São Paulo, terça-feira, 14 de dezembro de 2004

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JANIO DE FREITAS

Os craques do Planalto

Na historiada de revela/ não revela documentos tidos como secretos, o governo acabou se enrolando tanto quanto os militares. Há dois anos esse assunto martela em cima de Lula com freqüência diária. Se Lula e os manda-chuvas da Presidência não perceberam o custo, para os militares, da longa persistência do assunto, de uma equipe presidencial se esperaria que percebesse ao menos o seu próprio problema. Deu-se o oposto: de cada vez que as cobranças públicas os obrigaram a mover-se, Lula e o grupo palaciano mais se enredaram, até chegarem ao patético na madrugada da última sexta-feira.
A necessidade de que os ministros da Justiça e dos Direitos Humanos entrassem pela madrugada em múltiplas negociações, com palacianos e militares, para recompor as regras (adulteradas) de abertura do sigilo, já é um despropósito em assunto que se espicha por tantos meses. O motivo que agitou Marcio Thomaz Bastos e Nilmário Miranda é, porém, ainda mais espantoso: o texto divulgado mais cedo pela Presidência, em vez de diminuir, como fora afinal acertado e divulgado, aumentava os prazos de abertura de documentos. É incrível que algo assim aconteça em uma Presidência da República, pior ainda se superlotada de ministros e assessores. O velho Freud explicou direitinho os lapsos induzidos por desejos reprimidos, mas até lapsos assim têm lugar e hora inaceitáveis.
As regras de governo e política não são diferentes das demais regras. E uma destas, entre as mais simples, ensina que, se deixarmos um problema crescer, é certo que crescerá. Na multidão que habita a Presidência isso ainda não é sabido. Os exemplos se sucedem, semana após semana. Mais um se oferecia às manchetes, enquanto a encrenca com os documentos secretos subia ao seu paroxismo: a decisão do PMDB de desligar-se do governo.
Adotado na convenção do fim de semana, o desligamento provém, em boa parte, de um problema que a Presidência deixou crescer até que, ao tentar agir, já perdera qualquer possibilidade de controlá-lo. Foi o problema da reeleição de José Sarney e João Paulo Cunha para as presidências do Senado e da Câmara. O governo não cuidou dos meios para reelegê-los, nem buscou a solução alternativa. Com isso, facilitou a fertilização de insatisfações no PMDB. E tem, agora, um risco sério com a probabilidade de presidências insatisfatórias na Câmara e no Senado. O que, somado à atitude hostil de peemedebistas e ao rompimento também do PPS com o governo, é promessa de um senhor problema para os craques da Presidência deixarem crescer até explodir sobre eles.
Quando ficarem um pouco menos cheios de si, os da Presidência talvez se dêem conta da desproporção entre a imagem que se fazem e a imagem do que fazem.


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