São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 2006

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QUESTÃO AGRÁRIA

Famílias que já estavam na terra e só receberam regularização documental figuram como novos assentados

Governo volta a inflar total de assentamentos

EDUARDO SCOLESE
RUBENS VALENTE

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo Luiz Inácio Lula da Silva, que anunciou ter cumprido a meta de assentamentos rurais de 2005, voltou a inflar seus balanços de reforma agrária ao incluir entre os "assentados" famílias que já estavam na terra e que só receberam regularização documental. Além disso, reconheceu como da União projetos de assentamentos criados em anos anteriores por governos estaduais.
Segundo documento do Ministério do Desenvolvimento Agrário, das 127,5 mil famílias assentadas, 51,3 mil (40%) ou já estavam na terra havia anos ou foram colocadas em projetos antigos -de antes de 2005.
Indagado sobre os números em seu Estado, o superintendente do Incra no Maranhão, Raimundo Monteiro dos Santos, explicou que há dois tipos de "assentamento". "Há assentamento que já existe, mas não está completo, aí a gente vai e completa com outras famílias que estão precisando. Ou então [famílias] que moram lá e que não têm documentos."
O cumprimento da meta estabelecida pelo governo para o ano passado, 115 mil famílias, deverá ser anunciado nesta semana.
Acomodar sem-terra em projetos antigos e tratar como novo assentado aquele que já estava na terra e passou a receber créditos da União não é uma prática ilegal, mas destoa das diretrizes dos petistas quando na oposição e se assemelha ao modo que o governo Fernando Henrique Cardoso utilizou para inflar seus balanços anuais de reforma agrária.
Em 2003 e 2004, o governo não conseguiu cumprir suas metas de reforma agrária. No ano passado, teve sucesso. Para isso, por exemplo, tratou de reconhecer como seus alguns projetos de assentamento criados por governos estaduais. Na prática, dá créditos a famílias já assentadas nos Estados e passa a contabilizá-las em seu balanço anual de reforma agrária.
Assentar em projetos antigos também significa preencher lotes abandonados por outros trabalhadores rurais. O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) faz a varredura nos Estados para localizar espaços vagos em projetos de assentamentos e, em seguida, seleciona famílias para ocupar tais espaços.
Os movimentos sociais criticam esse procedimento, pois avaliam que um lote tornou-se vago justamente pela falta de infra-estrutura (água tratada, energia elétrica e rede de esgoto) do assentamento.
Outra forma que o governo Lula tem utilizado para inchar seus balanços, como no caso atual do Maranhão, é a simples regularização documental de famílias que já viviam nos assentamentos há anos. O trabalhador rural entrega nome completo e CPF (Cadastro de Pessoa Física) ao governo e vira assentado.
A reforma agrária em Rondônia tinha a meta de assentar 2.000 famílias, chegou a 1.741. A checagem dos números, no entanto, revela que apenas 14 famílias efetivamente passaram a ocupar assentamento criado em 2005. O restante foi alocada em áreas já existentes, com infra-estrutura construída em anos anteriores.
A superintendente interina do Incra no Estado, Maria Amália, admite a instalação de famílias em lotes vagos de projetos antigos. "[Eram] lotes vagos e retomados de outras pessoas que não tinham o perfil da reforma agrária. E lotes abandonados também".


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