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Lula diz que Itália terá que respeitar refúgio a Battisti
Presidente diz que Brasil é um "país generoso" que já abrigou muitos exilados
O chanceler Celso Amorim considera que processo de concessão de refúgio é "absurdo", mas evita fazer críticas públicas a Tarso
RODRIGO VARGAS
DA AGÊNCIA FOLHA, EM LADÁRIO (MS)
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
A decisão de conceder o status de refugiado ao terrorista
italiano Cesare Battisti, 54, foi
defendida ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva
como uma "questão de soberania nacional". Lula disse que o
ministro Tarso Genro (Justiça)
"cumpriu com sua obrigação".
Ao decidir pelo refúgio, Tarso
desconsiderou a posição do Conare (Comitê Nacional para os
Refugiados), no qual prevalecera, por 3 votos a 2, a tese da extradição. Os três votos foram do
Itamaraty, do Ministério da
Justiça e da Polícia Federal. Ou
seja: Tarso decidiu conceder o
asilo contra a diplomacia e contra seu próprio ministério.
Em seu parecer de 12 páginas, ele justificou que Battisti
foi condenado à revelia por
ações políticas numa época
conturbada na Europa e já há
muitos anos tem família e vive
pacatamente como escritor.
Segundo Lula, as autoridades
italianas têm o direito de não
concordar com a posição adotada, mas devem "respeitá-la".
"Nós tomamos uma decisão de
entender que esta pessoa italiana [Battisti] não precisaria voltar à Itália e poderia ter status
de exilado", disse Lula. Segundo ele, o Brasil é um "país generoso" e tem na sua história
"muitos exemplos de pessoas
que aqui chegaram exilados e
aqui viveram a sua vida".
"Esse cidadão é acusado de
um crime cometido em 1978,
portanto já faz 32 anos. O acusador fez um processo de delação premiada, depois tirou novos documentos e hoje nem
existe para provar estas acusações." Ao chegar ao Brasil, disse
Lula, Battisti "trabalhou e hoje
é escritor": "O ministro da Justiça entendeu que este cidadão
deveria ficar no Brasil e tomou
a decisão, que é do Estado brasileiro. Portanto, alguma autoridade italiana pode não gostar,
mas tem de respeitar".
Lula disse que a França também concedeu asilo a outro
acusado de envolvimento com
"as mesmas coisas". E afirmou
não acreditar que o caso afete
as relações com a Itália. "Os
dois países têm uma relação
histórica tão forte que não é um
problema de um exilado que vai
trazer alguma animosidade. O
Brasil entendeu que a decisão
era correta e eu acho que os italianos precisam respeitar."
Amorim
Ao conversar com seus assessores, na volta do Oriente Médio, ontem às 4h30, o chanceler
Celso Amorim classificou o
processo para conceder refúgio
a Battisti de "absurdo", porque
desconsidera todas as demais
instâncias e é tomado por uma
só pessoa, Tarso Genro, que
convenceu o presidente.
À tarde, em entrevista, Amorim disse que "os procedimentos foram cumpridos [por Tarso]", mas deixou claro seu desconforto ao admitir que o Itamaraty tinha votado contra o
asilo, não teve nenhuma participação na decisão de Tarso e
que discordava do processo,
que chamou de "parajudicial".
O desconforto ficou claro nos
gestos. A assessoria de Amorim
avisou que a entrevista seria
apenas sobre Oriente Médio e
que ele não responderia perguntas "sobre outros assuntos". Quando a Folha lhe perguntou sobre Battisti, ele primeiro não quis responder, depois falou rapidamente e se levantou, ameaçando sair da sala.
A diplomacia brasileira avalia porém que o atrito entre o
Brasil e a Itália terá vida curta.
A explicação é que o ex-premiê
italiano Romano Prodi fazia
pressão muito maior pela extradição de Battisti que o atual,
Silvio Berlusconi. Ele reclamou
porque tinha de dar eco à pressão da opinião pública italiana,
mas não fará um cavalo-de-batalha por Battisti, como ouviu a
Folha no Itamaraty.
Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália pelo assassinato de quatro pessoas
quando liderava o PAC (Proletários Armados pelo Comunismo). Para o governo italiano, é
um "criminoso comum" e deveria ser extraditado. Para o
brasileiro, é "criminoso político", com direito a asilo.
Colaborou SOFIA FERNANDES, da Sucursal de Brasília
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