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ARTIGO
Fala sério, Lula!
DANUZA LEÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Com todo o respeito: a
idéia de comemorar as
bodas de pérola com uma festa
caipira não podia ter sido pior.
O Brasil tem tantos regionalismos bacanas, uma culinária riquíssima, várias maneiras de
ser cheias de ginga e charme que
deslumbram o mundo inteiro, e
o presidente e dona Marisa Letícia vão escolher logo uma caipirada dessas?
Foi um desastre desde o começo: o tema da festa, o carro de
boi chegando cheio de paçoca e
cachaça, o autoritarismo de
obrigar os convidados e suas
respectivas esposas a vestir o
traje típico, e ainda pedir que levassem um pratinho de doces
ou salgados. Quem eles acham
que estão enganando na hora
em que a assessoria de imprensa da Presidência da República
anuncia que o presidente ajudou a pendurar as bandeirinhas do arraiá? Oh, mas que almas tão genuinamente brasileiras? Socorro, Duda Mendonça.
Alguns mais sensatos não pagaram o mico de usar aquele
chapeuzinho de Jeca Tatu, mas
é difícil dizer não ao presidente.
Como estamos num Estado
quase totalitário, a imprensa foi
proibida de cobrir o acontecimento, o que nos leva a pensar:
terá algum ministro pintado
um dentinho e um bigodinho
com carvão, como é de praxe? O
vice-presidente, talvez?
Um país que quer tanto ser
moderno poderia ter se inspirado em qualquer outro folclore
que não o do atraso, o da jequice explícita. Quem não se lembra do personagem Jeca Tatu,
cheio de lombrigas, personificando um Brasil de que lembramos com carinho, mas que não
é exatamente a imagem a ser
exportada para os grandes estadistas do mundo com quem Lula gosta tanto de conviver de
igual para igual?
Não há uma mulher que se
realce num vestidinho caipira;
não existe imagem masculina
que resista a uma camisinha
xadrez remendada e uma costeleta postiça. E essa história das
despesas da festa serem divididas?
Foi um vexame atrás do outro, em nome de uma economia
sem sentido, tipo me engana
que eu gosto. Então é preciso
que alguns empresários rachem
a reforma das goteiras do Palácio da Alvorada para mostrar o
quanto são parcimoniosas as
despesas da Presidência? E essa
de levar um pratinho de doces
eu não ouvia falar desde que tinha dez anos, morava no interior e era pobre. Se investigassem mesmo o affair Waldomiro,
sairia bem mais barato.
A gente temia que fosse acontecer esse tipo de coisa; até agora foi refresco, mas agora eles
pegaram pesado. Olhem bem a
foto para não perder nenhum
detalhe: a margarida no bolso
de Lula, o chapéu de palha desfiado, as trancinhas e as pintinhas feitas a lápis no rosto de
dona Marisa. Pior, impossível.
Sempre se soube que a saudade de Fernando Henrique e dona Ruth Cardoso ia ser grande,
mas não dava para imaginar
que fosse ser tão grande. O arraiá foi de uma breguice difícil
de ser superada, mas não vamos
perder as esperanças: até o fim
do mandato eles talvez consigam.
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