São Paulo, sábado, 15 de agosto de 2009

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Identidade de Cabo Anselmo tem confirmação de perícia

Impressões digitais e assinatura batem com as disponibilizadas pela Marinha

Ex-marujo, que vive na clandestinidade desde 64, vai poder tirar documentos; ele pede à União reparação por suposta perseguição

LUCAS FERRAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As impressões digitais disponibilizadas pela Marinha são de José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, que moveu ação na Justiça para reaver seus documentos originais, como CPF, carteira de identidade e título eleitoral, cassados desde 1964.
Uma perícia encomendada pela Justiça Federal de São Paulo, a que a Folha teve acesso, confirmou que as impressões digitais nos documentos são mesmo do ex-marujo, que foi um dos detonadores da queda do governo João Goulart e do golpe de 1964 e, depois, ficou conhecido por delatar militantes da esquerda para os órgãos de repressão.
O perito Sebastião Edison Cinelli, destacado para fazer o trabalho, encaminhou à Justiça, na semana passada, o resultado da perícia. "É ele mesmo. Está mais do que comprovado", disse à reportagem.
Em seu trabalho, Cinelli analisou as impressões digitais e a assinatura de Cabo Anselmo. O resultado deu positivo em ambos os casos.
A publicação da sentença ainda deve levar mais algumas semanas, pois a Marinha também vai apresentar à Justiça uma análise semelhante. Só depois o ex-marinheiro, hoje com 67 anos, poderá requisitar novos documentos.
Não se tem notícia de personagem da ditadura -ou de qualquer outro período histórico recente- que tenha recorrido à Justiça para ter direito à própria identidade.
Isso foi necessário porque José Anselmo dos Santos vive desde 1964 na clandestinidade. Naquele ano, por liderar a rebelião dos marinheiros, ele foi expulso da Marinha, preso e banido do país pelo primeiro instrumento de exceção do regime militar (AI-1).
Militante de organizações da esquerda armada, Anselmo mudou de lado após ser preso, em 1971. Virou informante do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) em São Paulo e entregou vários ex-companheiros -que morreram ou foram torturados.
A Marinha, mesmo no período democrático (pós 1985), sempre disse desconhecer o paradeiro dos documentos do ex-marujo. Ela foi forçada a apresentá-los depois que Anselmo entrou na Justiça, no ano passado, e a União virou ré no processo.
Foram apresentados uma "individual datiloscópica" e um "prontuário de identificação" com seus dados biométricos e fotos. Sua certidão de nascimento, contudo, desapareceu.
Por causa da falta de identidade, Anselmo diz ser o único brasileiro não beneficiado pela Lei de Anistia, instituída 30 anos atrás. E reclama, como disse à Folha no final do mês passado, ser perseguido pelo governo Lula. Ele pede à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça reparação econômica pela perseguição que afirma ter sofrido na ditadura.
Na semana passada, o ministro Tarso Genro (Justiça) disse ter dúvidas sobre a real perseguição sofrida por Cabo Anselmo. Para ele, há indícios de que o ex-marinheiro já era, à época da rebelião que precipitou a queda do governo João Goulart, "agente infiltrado dos golpistas". O ministro ponderou que falava em tese por desconhecer o processo protocolado na Comissão de Anistia. Cabo Anselmo nega ter ferido ou matado durante a ditadura.


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