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Arrocho fiscal retira R$ 3,9 bi da área de ciência e tecnologia
Neste ano, 39% das verbas para fundos setoriais devem ser desviadas para pagar dívidas
Contingenciamento vem caindo desde 2004; em 2002, cerca de 70% dos recursos arrecadados para o setor foram retidos
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dinheiro suficiente para
construir os 700 quilômetros
de canais de concreto da transposição do rio São Francisco
-a megaobra dos sonhos de
Luiz Inácio Lula da Silva- foi
desviado nos últimos anos de
investimentos em capacitação
e inovação tecnológica para o
pagamento da dívida pública.
Pesquisa no Siafi (sistema de
acompanhamento dos gastos
federais) mostra que estão bloqueados para investimentos
em pesquisa R$ 3,9 bilhões do
Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que reúne, por sua vez, 15
fundos setoriais.
É dinheiro arrecadado sobretudo com a Cide (Contribuição
de Intervenção no Domínio
Econômico) incidente sobre
remessas ao exterior por uso ou
compra de tecnologia, além de
percentuais do faturamento de
empresas.
Os recursos deveriam, por
lei, financiar a capacitação
científica e tecnológica e aumentar a competitividade da
economia brasileira. Mas, na
prática, ajudam a pagar a dívida. As chances de o dinheiro já
desviado voltar para investimentos na área são consideradas nulas pelo governo.
"Desde que a dívida pública
aumentou muito nos anos 90, a
área econômica retém recursos
de todas as receitas de impostos, taxas e contribuições para
pagar os encargos da dívida.
Lembro que a dívida da União
passou de 30% para 55% do
PIB (Produto Interno Bruto)
entre 1994 e 2002. Então é difícil para a área econômica abrir
mão de algumas receitas", ponderou Sérgio Rezende, ministro da Ciência e Tecnologia.
O problema não é exclusivo
da área de Ciência e Tecnologia. Volumes ainda maiores de
recursos foram bloqueados nos
últimos anos dos fundos da
área de telecomunicações (R$
5,1 bilhões, segundo o Siafi). Do
Fundo Aeronáutico, que também ajuda a custear o sistema
de controle do tráfego aéreo, foi
congelado R$ 1,9 bilhão, aponta
pesquisa feita pela organização
não-governamental Contas
Abertas.
No conjunto dos fundos, o
bloqueio supera R$ 30 bilhões,
em números aproximados e
sem detalhamento de prejuízo
às atividades. O chamado contingenciamento ajuda o país a
cumprir as metas de superávit
primário (diferença entre receita e despesa destinada ao pagamento dos juros da dívida).
Só em 2010
Três anos depois de terem sido criados, os fundos setoriais
de ciência e tecnologia tiveram
o pior momento do ponto de
vista de congelamento de gastos em 2002, quando o desvio
do dinheiro beirou 70% do valor arrecadado.
Desde 2004, quando o contingenciamento foi de 57%, os
percentuais vem sendo reduzidos. A expectativa é que represente 39% da arrecadação em
2006 e caia para 36% em 2007.
Ou seja, parcela da arrecadação
dos fundos setoriais ainda financiará a dívida pública.
Durante a campanha eleitoral, a Folha perguntou ao então
candidato à reeleição se os recursos dos fundos setoriais para financiamento de ciência e
tecnologia seriam integralmente aplicados em sua atividade-fim. Lula esquivou-se da
resposta. De acordo com o Ministério de Ciência e Tecnologia, o compromisso do governo
é acabar com os desvios apenas
em 2010, último ano do segundo mandato do petista.
Questionado sobre o que deixou de ser feito em pesquisa
tecnológica por conta do contingenciamento, Rezende responde: "Com certeza, é possível dizer o que não teríamos
feito se o nível de contingenciamento fosse os 68% que encontramos em 2003".
Os R$ 2,7 bilhões que os fundos foram autorizados a gastar
desde 99 são responsáveis pela
modernização de laboratórios
oficiais que ajudam a prevenir
a febre aftosa, pela Rede Nacional de Pesquisa de Alta Velocidade e por centenas de projetos
de cooperação entre empresas
e universidades, lista.
"Cada ministro trabalha para
defender o orçamento de sua
área", continua Rezende, que
comemora a redução do percentual de bloqueio do dinheiro dos fundos setoriais.
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