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QUESTÃO AGRÁRIA
Movimento escolhe como adversárias indústrias de biotecnologia e grandes importadoras de alimentos
Marketing do Greenpeace inspira MST
THOMAS TRAUMAN
DA REPORTAGEM LOCAL
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) ampliou o seu leque de adversários e
reformulou a sua estratégia de
marketing, inspirada nas atividades do Greenpeace.
Além do governo federal e dos
fazendeiros, alvos tradicionais do
movimento, o MST escolheu como novos adversárias as indústrias de biotecnologia e as grandes
importadoras de alimentos.
O novo marketing inclui ações
de impacto que ganhem as primeiras páginas dos jornais. Internamente essas ações são chamadas de "pedagogia do exemplo".
Os casos mais recentes da nova
tática foram as destruições em
duas semanas de duas lavouras
que teriam soja transgênica
-uma delas uma fazenda experimental da multinacional de biotecnologia Monsanto.
"Uma ação como a da Monsanto pode chocar a sociedade num
primeiro momento, mas depois
leva à reflexão. Agora as pessoas
estão discutindo de que forma os
transgênicos afetam a saúde", disse Gilmar Mauro, da coordenação
nacional do MST.
Os transgênicos foram escolhidos pelo MST como alvo não apenas pela polêmica do seu uso entre médicos e ambientalistas, mas
principalmente porque a tecnologia cria uma relação de dependência entre os agricultores e a fábrica de sementes.
É que as sementes transgênicas
são patenteadas, o que significa
que só podem ser usadas sob licença da companhia fabricante.
Os importadores são considerados adversários porque o MST
passará a ter como uma das suas
principais bandeiras a "soberania
alimentar", a proposta para que o
país produza internamente todos
os alimentos que consome.
Isso não significa, porém, que o
MST vá parar com as suas mobilizações tradicionais. Mais de 1.500
famílias estão acampadas na beira
de rodovias do Rio Grande do Sul
em uma prévia de novas de invasões de terras.
O que multinacionais de biotecnologia, importadores de alimentos e invasões de terra têm em comum? A resposta foi dada em
uma palestra recente pelo líder do
MST João Pedro Stedile.
"A luta pela reforma agrária não
depende apenas de lutar contra o
latifúndio, mas de derrotar o modelo econômico. E este modelo
coloca toda a produção de sementes nas mãos de seis multinacionais e faz o país ser dependente
das importações de alimentos."
Ele usou a ação contra a Monsanto como exemplo. "Não basta
mandar a Monsanto para fora do
país, mas usar essa luta como uma
forma simbólica, pedagógica, de
mostrar ao povo que esse modelo
é um perigo." Os militantes do
MST aderem a atividades contra
possíveis monopolizadores de sementes e importadores de alimentos também por causa da
concorrência com seus produtos.
Para o público, o MST pretende
escolher alvos simbólicos, como a
propriedade de uma empresa, um
navio graneleiro ou ainda a sede
de um banco internacional.
A avaliação de marketing também está influenciando as formas
como o MST enfrenta o governo.
Para combater o projeto do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) de cadastrar famílias pelos Correios, o
MST está incentivando a adesão
ao programa. A intenção é cadastrar dezenas de milhares de famílias no programa e criar demanda
por uma resposta do governo.
"A sociedade apóia a reforma
agrária, mas não vê com bons
olhos as ocupações. Então vamos
reunir os cadastrados, fazer assembléias, passeatas, chamar a
atenção dos prefeitos e comprovar para a sociedade que essa proposta de reforma agrária do governo é só no papel, que a ocupação é a forma de pressionar pela
reforma agrária", disse Mauro.
Internamente, o MST também
quer mudar a sua mensagem. A
intenção é tornar os assentamentos uma opção ao êxodo rural e
não uma alternativa econômica
para ex-lavradores e pequenos
agricultores falidos.
É uma consequência da avaliação geral de que a pequena agricultura tem baixas possibilidades
de sobrevivência na competição
com os grandes produtores.
Segundo as contas do MST, foram assentadas 350 mil famílias
nos últimos 15 anos. Mas, apenas
nos últimos oito anos, 820 mil famílias de pequenos produtores
deixaram as suas terras.
O MST quer que os assentamentos não atraiam famílias em
busca de renda, mas se tornem
comunidades rurais para quem
deixou sua propriedade. "Os assentamentos podem ser vistos como uma opção de qualidade de
vida, comparados com a periferia
das grandes cidades", diz Mauro.
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