São Paulo, domingo, 15 de agosto de 2004

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Há um viés autoritário no governo Lula?

DA REDAÇÃO

A Folha perguntou a 18 personalidades sobre a existência ou não de um viés autoritário no governo Lula. Leia a opinião de quem respondeu à enquete:

 

"Não, não existe autoritarismo. No caso do conselho de jornalismo, por exemplo, eu sinto que é um debate que a sociedade tem que fazer para encontrar meios de buscar respostas para os problemas envolvendo a atuação da mídia. Temos que ter instrumentos para defender a sociedade do poder da mídia"
JOÃO CARLOS GONÇALVES, secretário-geral da Força Sindical
"Não. Trata-se de respostas, na maior parte das vezes erradas, a episódios em que o governo se sente ameaçado. Não revela plano preconcebido de autoritarismo. Pelo contrário, o governo é extremamente generoso, para dizer o mínimo, com empresas, notadamente as instituições financeiras, que assolam o país".
FÁBIO KONDER COMPARATO, professor de direito da USP

"Não acredito que seja autoritarismo. Vejo uma vontade de ouvir e consultar que ainda não encontrou o seu ponto de equilíbrio. Pelo que eu sei, as propostas que têm sido examinadas e transformadas num projeto de lei são originárias de segmentos organizados da sociedade".
ENIO CANNDOTTI, presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

"Eu não diria isso a respeito do presidente, mas de parte de seus auxiliares. Uma parte da equipe do governo esteve ligada a movimentos de cunho autoritário. Não acredito, no entanto, que iniciativas de cunho autoritário caminhem. Acho que o presidente não permitirá e que o país tem uma estrutura e instituições que não permitem ou inviabilizam atentados contra a democracia".
MÁRIO ERNESTO HUMBERG, primeiro-coordenador da PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais)

"Todas essas palavras, como controladoria, para mim, são eufemismo de ditadura. Tudo isso tem cheiro de Cuba, cheira Fidel Castro, atraso, retrocesso. Como ajudei a colocá-lo no poder, tenho um pouco de culpa nessa merda. O Lula não fala nem o nosso alfabeto direito".
GABRIEL VILLELA, diretor de teatro

"Não consigo imaginar o governo Lula tomando qualquer medida que represente um ataque à democracia. Acho que existe certo mal-entendido. O conselho de jornalistas, por exemplo, é um desejo das instituições do setor. Se não há consenso, é um debate que precisa ser feito".
LUIZ MARINHO, presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores)

"Acho que qualquer tentativa de forçar a barra não é legal. Talvez o presidente nem tenha consciência sobre autoritarismo. Quando uma pessoa chega em determinada plataforma de poder, é preciso ter muito auto-conhecimento. Acho lindo um líder sindical virar presidente, mas os homens que querem chegar ao poder precisam se preparar".
RUTH ESCOBAR, atriz
"Seria muito drástico fazer essa avaliação. É um problema mais de inabilidade do que de autoritarismo. No caso do conselho de jornalismo, por exemplo, não sei porque o governo se meteu nisso. É um problema: existe uma concentração no setor de comunicação, existem problemas que devem ser discutidos. Mas é uma discussão corporativa, não sei porque o governo encampou".
LUIZ GONZAGA BELLUZZO, economista, professor da Unicamp
"O governo Lula, com leis de mordaça como a criação do conselho de jornalismo e outras medidas, está aos poucos mostrando todo seu autoritarismo ao povo brasileiro. O Estado de Direito já acabou no campo e o presidente Lula governa com ranço ideológico. O Lula vendeu um peixe e entregou uma piranha para o povo brasileiro".
LUIZ ANTÔNIO NABHAN GARCIA, presidente nacional da UDR (União Democrática Ruralista)
"Punir previamente, como quer o governo em alguns projetos encaminhados à Câmara, é um risco à democracia. No Brasil, felizmente, há instâncias que julgam qualquer abuso contra qualquer pessoa ou entidade. Não é o governo que deve ser o juiz das ações. Quem deve ser o juiz das ações é a sociedade".
JOSÉ JOAQUIM CALMON DE PASSOS, jurista, professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia)
"No geral, as últimas iniciativas do governo sinalizam uma direção não-saudável. O saldo geral dessas iniciativas parecem indicar uma dificuldade de convívio com a diferença. Não acusaria o governo de autoritário, pois é verdade que essas questões estão sendo debatidas. Não é autoritarismo, mas excesso de confiança no poder. É mais uma questão de desconhecimento".
CLAUDIO WEBER ABRAMO, diretor-executivo da Transparência Brasil
"O governo está seguindo uma trajetória autoritária. Não é uma questão de criar novas leis. O que o governo tem de fazer é cumprir a lei existente. Esse governo foi forjado na luta dos trabalhadores. Durante a ditadura, tínhamos [os funcionários públicos] de nos reunir nos porões dos ministérios. Conquistamos a liberdade para os servidores. É uma absurdo querer reverter esse processo".
GILBERTO JORGE CORDEIRO GOMES, secretário-geral do Condsef (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Serviço Público Federal)
"Não diria que há autoritarismo, mas vejo essas atitudes com preocupação. Não me parece o melhor caminho que um governo aja como censor. Isso é grave. O máximo que posso admitir é algo semelhante ao que existe na publicidade, que tem uma organização para controlar as propagandas e evitar as enganosas".
JARBAS PASSARINHO, coronel da reserva e ex-ministro dos governos Médici, Figueiredo e Collor

"O tema sobre o imprensa foi discutido com os jornalistas. O audiovisual também teve um processo de debate promovido pelo ministro Gil [Gilberto Gil, Cultura]. Se isso é verdadeiro, não se trata de uma prática autoritária. Nenhuma medida pode ser caracterizada como autoritária se parte e têm sido mantida dentro de um processo de ampla discussão e de procedimentos democráticos".
MARIA VICTORIA BENEVIDES, socióloga, professora da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo)
"Sem dúvida nenhuma, essas medidas não dignificam governo nenhum. É autoritarismo inédito pós-ditadura militar. Não tínhamos nenhum sentimento de que isso aconteceria, pela trajetória do PT e do próprio presidente. De uma vez só, uma série de acontecimentos desilustram o presidente. Lula deveria dar uma parada e analisar o momento, para voltar à postura democrática".
ROBERTO ANTONIO BUSATO, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil

"Não acho que é um traço de autoritarismo. No caso dos jornalistas, acho que o conselho se inscreve na tradição brasileira, da OAB, de medicina. O que me parece é que está havendo um deslocamento da agenda da oposição da economia para as questões ideológico-valorativas. A oposição força um ponto, fala de stalinismo para atemorizar o proponente, não para discutir propostas".
LUIZ WERNECK VIANNA, cientista político, presidente da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais)
"[Essas atitudes] revelam uma postura do partido, de dominação da máquina estatal. Pode ser bom ou ruim, eu não estou entrando nisso. É um projeto do PT. No caso da Ancinav, a regulamentação e o controle, as taxações de entrada de produtos estrangeiros, não é uma coisa de direita e esquerda, é uma coisa de defesa de patrimônio nacional".
SÉRGIO BIANCHI, cineasta
"Eu acho ótimo quebra do sigilo. Você vive numa sociedade dominada pelos bancos, pelo capitalismo financeiro, eu acho que realmente não devia haver sigilo. Mas eu acho que devia ser aberto para sociedade toda. Quanto à coisa da liberdade de imprensa, isso eu acho que é intocável. Isso [controle] é inadmissível".
JOSÉ CELSO MARTINEZ CORRÊA, ator, diretor e dramaturgo



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