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Representante de offshores abasteceu Fundação Sarney
Empresa ligada a paraíso fiscal foi a maior doadora da entidade em 2007, com R$ 300 mil
KKW do Brasil, que pertence a Gilberto Miranda, afilhado de José Sarney, não tem site nem negócios visíveis, mas declara capital de R$ 80 mi
HUDSON CORRÊA
ENVIADO ESPECIAL A SÃO LUÍS
ALAN GRIPP
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Acusada de desvio de dinheiro, a Fundação José Sarney recebeu R$ 300 mil em 2007 de
uma empresa de fachada que
representa duas "offshores"
(firmas no exterior), com sedes
na Inglaterra e no paraíso fiscal
das Ilhas Virgens Britânicas.
Documentos e depoimentos
colhidos pela Folha revelam
que a empresa, a KKW do Brasil, pertence, de fato, ao ex-senador Gilberto Miranda, afilhado de José Sarney (PMDB-AP) e personagem recorrente
de escândalos em Brasília nas
últimas duas décadas.
Em 2007 (último ano com
dados disponíveis), a KKW foi
a maior fonte de recursos da
fundação, da qual Sarney é presidente vitalício. Os repasses,
feitos em três parcelas iguais,
estão registrados como doações na contabilidade da instituição, em São Luís.
Apesar de ter capital social
de R$ 80 milhões (cifra de uma
empreiteira de grande porte), a
KKW não tem negócios visíveis, site ou sede própria. Seus
endereços e telefones correspondem aos da casa e do escritório de Miranda em São Paulo,
onde funcionam outras firmas
atribuídas ao ex-senador,
igualmente registradas (integral ou parcialmente) em nome
de "offshores".
Esse é o primeiro indício de
que a Fundação José Sarney
recebeu recursos do exterior.
As "offshores", em especial as
que têm sede em paraísos fiscais, são costumeiramente usadas para repatriar dinheiro que
deixou o país de forma ilegal,
em regra via doleiros.
Nos eventos organizados nos
últimos anos pela fundação
não há nenhum registro de patrocínio ou apoio da KKW, publicidade normalmente concedida a doadores. Por isso a doação é alvo de investigação do
Ministério Público do Maranhão, que já reprovou as contas
da fundação e está prestes a intervir em sua administração.
A fundação também é suspeita de desviar dinheiro do governo maranhense e de patrocínio da Petrobras, uma das denúncias que levaram o senador
ao Conselho de Ética.
Apesar de ser uma instituição privada, a fundação está sujeita ao escrutínio do Ministério Público porque executa
ações sociais e porque seus financiadores são beneficiados
com isenções de impostos.
Engenharia contábil
Registro da Junta Comercial
de São Paulo diz que a KKW do
Brasil é uma holding (empresa
criada para gerir um grupo de
empresas). Miranda ou suas filhas não figuram como donos
da KKW, e sim as "offshores".
Dona de 99,9% das cotas, a
KKW Venture Capital Investment Co. tem como sede um escritório de advocacia em Londres. A Tugela Worldwide Corporation, que detém 0,1% do
capital, está registrada em uma
caixa postal em Road Town, capital das Ilhas Virgens.
O território britânico está na
lista de paraísos fiscais que descumprem padrões internacionais de compartilhamento de
informações bancárias.
São vários os elos entre Miranda e a KKW do Brasil, além
da coincidência de endereços e
telefones. Sua ex-mulher Analícia Scarpa, com quem foi casado por cerca de dez anos, dirigiu a empresa entre outubro de
2008 e maio de 2009.
Outra ligação vem da Bougainville Participações e Empreendimentos, empresa que é
fundadora da KKW do Brasil. A
Bougainville já pertenceu no
papel ao ex-senador e à sua filha Juliana Scarpa.
Os nomes foram retirados da
sociedade depois que a empresa foi alvo de processos, mas os
telefones da Bougainville estão
registrados até hoje nos endereços equivalentes à casa e ao
escritório do ex-senador.
Miranda primeiro negou, por
meio de um funcionário, qualquer relação com a KKW. Confrontado com os documentos
obtidos e as informações apuradas pela Folha, mudou a versão. Disse que já foi dono da
KKW e a repassou para o nome
das filhas, atuais proprietárias,
como uma herança em vida.
Miranda foi senador duas vezes sem um único voto -era
suplente. Afastou-se dos cargos
públicos, mas atua nos bastidores. Trabalhou pela eleição de
Sarney à Presidência do Senado e agora tem se empenhado
para tentar mantê-lo no cargo.
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