São Paulo, sábado, 15 de setembro de 2007

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Oficiais tentam anular promoção de Lamarca

Clubes Militar, Naval e da Aeronáutica, que reúnem militares da reserva, vão à Justiça para anular portaria do governo

Oficiais argumentam que guerrilheiro desertou em 1969; Ministério da Justiça diz que não comenta a ação por não ter sido notificado

DA SUCURSAL DO RIO

Os clubes Militar, Naval e da Aeronáutica recorreram nesta semana à Justiça Federal para tentar a anulação da portaria do Ministério da Justiça, publicada em 13 de julho, que promoveu ao posto de coronel o ex-capitão do Exército Carlos Lamarca, guerrilheiro morto em 1971, no regime militar.
A portaria também determinou o pagamento à viúva de Lamarca de pensão mensal no valor recebido por um general-de-brigada (R$ 11.444,40).
A ação impetrada pelos clubes militares foi distribuída anteontem para a 14ª Vara Federal do Rio, que ainda não se manifestou. O primeiro passo da Justiça deverá ser uma notificação à União, para que se manifeste sobre as pretensões dos clubes, que representam oficiais da reserva do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
Na ação, os dirigentes dos clubes militares alegam que a portaria assinada pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, fere a legislação. Lamarca desertou do Exército em 1969 para ingressar na luta armada, militando nas organizações clandestinas VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), Var-Palmares e MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro).
A portaria de Genro concede ainda anistia política a Lamarca e determina o pagamento, como reparação econômica, de R$ 902.715,97 à viúva Maria Pavan Lamarca, referente à diferença entre a data de seu pedido, em 1988, e a do julgamento do caso pela Comissão de Anistia, em 13 de junho último. Além disso, A viúva e seus dois filhos, Cláudia e César, ainda receberão, individualmente, indenização no valor teto de R$ 100 mil, correspondente a 30 salários mínimos por ano de perseguição política.
A ação pede a suspensão dos pagamentos e a devolução ao erário dos valores já recebidos por ela. A promoção de Lamarca e as indenizações foram decididas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
A promoção de Lamarca a coronel, com vencimento de general -conforme a legislação militar do tempo em que ele serviu, que concedia salários equivalentes a uma patente acima daquela em que o profissional deixou o trabalho-, irritou as cúpulas dos clubes militares.
"Minhas manifestações são pautadas pelo equilíbrio. Entendo que em democracia tem que ser assim. Mas é absurdo que uma pessoa que traiu, roubou, torturou e matou a pauladas um indefeso receba esse reconhecimento. Eu não consigo entender", disse o presidente do Clube Militar, general da reserva Gilberto Figueiredo.
Para o presidente do Clube Naval, almirante reformado José Júlio Pedrosa, a ação conjunta dos clubes não é emocional. "É uma ação bem técnica. A portaria contraria decisões do Supremo Tribunal Federal a respeito da promoção de militares e leis que regulam o assunto. Temos a obrigação de recorrer contra essa decisão, até para proteger o erário."
O terceiro signatário, o presidente do Clube da Aeronáutica, brigadeiro da reserva Ivan Frota, afirmou que um dos objetivos da ação é despertar a sociedade para a questão das indenizações pagas pelo governo a pessoas supostamente vitimadas pelo regime militar. "A Lei da Anistia concedeu favorecimentos financeiros só para um dos lados. Hoje em dia, qualquer indivíduo requer e consegue recompensas milionárias."
Segundo o advogado dos clubes, Nina Ribeiro, a portaria "é completamente ilegal no que trata das promoções do Exército" e "fere os brios dos militares". "Lamarca queria no fundo instaurar no Brasil uma ditadura comunista. Queria sair de um regime de exceção para outro muito pior", disse.
O Ministério da Justiça disse que não comentaria a ação por não ter sido ainda notificado e limitou-se a divulgar a seguinte declaração do presidente da Comissão de Anistia, Pedro Abrão Lopes Júnior: "Em um ambiente democrático, o caminho para o questionamento da decisão de alguma autoridade pública é a via judicial".


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