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OPINIÃO
Medida nacionalista nasce com pernas curtas
MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA
MAIS até do que a aquisição de terras, a mera presença de estrangeiros na Amazônia costuma ser encarada como suspeita
por princípio. A desconfiança de
que não brasileiros só se dirigem
à floresta com segundas intenções beira a paranoia. Se vier
apenas para dar satisfação à sanha nacionalista, a legislação em
estudo nascerá velha e inócua.
Dito isso, é possível reconhecer que ajustar os limites para a
posse de terras por estrangeiros na região não é de todo descabido. A Amazônia guarda a
maior porção contínua de floresta tropical do planeta. Embora não seja exclusiva do Brasil, que a partilha com outros
oito países, aqui ficam ao menos 50% da mata.
Três tipos de patrimônio estratégico se encontram reunidos ali em grande quantidade.
O mais relevante, no curto e
médio prazos, é o carbono. Vale
dizer, matéria orgânica armazenada na madeira, nas folhas,
nas raízes e no solo.
Se derrubada a floresta, como fazemos no Brasil à taxa de
uns 10 mil km2 por ano, a maior
parte desse carbono vai para a
atmosfera engrossar a manta
de gases do efeito estufa. Com
isso, realimentamos o aquecimento global.
É quase certo que, em dezembro, a Conferência de Copenhague adotará algum mecanismo para atribuir valor e gerar renda com a nova forma de
riqueza. Florestas tropicais
guardam o segundo maior estoque terrestre de carbono,
com quase um quinto do total
(perdem só para as florestas
boreais, ou taiga).
Os outros dois gêneros de
ativos, biodiversidade e água
doce, são por ora de valor mais
difícil de estabelecer. A promessa de muitas patentes, no
caso da primeira, ainda não se
materializou. E não existe um
mercado para a massa líquida
que flui pela foz do Amazonas e
se perde no Atlântico, a milhares de quilômetros dos grandes
centros urbanos.
Faz sentido, de todo modo,
melhorar e aumentar o controle do Estado sobre esse território estratégico. Limitar propriedades de estrangeiros a
10% da área dos municípios parece sensato, também, pois eles
são gigantescos na Amazônia.
O de Altamira, no Pará, se espalha por 160 mil km2 -mais do
que cinco Bélgicas.
Segundo o Incra, há hoje 36
mil km2 da Amazônia titulados
para estrangeiros. Uma cifra
subestimada, porque parcela
desconhecida estaria nas mãos
de laranjas. Mesmo assim, isso
representa menos de 1% do
bioma amazônico no Brasil. Ou
pouco mais do que três anos de
desmatamento, no ritmo atual
de destruição.
Resta saber se o governo federal vai conseguir extinguir,
também no caso dos estrangeiros, a tão brasileira instituição
dos testas de ferro.
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