São Paulo, quinta-feira, 16 de março de 2006

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ O MARQUETEIRO

"Não vou responder... Da primeira vez contrariei meus advogados e só me ferrei", diz ex-publicitário de Lula a congressistas

Amparado pelo STF, Duda silencia em CPI

Lula Marques/Folha Imagem
Bilhete entregue pelo advogado Tales Castelo Branco a Duda Mendonça com a instrução de dizer sempre a frase "não vou responder"


MARTA SALOMON
FERNANDA KRAKOVICS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

"Não vou responder." As palavras, anotadas pelo advogado Tales Castelo Branco num pedaço de papel, foram repetidas à exaustão pelo publicitário Duda Mendonça ontem nas cinco horas de depoimento à CPI dos Correios, o último antes do fim dos trabalhos.
Munido por um habeas corpus concedido pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que impedia a sua prisão caso não colaborasse com as investigações, Duda se recusou a responder até as perguntas mais simples, como o nome de sua mulher e dos filhos. O silêncio, além de frustrar expectativas da CPI, agravou a situação do ex-marqueteiro do presidente Lula, segundo o relator Osmar Serraglio (PMDB-PR). "Demos a ele a oportunidade de esclarecer algumas coisas, e ele não o fez; vamos encaminhar como sendo algo comprovado", disse o deputado.
Já indiciado pela Polícia Federal, Duda insistiu em que seguia a estratégia de seus advogados para não complicar sua defesa e mudou o comportamento adotado no primeiro depoimento à CPI: "Em agosto, compareci espontaneamente, abri meu coração e disse a verdade. O que ganhei? Fui vítima de uma campanha difamatória com fins políticos, cujo alvo não era eu", disse à saída do Congresso, repetindo o discurso com que começara seu depoimento: "Da primeira vez contrariei meus advogados e só me ferrei".
Na sua primeira ida à CPI, Duda disse ter recebido R$ 15,5 milhões do caixa dois do PT como pagamento pelas campanhas de 2002 e serviços prestados em 2003. Desse total, R$ 10,5 milhões foram depositados numa conta chamada Dusseldorf, nas Bahamas.
"Evidentemente ele não falou a verdade no primeiro depoimento", disse Serraglio. A Dusseldorf teria movimentado cerca de US$ 400 mil a mais do que o valor declarado por Duda. A PF e a Procuradoria investigam a existência de outras contas dele no exterior.
"Seria uma oportunidade ímpar para ele esclarecer as informações divergentes", lamentou o presidente da CPI, senador Delcídio Amaral (PT-MS), preocupado com a decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF. "Ainda bem que isso aconteceu no final dos trabalhos da CPI." Na liminar, Mendes disse que a autorização de se calar estava restrita a perguntas que pudessem incriminá-lo. "Com relação aos fatos que não impliquem auto-incriminação, persiste a obrigação de o depoente prestar informações."
Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) costumam conceder liminar autorizando pessoas que irão depor em CPI a ficar caladas, por causa de um princípio constitucional que as desobriga de fornecer informações que as incriminem.
Pela Constituição, um dos direitos fundamentais do cidadão é: "o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado".
Os ministros entendem que a palavra "preso" vale para todas as pessoas que estão sob investigação policial, judicial, administrativa ou parlamentar. Para eles, há uma distinção entre testemunhas e acusados. Apenas os primeiros são obrigados a assinar um termo de compromisso de revelar a verdade. O fato é que o STF não tem controle sobre o que seria ou não uma confissão de crime.

Sessão fechada
Depois das primeiras três horas e meia de depoimento, a CPI realizou uma sessão fechada para questionar o marqueteiro com dados sigilosos sobre sua movimentação financeira no exterior. Essa parte foi restrita ao senador Delcídio e aos deputados Serraglio, Eduardo Paes (PSDB-RJ) e Maurício Rands (PT-PE). "Tenho sido vítima de uma campanha difamatória de todos os níveis, tentando destruir uma imagem de 30 anos de trabalho... Gosto muito das coisas francas e abertas, mas meus advogados me convenceram a não falar. Eu falei uma vez e me dei mal", disse Duda.
Os parlamentares ficaram o tempo todo insistindo nas perguntas, para vencê-lo pelo cansaço. Duda suspirou várias vezes, fechou os olhos como se dormisse e consultou os advogados, mas continuou se recusando a falar. Dizia estar incomodado, mas ria ao repetir que não iria responder.
"Como marqueteiro o sr. deve estar percebendo que a sua imagem está ruim. Tem aquela máxima do Chacrinha: "quem não se comunica, se trumbica'", disse o relator. Duda afirmou que seu único "equívoco", já sanado, foi não ter pago os R$ 4 milhões de imposto devido pelo dinheiro remetido ao exterior. "Como fico eu? Tem um comercial de um partido político [PFL] na TV que me coloca como corrupto. Já fui prejulgado e condenado", disse ele.
O deputado Carlos Willian (PTC-MG) foi o único a ter uma pergunta respondida. Questionado se acreditava em Deus, Duda disse que sim. "Tenho certeza que vou ser absolvido, no momento oportuno, pela Justiça dos homens. Pela justiça de Deus, tenho certeza absoluta que Ele não me incriminou", disse o publicitário.


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