria problema nenhum. Mas precisaria saber se a base quer.

FOLHA - O governo do sr. repete e até acentua a cultura política da fisiologia, distribuindo cargos no governo e emendas a parlamentares como forma de mantê-los fiéis. O sr. desistiu de romper com a fisiologia?
LULA
- Uma coisa é a política real. Outra coisa é a interpretação que vocês [imprensa] dão à política real. Quero explicar isso. Nós estamos num governo de coalizão. Isso não vale para o Brasil. Vale para o mundo. Se você olhar a Angela Merkel [chanceler alemã], ela ganha as eleições e faz composição.

FOLHA - É correto condicionar o voto ao governo a verba ou cargo?
LULA
- Não é correto. Aqui não se trabalha assim. Quando propus aos partidos uma coalizão, é justo montar o governo com os partidos da coalizão. Não é correto montar com o PT e ficar pedindo o voto dos outros.


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