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ENTREVISTA ANTONIO CARLOS VALENTE
Telefônica é candidata a comprar BrT e Telemar se governo autorizar fusões
ELVIRA LOBATO
EM SÃO PAULO
O presidente da Telefônica,
Antonio Carlos Valente, 54, admite que o grupo espanhol é
candidato potencial à compra
da Brasil Telecom e da Telemar, caso o governo autorize a
fusão e aquisição entre concessionárias de telefonia fixa, o
que hoje é proibido.
Em entrevista, na sede da
empresa, em São Paulo, o executivo criticou a tese de que o
Brasil deveria assegurar a sobrevivência de um grupo nacional do setor, para conter o
avanço dos grupos Telefônica e
Telmex (dono da Embratel, da
Claro e de parte da Net) que dominam os mercados no restante da América Latina.
Segundo ele, o êxito do modelo de telecomunicações no
Brasil se deve às regras claras e
de longo prazo, definidas antes
da privatização da Telebrás,
que previam igualdade de tratamento entre capital nacional
e estrangeiro.
FOLHA - Qual a posição da Telefônica diante de uma possível fusão
entre Telemar e Brasil Telecom? O
ministro das comunicações, Hélio
Costa, já se manifestou favorável.
VALENTE - Respeitaremos as
decisões que forem tomadas
pelo governo brasileiro. Mas
quero lembrar que, se o modelo
brasileiro de telecomunicações
teve êxito, foi devido à criação
de regras claras e previsíveis
para o desenvolvimento do setor. Nas regras estabelecidas
[antes da privatização da Telebrás, em 1998] não havia discriminação entre capital nacional
e estrangeiro. Alterar esse conceito não contribuirá para o
êxito. Há um processo mundial
de convergência tecnológica
dos meios de comunicação, que
exige muitos investimentos e
tem levado à fusão de empresas
no exterior. Esse processo vai
chegar ao Brasil. Em condições
de igualdade, estamos aptos a
analisar todas as oportunidades de negócios. Acreditamos
no Brasil e confiamos que as regras de igualdade de tratamento entre capital nacional e estrangeiro serão mantidas.
FOLHA - O sr. não considera justificável que o país assegure a existência de uma empresa nacional em um
setor estratégico como telecomunicações? Os italianos estão resistindo
à venda de parte da Telecom Italia
aos grupos AT&T e Telmex.
VALENTE - A situação lá é muito
diferente da brasileira. A Telecom Italia é a empresa do mercado italiano, que atende todo o
país. Já no Brasil, há concessionárias diferentes por região.
FOLHA - O presidente da Bolívia,
Evo Morales, assinou decreto para
nacionalização da Entel (telefonia
de longa distância, celular e acesso à
internet), da qual a Telecom Italia é
acionista. Está nascendo um movimento na América Latina contra o
domínio estrangeiro nesse setor?
VALENTE - Acho que não. A onda
de abertura dos mercados de
telecomunicações na América
Latina, nos anos 90, ocorreu
porque os Estados eram incapazes de atender às necessidades das populações. Antes da
privatização, telefone era um
bem que se declarava no Imposto de Renda no Brasil, e havia apenas 4 milhões de celulares. [Hoje são 100 milhões]. A
situação dos Estados não se alterou, e as necessidades difíceis
de serem transferidas para a
iniciativa privada, como segurança, saúde e educação, ainda
precisam ser equacionadas. A
Bolívia tem um modelo de telecomunicações "sui generis". A
telefonia local é explorada por
cooperativas, e a Entel faz a conexão entre as cooperativas.
FOLHA - Qual é o objetivo da Telefônica com a compra da TVA? Para a
associação de televisão por assinatura, seria para eliminar a concorrência da TVA no mercado de banda
larga de São Paulo, pois restariam
dois grandes competidores: a Net e
a Telefônica, ainda mais fortalecida.
VALENTE - Não respondo a comentários. A Telefônica é obediente a leis e regulamentos.
Competição tem a ver com dimensão dos competidores. O
dia em que a TVA tiver aliança
com um grupo focado, com conhecimento de gestão como a
Telefônica, a competição será
fortalecida, e certamente isso
preocupa nosso concorrente.
FOLHA - A Telefônica cogita comprar outras operadoras de TV por assinatura?
VALENTE - Todas as oportunidades que possam gerar algum
valor para a empresa são analisadas, com certeza.
FOLHA - O sr. disse que os investimentos para a convergência tecnológica levarão à fusão entre teles.
Elas não poderão bancar os investimentos com a estrutura atual?
VALENTE - Talvez não na velocidade desejada. A questão não se
limita à estrutura societária das
empresas. Passa também pela
regulamentação. É preciso um
ambiente que garanta o investimento a longo prazo.
FOLHA - O que na legislação emperra a convergência?
VALENTE - Um dos pontos é a diferença de regulamentação entre os setores de comunicação,
telecomunicação e das novas
mídias, como a internet. O Código Brasileiro de Telecomunicações, que rege a radiodifusão,
é de 1962. A TV a cabo é regulada por uma lei de 1995, cuja redação espelha a preocupação
que havia na época com o monopólio estatal da Telebras. A
Lei Geral de Telecomunicações
está completando dez anos, e
também precisa ser revista, à
luz das novas tecnologias.
FOLHA - A lei da TV a cabo exige
controle de capital nacional nas operadoras e proíbe as concessionárias
de telefonia fixa local, como a Telefônica, de terem tv a cabo em suas
áreas de concessão. É isso que o sr.
considera ultrapassado?
VALENTE - Esses dois pontos
são exemplos da defasagem.
Refiro-me ao contexto em que
a lei foi feita. A Telebras monopolista, detentora das redes de
longa distancia e de telefonia
local não existe mais. A Lei Geral de Telecomunicações, por
sua vez, dá peso excessivo à telefonia fixa, que está perdendo
espaço para a telefonia celular.
A sociedade deve refletir sobre
os marcos legais criados em
épocas distintas, e decidir aonde quer chegar em dez anos, e
qual legislação necessária para
atingir os objetivos.
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