São Paulo, domingo, 15 de outubro de 2006

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Petista anuncia ajuste sem cortes de gastos

Nelson Barbosa explica que a estratégia se baseia na expectativa do crescimento do PIB em 5% em 2007

MALU DELGADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Coordenador do programa econômico do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o economista Nelson Barbosa, secretário adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda, afirma que o ajuste fiscal proposto pelo petista não prevê corte de gastos. Toda a lógica do ajuste foi concebida a partir de um PIB de 5% já em 2007. Como a economia crescerá mais, as despesas podem aumentar, mas num ritmo inferior ao crescimento do PIB. Leia trechos da entrevista:  

FOLHA - Se reeleito, Lula fará um ajuste fiscal que implique corte de gastos? É necessário?
NELSON BARBOSA
- Não haverá corte de gastos, mas sim a melhoria na qualidade do gasto público, com crescimento da economia. Assim você pode reduzir o peso de alguns gastos em relação ao PIB, gradualmente. Os gastos continuam crescendo só que, proporcionalmente, crescem menos do que o PIB.

FOLHA - O público alvo do Bolsa Família não se expandirá em 2007?
BARBOSA
- O crescimento para os próximos anos será mais lento que nos anos anteriores. O peso no orçamento tende a cair, mas não porque você vai cortar gastos. Os reajustes acompanharão a inflação.

FOLHA - Mas há um debate sobre os reflexos de longo prazo na Previdência caso os benefícios continuem a ser reajustados pelo mínimo.
BARBOSA
- A proposta é manter os benefícios vinculados com o salário mínimo. Os gastos da Previdência devem terminar este ano em cerca de 7,9% do PIB. A médio prazo, você conceder aumentos reais.

FOLHA - Como? Reduz benefícios?
BARBOSA
- Não é reduzir. É estabilizar, porque o PIB cresce mais rápido que a despesa. O número de benefícios cresce, por ano, 3% a 4%. Se o PIB crescer a 5% há espaço para aumentar o mínimo sem explosão do gasto da Previdência.

FOLHA - Para que haja essa estabilização, o PIB terá que crescer em média 5%. Há projeções de PIB de 3% em 2006. Como aumentar o PIB?
BARBOSA
- As projeções do governo vão de 3,5% a 4%. As previsões de 3% são conservadoras. A redução de juros dá um estímulo grande, mas não é só isso. Começaremos 2007 com o crescimento acelerando. Pode chegar a 5% sim. É um processo de queda na taxa de juros e de melhora na qualidade do gasto público com o aumento do investimento em infra-estrutura.

FOLHA - Manutenção de escolas e hospitais é custeio. Funcionalismo idem. Haverá corte?
BARBOSA
- Com o PIB crescendo mais rápido, você pode reduzir o peso desses gastos em relação ao PIB e ainda assim aumentá-los em termos reais. É ajuste com crescimento.

FOLHA - Vamos supor o PIB de 5%.
BARBOSA
- Aí você pode, por exemplo, reajustar os gastos de despesa da máquina a 1%. O gasto que subiu foi basicamente com programas sociais. Os demais estão estáveis em relação ao PIB.

FOLHA - E o gasto com servidores?
BARBOSA
- O gasto com funcionalismo, neste ano, deve fechar em 5,1% do PIB. Ao final de 2002, ele foi de 5,3% do PIB. Ou seja, hoje nós gastamos menos que o governo anterior, mesmo tendo aumentado o número de funcionários públicos. Isso é choque de gestão. Como reduz isso gradualmente? O orçamento de 2007 está dado. A partir de 2008, você pode fazer com que o gasto com funcionalismo continue crescendo, só que proporcionalmente menos que a economia.

FOLHA - Então os reajustes do funcionalismo serão menores.
BARBOSA
- O reajuste real será dado pelas condições macroeconômicas. O peso do gasto com funcionalismo não será aumentado. A proposta orçamentária de 2007 prevê gasto em torno de 5% [do PIB]. E a partir de então produzir uma redução gradual via crescimento da economia e via aumentos menores do gasto com pessoal.

FOLHA - O ajuste fiscal de Lula não prevê redução de carga tributária?
BARBOSA
- Prevê desoneração de investimento e exportações.

FOLHA - Para o setor empresarial, crescimento do PIB sem redução de carga tributária é algo incompatível.
BARBOSA
- Uma redução da carga em si pode ser fruto de uma racionalização do sistema tributário, como a unificação das alíquotas do ICMS. Você pode ter uma redução da alíquota, mas essa redução, justamente porque diminui os impostos e aumenta o lucro, pode gerar um crescimento maior da economia que acaba se refletindo na manutenção da carga no mesmo patamar. O governo não trabalha com meta de carga tributária. Trabalha com desonerações das alíquotas.

FOLHA - A relação dívida/PIB cai?
BARBOSA
- Sim, pelo maior crescimento do PIB e pela redução da taxa de juros.

FOLHA - O economista Yoshiaki Nakano, colaborador de Geraldo Alckmin, propôs um ajuste fiscal rigoroso, com corte de despesas equivalente a 3% do PIB. É viável?
BARBOSA
- Acho inviável. É uma coisa radical. Corre o risco de provocar uma recessão profunda. O PSDB propõe uma terapia de choque e nós propomos uma terapia gradualista. Eles quebraram a economia em 1998 e em 2002.

FOLHA - Conter gastos não significa reduzir investimentos?
BARBOSA
- Não. É conter benefícios previdenciários, assistenciais e custeio da máquina para abrir espaço a investimentos .

FOLHA - É possível conter despesas de custeio da máquina mantendo sua estrutura atual?
BARBOSA
- Sim. Nos últimos anos, os gastos ficaram estáveis em relação ao PIB. O gasto com pessoal e encargos sociais é hoje mais baixo que o do governo anterior, apesar do aumento de ministérios e do número de funcionários públicos. Vender avião é propaganda. Criação de ministérios não cria novos gastos.


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