São Paulo, sábado, 16 de fevereiro de 2008

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Documentos apontam que Jango era vigiado no exílio

Papéis da polícia e do Exército do Uruguai têm relato de reunião do presidente

Obtido em dezembro por entidade, material traz lista de outros brasileiros que estariam "comprometidos" também com a "subversão"

SIMONE IGLESIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Documentos da polícia e do Exército do Uruguai até hoje inéditos comprovam que o presidente João Goulart (1918-1976) era vigiado no exílio por ser considerado "subversivo".
Em documento do Departamento de Inteligência do Exército, o primeiro do governo uruguaio a vir à tona, Jango aparece em lista com outros seis brasileiros por "estar comprometido com a subversão".
Abaixo dos nomes, há uma ordem para que "se tenha conhecimento das atividades das pessoas mencionadas". Não fica claro a quem ou a quais órgãos a determinação foi dada.
Há também o relato de reunião entre Jango, o então senador do Uruguai Zelmar Michelini (1924-1976), e o ex-presidente da Bolívia Juan José Torres (1921-1976). O encontro em Buenos Aires demonstra que havia troca de informações entre os governos sul-americanos, pois são narradas viagens de Jango à Argentina.
Segundo o documento, Jango, Michelini e Torres se reuniram em data não especificada para tratar de interceder por asilados brasileiros, uruguaios e bolivianos que estavam em Buenos Aires. "Estão conjugando esforços para obter das autoridades argentinas uma definição sobre o problema dos asilados", diz um trecho.
Em outro documento, do Departamento Nacional de Informação e Inteligência da polícia uruguaia, com data de 22 de fevereiro de 1974, há novamente lista de nomes de brasileiros vigiados com endereços, números de documentos, telefones, local e data de nascimento e atuação política e profissional.
Os outros brasileiros monitorados eram Dagoberto Rodrigues (amigo de Jango); Edmundo Ferrão Moniz de Aragão (jornalista); Ivo de Magalhães (administrador financeiro); João Alonso Mintegui (adido comercial da Embaixada do Brasil no Uruguai no governo Jango); Neiva Moreira (jornalista); e Carlos Olavo da Cunha Pereira (advogado e jornalista).

Reforço
Os dois documentos foram obtidos no Uruguai em dezembro pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Brasil.
O presidente da entidade, Jair Krischke, afirmou que os dados reforçam as suspeitas de que havia interesse dos governos militares do Brasil e do Uruguai de eliminar Jango.
"São provas documentais importantes porque todos os três que estavam na reunião relatada no documento do Exército estão mortos e, por coincidência, morreram em 1976."
Jango morreu em 6 de dezembro de 1976 na Fazenda La Villa, em Corrientes, Argentina, horas após deixar Maldonado, no Uruguai. Oficialmente, teve um ataque cardíaco.
À Folha, em janeiro, o ex-agente de inteligência do governo uruguaio Mario Barreiro disse que o presidente foi envenenado. Segundo Barreiro, Jango foi vigiado de 1973 até 1976, período em que morou no Uruguai e na Argentina.
O ex-agente está preso por roubo, posse e tráfico de armas em Charqueadas (RS).
Michelini foi assassinado em maio e Torres, em junho de 1976, ambos em Buenos Aires.
Os depoimentos do coronel argentino Antonio Herminio Simón e do carcereiro Néstor Norberto Cendon à Justiça daquele país também reforçam a tese de espionagem a Jango.
Condenado em 18 de dezembro de 2007 a cinco anos de reclusão por participar da Operação Condor, Simón disse que o Exército argentino tinha ligações com o Comando do 2º Exército, atual Comando Militar do Sul. Segundo Cendon, o serviço de inteligência argentino tinha base em Paso de Los Libres, cidade da Província de Corrientes, onde se localizava a fazenda onde Jango morreu.


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