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Sarney diz que não errou e que não deixa presidência
"Parlamento desmoralizado é um desejo de alguns segmentos da sociedade"
Para ele, imprensa precisa
entender que existem 81
repartições no Senado e
que "cada senador é o
chefe do seu gabinete"
Lula Marques/Folha Imagem
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O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no anexo 1 da Casa, onde concedeu entrevista
FERNANDO RODRIGUES
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Acuado por uma série de desvios administrativos dentro do
Senado, o presidente da Casa,
José Sarney (PMDB-AP), 79
anos, afirma que não errou ao
indicar parentes para cargos na
Casa e que não irá renunciar.
Diz, sem citar nomes, suspeitar
de sabotagem interna.
Considera necessário mudar
regras, mas afirma que erros
praticados no passado podem
ficar sem punição, pois "cada
um deve julgar o que fez de errado e de certo".
Inquieto, mexendo os joelhos de maneira intermitente
enquanto estava sentado em
um sofá em seu gabinete, Sarney afirmou que vai "exercer [o
cargo] até o fim".
A onda de escândalos no
Congresso, que se intensificou
na Legislatura iniciada em fevereiro, atingiu Sarney em
cheio nos últimos dias.
Rebate todas as acusações.
Reafirma não ter percebido que
recebia R$ 3.800 de auxílio-moradia por mês. A nomeação
de um neto teria sido à sua revelia. Sobre as sobrinhas, considera não haver erro.
Durante 55 minutos de entrevista, o senador maranhense
que se elege pelo Amapá tomou
apenas meio copo de água. No
meio da atual onda de escândalos, relata ter chegado a uma
conclusão: "Há uma tendência
de buscar democracia direta.
Tudo aponta nesse sentido".
FOLHA - Como o sr. avalia a onda
de escândalos envolvendo o Senado
e o sr.?
JOSÉ SARNEY - A vida sempre me
reservou desafios. A crise da
democracia representativa está
atingindo todos os Parlamentos no mundo inteiro.
FOLHA - Por culpa de quem?
SARNEY - A notícia em tempo
real transformou o Parlamento, ele fica quase envelhecido.
Em face disso há uma divergência de saber quem realmente
representa o povo. É a mídia
eletrônica, são as ONGs, é a sociedade civil ou os representantes eleitos? Esse é o grande problema que estamos vivendo.
FOLHA - O sr. contratou a Fundação
Getúlio Vargas para fazer uma reforma administrativa no Senado.
Agora, o sr. também tem aparecido
em meio a acusações de comportamento impróprio. O que aconteceu?
SARNEY - Olha, eu acho que eu
tenho um nome que deve ser
julgado com respeito pelo país.
Eu tenho uma biografia, nunca
alguém associou minha vida
pública ao nepotismo. Os fatos
que colocaram estou mandando examinar. O que estiver errado, se corrija. Se eu tiver algum erro, eu sou o primeiro a
corrigir. Mas acho que nunca
conduzi de outra maneira que
não fosse com correção.
FOLHA - E o caso do seu neto, contratado pelo senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA)?
SARNEY - Depois de eu ter sido
tudo, se eu fosse acusado de ter
nomeado um neto era realmente um julgamento que seria injusto. Eu não pedi ao senador. Disse isso e ele confirmou. E, se ele tivesse me consultado, teria sido o primeiro a
dizer não.
FOLHA - Quando o sr. soube, qual
foi sua reação?
SARNEY - Ele próprio saiu. Já
era um problema a ser administrado pelo Cafeteira. O que a
imprensa tem de entender é
que aqui dentro do Senado temos 81 repartições. Cada senador é o chefe do seu gabinete.
Quem nomeia é ele.
FOLHA - Seu neto saiu por conta do
nepotismo, mas entrou no lugar a
mãe dele. O sr. soube disso?
SARNEY - Eu não sou responsável pelo gabinete do Cafeteira.
FOLHA - O que o sr. acha da afirmação do senador Cafeteira de que nomeou seu neto por dever favores a
seu filho, Fernando Sarney?
SARNEY - Você acha que eu, como presidente do Senado, tenho minha biografia, vou discutir uma coisa dessa? Não vou
discutir um assunto desse. Minha resposta para vocês é essa.
