São Paulo, quinta-feira, 15 de setembro de 2005

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Saio de cabeça erguida, diz cassado

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA

O plenário da Câmara dos Deputados cassou na noite de ontem, em votação secreta, o mandato do deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ), 52, autor das denúncias sobre o escândalo do "mensalão".
Foram 313 votos pela cassação, contra 156 a favor de Jefferson, ou seja, 56 votos a mais dos 257 necessários para a perda do mandato. Jefferson torna-se o primeiro parlamentar a ser cassado na atual crise política. Outros dois -Carlos Rodrigues (RJ) e Valdemar Costa Neto (SP), ambos do PL- renunciaram.
O petebista fica agora inelegível até 2015 e só poderá concorrer a cargo eletivo, na melhor das hipóteses, nas eleições municipais de 2016. O resultado mostrou ainda cinco votos em branco, dois nulos e 13 abstenções. O quórum total foi de 489 deputados.
"Esta é a última semana de inverno. A primavera está chegando", disse Jefferson, segundo seus assessores, ao saber do resultado, proclamado às 21h33. Minutos antes, o anúncio do 257º voto que tornava definitiva a cassação foi recebido com silêncio no plenário e nas galerias.
Jefferson, que estava em seu sexto mandato consecutivo como deputado federal, foi o responsável pelo surgimento da pior crise política do governo Luiz Inácio Lula da Silva ao denunciar, em entrevista publicada na Folha em 6 de junho, o suposto esquema de pagamento de mesada pelo PT a deputados de partidos aliados.
Em conseqüência, ministros deixaram os cargos, dois deputados já renunciaram, toda a direção do PT foi afastada e uma série de diretores de estatais perderam o emprego.
Bem ao seu estilo, Jefferson fez um discurso de despedida, antes de saber o resultado da votação, recheado de frases de efeito, de elogios e agradecimentos a aliados, a familiares, mas não poupou os adversários políticos, entre os quais incluiu, agora, o presidente Lula -a quem ele vinha poupando de ataques diretos.
Acusado pelo Conselho de Ética da Câmara de quebrar o decoro ao fazer acusações sem provas e ao admitir a prática de crimes como o tráfico de influências em estatais, Jefferson disse que Lula foi "omisso" e relapso ao delegar funções que, segundo o petebista, foram usadas por auxiliares para promover "o mais escandaloso processo de aluguel de mandatos" da história do Congresso.
Ovacionado por galerias lotadas de pessoas com camisetas e cartazes com dizeres "eu acredito em Roberto Jefferson", o petebista disse que sai "de cabeça erguida" e que não retira "nenhuma vírgula" das acusações que fez.
Ao saber do resultado no Congresso, cancelou uma entrevista que havia marcado. Mas receberia a visita em sua casa de uma série de deputados do PTB, partido do qual foi presidente.
A estratégia de tentar obter votos de última hora com o argumento de que o Palácio do Planalto estaria tentando espalhar uma "guerra fratricida" no Congresso não surtiu efeito. Mesmo assim, o petebista teve adeptos declarados -e não só no PTB. Cleonâncio Fonseca (PP-SE), por exemplo, dizia para quem quisesse ouvir que não vota "a favor de cassação de deputado".
Questionado como se sentiria se Jefferson escapasse por apenas um voto, respondeu: "Aí subo na Mesa e grito: "Eu salvei Roberto Jefferson!'".
A cassação do petebista deve marcar o início de uma série de punições contra deputados acusados de envolvimento no escândalo do "mensalão".
O próximo da fila a enfrentar a votação no plenário deve ser o ex-ministro José Dirceu (PT-SP), que ontem foi acusado por Jefferson de tratar o Congresso como "um prostíbulo" quando chefiava a Casa Civil e atuava como articulador político do governo.
Além de Dirceu, Sandro Mabel (PL-GO) e Romeu Queiroz (PTB-MG) já sofrem processo de cassação no Conselho de Ética e poderão ter o mesmo destino de Jefferson. Mais 13, entre eles seis petistas, devem ter os processos abertos nos próximos dias. Alguns podem renunciar para escapar à inelegibilidade resultante da cassação do mandato.
"Foram as "mentiras" de Jefferson que promoveram a maior reforma moral no governo Lula", afirmou na tribuna um dos advogados do petebista, Itapuã de Messias.
O suplente que assumirá a vaga de Jefferson é o ex-deputado Fernando Gonçalves (PTB-RJ).
(RANIER BRAGON, FÁBIO ZANINI, SÍLVIO NAVARRO E LUIZ FRANCISCO)

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