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São Paulo, domingo, 16 de março de 2003

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NO PLANALTO

Lula chefia governo de idéias novas e boas

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Deu-se num restaurante de Brasília. Ex-auxiliar de FHC conjeturava com parlamentares tucanos sobre o petismo. "Acho que o governo Lula tem programas novos e bons." A mesa franziu o cenho. Explicou-se: "Os planos novos, como o Fome Zero, não são bons; e os planos bons, como a austeridade econômica, não são novos." Gargalharam.
O tucanato, que andava amuado, diverte-se. Desfruta os seus dias de PT. Lula trouxe para Brasília a ânsia do novo. Fez crer que cada vez que a boca de um petista se abrisse sairia lá de dentro uma novidade inaudita. Saíram platitudes, trivialidades, matéria prima para piadas.
Criados para abrigar velhos amigos, os novos ministérios ampliaram a usina de chistes. Tome-se o caso de Benedita da Silva (Promoção Social). Decidiu-se que coordenará programas sociais de outros ministérios. Ora, não cuida nem do que é dela.
Benedita ganhou uma pasta oca. Para amenizar-lhe a insignificância, enxertou-se no organograma o CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social). Lida com as instituições filantrópicas. Aquelas que, em troca de isenção de tributos, deveriam socorrer a plebe.
Por artificial, o arranjo deu em desgoverno. A generosidade patrocinada pelo conselho de Benedita drena R$ 2,1 bilhões anuais dos cofres do colega Ricardo Berzoini (Previdência), de cuja estrutura o CNAS foi arrancado. Benedita finge que segura o volante da filantropia. Mas é Berzoini quem dita a direção.
Instalou-se duplo comando numa área recoberta de lodo. É de justiça reconhecer que Berzoini pisa o lodaçal com aparente disposição para torná-lo mais limpo. Nos bastidores, tramou a troca da representação governista no CNAS -nove funcionários de diferentes ministérios.
Mudaram-se todos, exceto um: Gilson Dayrell. Funcionário do Ministério do Trabalho, alia-se com frequência aos interesses das filantrópicas, sobretudo as vinculadas à Igreja Católica. Sobrevive no conselho graças a sacrossantas pressões acolhidas pelo ministro Jaques Wagner (Trabalho).
Sob o calor dos holofotes, o CNAS viu-se compelido, em 2002, a se mexer. Cassou certas filantrópicas que, beneficiadas pela remissão fiscal, davam de ombros para a bugrada.
Punições em último grau, sem possibilidade de recurso administrativo, já somam R$ 62 milhões por ano. A lista inclui alguns gigantes filantrópicos. Entre eles o Hospital Sírio Libanês (R$ 9,7 milhões anuais) e a Universidade Gama Filho (R$ 18,4 milhões).
Contando os atrasados -a pena é retroativa-, chega-se a R$ 113 milhões. Corrigido, o débito vai a mais de R$ 200 milhões anuais. É o tamanho do prêmio que a Previdência vem concedendo à pseudofilantropia. O dimensionamento final do descalabro depende do vigor no manuseio do rodo.
Trama-se uma derradeira rasteira no CNAS de Benedita. Deseja-se retirar do conselho o caráter executivo que tem hoje. A palavra final sobre a concessão de regalias fiscais às filantrópicas passaria a ser prerrogativa exclusiva do INSS de Berzoini. A tese é polêmica e depende de mudança na lei.
Em ofício de 21 de fevereiro, a Controladoria Geral da União, órgão da Presidência, oferece munição para Berzoini. Diz ter confirmado em auditorias a ocorrência de "irregularidades" na área da filantropia. Endossa e recomenda a poda de poderes do CNAS. Confirmada a providência, Benedita fará história. Será a primeira ministra a enfrentar o desafio de gerir o nada, o vazio absoluto.



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