FOLHA - E os outros casos relacionados ao sr.: duas sobrinhas empregadas em gabinetes de senadores,
de Roseana Sarney (PMDB-MA) e de
Delcídio Amaral (PT-MS).
SARNEY - Esse é um caso que
está sendo estudado, porque
parece que ele foi colocado agora. Eu pedi para ser investigado.
Eu acho que há uma certa armação no caso da Roseana, na
publicação de que foi ato secreto. Esse problema, que não é
meu, a chefe de gabinete dela
diz que os dados não conferem.
Está sendo analisado.
FOLHA - E do Delcídio?
SARNEY - Do Delcídio, eu realmente pedi a ele, uma sobrinha
da minha mulher, funcionária
de carreira do Ministério da
Agricultura, mudou-se para
Mato Grosso do Sul, pedi que
ela fosse requisitada para trabalhar no gabinete dele. Eu
acho que não tem nenhum erro
em ter feito esse pedido a ele.
FOLHA - Há atos secretos?
SARNEY - Estou convencido de
que há muitas falhas, que pode
ter havido não publicações. Vamos examinar.
FOLHA - O ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia disse que os senadores conheciam os atos secretos.
É correta a afirmação?
SARNEY - Eu nunca soube.
FOLHA - Mas o que aconteceu? Os
atos não eram públicos...
SARNEY - Não sei. Isso nós estamos tentando apurar.
FOLHA - Quando Agaciel deixou a
direção-geral do Senado, o sr. o saudou pelos serviços prestados. Mantém a mesma opinião sobre ele?
SARNEY - É um assunto de ordem pessoal, de valor, que acho
que não cabe numa entrevista.
FOLHA - Até agora, nenhum congressista foi punido e poucos devolveram dinheiro gasto indevidamente. Isso não produz uma sensação de
impunidade?
SARNEY - A população pode até
contestar a validade do Congresso. A democracia não vive
sem Parlamento. E Parlamento
fraco, desmoralizado, é desejo
de segmentos da sociedade.
FOLHA - Esse enfraquecimento não
ocorre por causa da resposta tímida
dos congressistas? No episódio do
auxílio-moradia pago indevidamente, inclusive ao sr., não seria o caso
de todos devolverem o dinheiro?
SARNEY - Nunca tinha recebido
auxílio-moradia. Recebi por oito meses. Mandei interromper
ao saber. Quanto aos outros, cada um fará o seu julgamento.
FOLHA - O sr. devolveu o dinheiro
ao Senado?
SARNEY - Vou ressarcir. Está
em estudo como é que se deve
proceder. Isso será um gesto
pessoal, meu.
FOLHA - Os outros estão obrigados
a devolver o dinheiro?
SARNEY - Não. Isso é uma decisão pessoal. Acho que é da lei.
Eles estão usufruindo benefício
que é extensivo ao funcionário
público de maneira geral.
FOLHA - O Congresso é o maior responsável pela crise?
SARNEY - Sim, claro que o Congresso tem responsabilidade.
Estamos num período de
exaustão do modelo de democracia representativa. Há uma
tendência de buscar uma democracia direta. Tudo aponta
nesse sentido.
FOLHA - O sr. se arrepende de sua
candidatura a presidente do Senado? Pensou em renunciar?
SARNEY - Não. Minha vida foi
sempre feita de desafios. Vou
exercer até o fim.
FOLHA - De todos os desvios que
estão acusando o sr., qual o sr. considera erro mais grave?
SARNEY - Não tenho nenhuma
responsabilidade sobre o auxílio-moradia. No caso da minha
sobrinha, eu estou assumindo.
Não cometi erro nenhum. Querer julgar toda a minha vida por
eu ter pedido por uma sobrinha
de minha mulher, acho extremamente errado, uma injustiça
em relação a mim.
Eu deveria ser julgado com
mais respeito. Sou o parlamentar mais antigo neste país. Estou fazendo um esforço grande
na minha idade.
FOLHA - Está sendo sabotado?
SARNEY - Não descarto essa hipótese. Até porque falam dos
atos secretos, mas só aparecem
os meus. Não tenho provas.
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