|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Filho de Sarney ajudou a fazer
"consórcio paralelo", afirma PF
TCU também vê manobra "ilícita" e "grave" na ferrovia Norte-Sul, obra do PAC
Grampos mostram que
acordo incluiu empresa de
fachada e pagamento de
propina; empresário vê
"denúncias requentadas"
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
RENATA LO PRETE
EDITORA DO PAINEL
O empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP),
ajudou a fechar acordo clandestino pelo qual um grupo de
empreiteiras burlou o processo
de licitação e é acusado de desviar dinheiro público da principal obra ferroviária do país.
A fraude, apontada pela Polícia Federal e pelo Tribunal de
Contas da União, deu-se em um
trecho da ferrovia Norte-Sul.
Orçada em mais de R$ 1 bilhão,
a construção faz parte do PAC
(Programa de Aceleração do
Crescimento), a vitrine eleitoral da pré-candidata à Presidência Dilma Rousseff (PT).
O projeto é administrado pela Valec, estatal ligada ao Ministério dos Transportes há
anos sob influência direta de
José Sarney. Ulisses Assad, diretor da empresa à época do esquema, foi nomeado por indicação do presidente do Senado.
A licitação para o contrato
013/06, que trata do trecho entre os municípios goianos de
Santa Isabel e Uruaçu, foi vencida pela Constran. Porém, numa subcontratação "ilícita" e
"grave", nas palavras do TCU,
as construtoras EIT e Lupama
passaram a participar da obra.
Por meio desse acerto, apelidado pelos peritos da PF de
"consórcio paralelo", empreiteiras driblam o resultado de
concorrências e repartem "por
fora" contratos públicos no
país, conforme mostraram reportagens da Folha.
Logo após vencer a licitação
do lote Santa Isabel-Uruaçu, de
R$ 245,5 milhões, a Constran
firmou um acordo com as duas
outras construtoras, repassando a cada uma 16,65% da empreitada. O combinado foi feito
sem análise nem autorização
da Valec, em desrespeito à Lei
de Licitações (8.666/93).
Auditoria do TCU nesse trecho da Norte-Sul constatou sobrepreço de R$ 63,3 milhões na
atuação desse consórcio paralelo. Segundo a perícia da PF, a
fraude chegou a R$ 59 milhões.
De acordo com relatório da
PF na Operação Faktor (ex-Boi
Barrica), a Lupama é uma empresa de fachada, que não tem
capital social "nem sequer para
construir uma ponte". Seus sócios são Flávio Lima e Gianfranco Perasso, ambos amigos
de Fernando Sarney. Perasso é
apontado pela polícia como o
operador de contas da família
Sarney no exterior -a Folha
revelou neste ano que o filho
do senador já teve dinheiro rastreado e bloqueado pelos governos da China e da Suíça.
A Folha foi ao endereço que
está no registro da sede da Lupama. Durvalina da Silva, 55,
que mora na pequena casa de
alvenaria há 20 anos, disse que
o marido, Modesto de Freitas,
apenas cedeu o endereço a Flávio Lima. Segundo ela, na casa
não há atividades da empresa.
"Só chega correspondência."
A EIT, por sua vez, pagou
"pedágio" para entrar no esquema, segundo revelam conversas interceptadas pela PF
com autorização judicial -as
mesmas escutas que indicam a
participação de Fernando Sarney na formação do "consórcio
paralelo" da Norte-Sul.
Em telefonema grampeado
de maio de 2008, Flávio Lima
cobra de um funcionário da
EIT chamado Romildo parte
do pagamento referente ao
contrato 013/06. A expressão
usada é "pagar a diferença", interpretada pela polícia como
sinônimo de propina.
Romildo responde que seu
chefe na EIT condicionou o pagamento à realização de uma
reunião com Flávio Lima e
Fernando Sarney. Flávio rebate que a EIT havia recebido o
contrato "no colo", cobra de
forma enérgica o pagamento da
"diferença" e ameaça recomendar a Fernando "ignorar o pessoal da EIT" enquanto a pendência não fosse resolvida. Os
diálogos mostram que, sem o
pagamento, a EIT não seria incluída num novo contrato que
era negociado com a Valec.
"Eu tô p... mesmo. Ah, quer
que eu converse com o Fernando? Sabe quem vai chegar com
o Fernando e com o Ulisses
[Assad] pra fazer a porra da vistoria na sexta-feira? Sou eu",
afirma Flávio para Romildo.
Segundo a PF, após essas
ameaças, a EIT aceitou pagar
R$ 160 mil aos sócios da Lupama. No mesmo dia, Romildo ligou para Fernando Sarney
confirmando o depósito. "Cabe
frisar ainda que Fernando,
após o pagamento, determinou
a Flávio que fizesse alguns pagamentos [...], o que reforça ser
Fernando Sarney o chefe da orcrim [organização criminosa]",
escreveu a PF. Quando a Operação Faktor veio à tona, Ulisses Assad foi afastado da direção da Valec.
Colaborou HUDSON CORRÊA, da Sucursal de Brasília
Texto Anterior: Painel Próximo Texto: Outro lado: Para Fernando Sarney, acusação é requentada Índice
|