São Paulo, quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

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JANIO DE FREITAS

O método do milagre

Quem se espantou com a pesquisa Sensus encomendada pela Confederação Nacional dos Transportes, a ponto de alguns a quererem sob investigação, não se deu conta de que a principal contribuição da pesquisa não é à disputa eleitoral, é à fé. Se você está entre os que não acreditam em milagre, pode entregar os pontos: os seus nada mais valem diante dos pontos percentuais que o Sensus apresenta.
Sempre é possível demonstrar mais fascínio ao já suscitado por um milagre, o que explica as observações, modestas embora, que acrescento às feitas por vários doutos. Começo por notar que a coleta de opinião pelo Sensus se deu entre 6 e 9 de fevereiro, mas a divulgação do resultado só veio no dia 14, anteontem. Ou, para facilitar a memorização da data, no dia dos 26 anos do PT eleitoralmente festejados por Lula junto aos companheiros, delubianos ou não.
Outra data útil: a sondagem do mais recente Datafolha deu-se nos dias 1º e 2 de fevereiro. Logo, daí à sondagem do Sensus o intervalo foi de apenas quatro dias. O que houve de especial nesses quatro dias? Nada. Bem entendido, nada aos nossos olhos e ouvidos vulgares. Porque a pesquisa Sensus detectou uma revolução formidável, ocorrida em algum instante daqueles quatro dias, no sentimento e na opinião política do eleitorado de 24 Estados. (A propósito, o Brasil costuma ter 26 Estados, mas a "explicação metodológica" do Sensus refere-se a sondagem em 24, sem esclarecer se os excluídos foram Sergipe e São Paulo, Minas e Amapá, ou quais outros. Nem constou citação ao Distrito Federal).
Pois bem, no intervalo de quatro dias o apoio a Lula, para hipotético 1º turno, passou de 33% no Datafolha para 40,2% no Sensus. Sete pontos que indicariam mudança de opinião em cerca de 20% do eleitorado, nas presumíveis 96 horas sem fatos de relevância. Serra, naturalmente, despencou, ou o milagre ficaria pela metade: seus 34% no Datafolha minguaram para 28,6%. Mas, curioso, os eleitorados de Garotinho e Heloísa Helena não foram incluídos no milagre da volatilidade: os 10% do primeiro ficaram em 10,5% e os 6% dela só perderam um ponto percentual apagado pela margem de erro.
Os créus sempre disseram que milagre precisa de comprovação. Lá está na pesquisa Sensus, sob a forma de 2º turno. Nos quatro dias de intervalo, Serra descamba de vitoriosos 49% no Datafolha para humilhados 37,6% no Sensus, ao passo que Lula vai dos 41% identificados pelo Datafolha para celestiais 47,6% no Sensus. O eleitorado aderiu a Lula até enquanto dormia.
Com Alckmin na lista, em lugar de Serra, Lula vai de 36% para 42,2%, ao passar do Datafolha para o Sensus. Alckmin cai dos 20% no Datafolha para 17,4% no Sensus. Os eleitores da Garotinho e Heloisa Helena insistem em não se envolver em milagre. E já que definitivo é o segundo turno, Lula voa de 48% no Datafolha para 51,3% no Sensus. Alckmin cai de 39% no Datafolha para 29,7% no Sensus.
Cesar Maia, um dos descobridores da fraude em que a união SNI/ Moreira Franco quis tomar a vitória de Brizola, encontra na pesquisa Sensus incongruências que a derrubam mais do que ela derrubou Serra. Vê-se que não quer levar em consideração que "o método do Sensus", segundo a explicação do seu presidente Ricardo Guedes a "O Globo", "difere do usado pelo Datafolha e pelo Ibope". É verdade. Difere em variados sentidos.


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