São Paulo, sábado, 15 de julho de 2000


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CRISE NO GOVERNO
Luiz Estevão é o suspeito de gravações; ex-senador nega
Procuradores suspeitam de armação em fita de ex-juiz

Sérgio Lima/Folha Imagem
O presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, que recebeu vários ministros ontem pela manhã no Palácio da Alvorada


DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os procuradores da República do Distrito Federal Guilherme Schelb e Luiz Francisco de Souza declararam ontem que as gravações de conversas do ex-juiz Nicolau dos Santos Neto têm "jeito de armação". A suspeita dos procuradores recai sobre o empresário e senador cassado Luiz Estevão. É a mesma linha seguida pelo Palácio do Planalto.
As supostas conversas de Nicolau foram publicadas pela revista "IstoÉ". Para os procuradores Schelb e Luiz Francisco, "é muito estranho que as pessoas atingidas pelas declarações do juiz Nicolau dos Santos Neto sejam só os inimigos do Luiz Estevão".
Luiz Francisco foi o autor do pedido de prisão preventiva do ex-senador. "Isto (a fita) serve tão bem ao senador (Estevão) que parece montado por ele", afirmou.
Luiz Francisco estranha o fato de o nome do ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Martus Tavares, ter aparecido nas fitas logo após a divulgação dos documentos com a sua assinatura nos créditos suplementares para a obra do TRT de São Paulo.
O governo negou ontem, por meio de notas da Polícia Federal (PF) e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que tenha realizado gravações ou grampos telefônicos envolvendo o ex-juiz Nicolau, como foi atribuído pela revista "IstoÉ".
Ontem pela manhã, em reunião no Palácio da Alvorada, entre o presidente Fernando Henrique Cardoso, Martus, Pedro Malan (Fazenda), José Serra (Saúde), Gilmar Mendes (AGU) e Barjas Negri (Secretário-Executivo da Saúde), a reportagem da revista foi analisada.
A Folha apurou que nas conversas a reportagem e as fitas foram chamadas de "esquisitas" e levantaram, mais de uma vez, a suspeita em torno de Estevão. Argumento para a suspeita: o ex-juiz Nicolau critica todo mundo, mas encampa a versão do Eduardo Jorge. Ou seja, protegia o amigo.
Ontem, a PF, em uma primeira nota oficial, disse que mantém uma equipe especializada realizando investigações para capturar Nicolau dos Santos Neto, que está foragido há 86 dias, mas que não fez gravações.
"Nenhum setor desta superintendência (em BsB) realizou monitoramento telefônico e não existem gravações de qualquer tipo envolvendo as pessoas mencionadas na citada reportagem".
Para deixar claro que também não fez gravações em outro canto do país, a PF soltou logo em seguida outra nota dizendo que não fez nenhum monitoramento "em âmbito nacional".
O diretor-geral da Abin, Ariel de Cunto, em nota oficial, foi na mesma linha da PF. A Abin, disse, "não realizou atividade vinculada a uma suposta investigação sobre o caso do Fórum Trabalhista de São Paulo". E "desmente" as "notícias veiculadas por diversos órgãos de imprensa que atribuem à agência responsabilidade na realização de gravação telefônica".
A Folha apurou que a nota foi produzida por determinação do general Alberto Cardoso, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, responsável hierárquico pela Abin. Cardoso demonstrou apreensão pelo fato de a agência ter seu nome novamente envolvido em supostos grampos telefônicos ilegais.
O caso anterior, o do BNDES -que levou à saída do então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros-, não foi solucionado. Investigações da PF indicam que um agente da Abin, Temilson Resende, o Telmo, é o principal suspeito.
Ontem, ao depor no Ministério Público, Mino Pedrosa, repórter da "IstoÉ" e autor da reportagem das fitas, acabou contradizendo a reportagem ao afirmar que não tinha certeza de que as fitas que obteve haviam sido gravadas pela PF e pela Abin, como diz o texto.
Pedrosa foi chamado para prestar depoimento aos procuradores da República que investigam a fraude na obra do TRT.
No depoimento, que acabou se transformando numa entrevista coletiva do repórter aos colegas, Pedrosa afirmou que supôs que as fitas fizessem parte de material mais extenso (cerca de 400 fitas) que uma pessoa que ele não identificou disse existir. Mas isso não foi confirmado por sua fonte.
O repórter reconheceu que a divulgação da fita pode servir aos interesses de Luiz Estevão, mas afirmou que sua fonte (pessoa que deu as fitas) não tem nenhuma relação com o ex-senador. "É uma fonte antiga, em quem eu tenho muita confiança e que já me ajudou em outros casos importantes", disse Pedrosa.
Para o repórter, a reação da PF e da Abin era esperada. Para ele, "é claro" que as duas instituições nunca confirmariam a escuta.
Ouvido anteontem à noite pela Folha, Luiz Estevão disse não ter nada a ver com a divulgação das fitas. "Tudo agora é culpa minha. Eu não tenho nada a ver com isso, nem sou amigo desse juiz."
Pedrosa afirmou ainda ter duas fitas. Segundo ele, a primeira delas reproduz uma conversa entre três pessoas. Uma delas, com voz mais grossa, "parecia" ter ligações com os serviços de inteligência do governo, disse. No entanto, Pedrosa declarou não conhecer a identidade ou as vozes dos interlocutores do juiz. Na segunda fita, o juiz teria apenas um interlocutor. As fitas teriam mais diálogos além dos reproduzidos pela "IstoÉ", mas, segundo Pedrosa, não contêm mais revelações.
O repórter se comprometeu a entregar as duas fitas ao Ministério Público na segunda. Segundo os procuradores, as fitas serão examinadas e anexadas ao processo contra o ex-juiz. "Elas deverão servir como prova no processo, só não sabemos ainda se lícita ou ilícita", afirmou o procurador.


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