São Paulo, domingo, 16 de julho de 2000


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ELIO GASPARI

Sinais estranhos


Há indícios de que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, pretende transformar a sua simpatia pelo movimento dos sem-terra em ajuda material. De que tipo, não se sabe.
Ele já criou um canal de entendimento com a guerrilha colombiana.

Grão-tucano
Falta muito pouco para que o ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, se transforme no próximo presidente do PSDB. Já tem a simpatia do governador Mário Covas e já se dispôs a deixar o ministério, para evitar uma incestuosa acumulação de cargos.
Se tudo der certo, Pimenta sairá candidato ao governo de Minas. Acredita-se que alavancará a votação do candidato tucano à Presidência. Ficou pelo caminho a alternativa do deputado paulista Alberto Goldman.

Aviso
FFHH precisa socorrer o presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul. Desde sua posse, em março do ano passado, ele está combatendo em duas frentes. Numa, cuida para que as coisas andem direito no presente e no futuro. Na outra, cuida para que o passado durma em sossego.
Segundo seu antecessor, o doutor Joel Rennó, Reichstul "não é do ramo". Talvez por isso, vai-lhe ficando cada vez mais difícil dirigir a empresa sem olhar pelo retrovisor.
Reichstul não tem temperamento para sair por aí contando o que achou, mas não é justo impor-lhe o risco de ver a sua administração confundida com a anterior.

General Lalau
Nos anos 70, quando projetou-se à custa das boas relações que tinha com militares que servia na máquina repressiva montada em São Paulo, o apelido do advogado Nicolau dos Santos Neto era "general". Agora, graças ao repórter Carlos Brickman, sabe-se que um de seus amigos era o major Benoni de Arruda Albernaz, um dos primeiros oficiais do Exército identificados como torturadores. Ele chefiava a equipe A de interrogatórios do DOI paulista. Meteu-se em negócios e foi defenestrado para Brasília. Mais tarde, foi processado por estelionato numa transação de terrenos.

Breve: CPI das Privatizações
Crédito: Folha Imagem + Alex Freitas
Legenda: Eduardo Jorge, com outros Gremlins
Quando um governo depende mais do silêncio do que das palavras de seus ex-colaboradores, vai mal a coisa. Eduardo Jorge Caldas Pereira pertencia à espécie palaciana dos Gremlins. São personagens simpáticos que não podem ser molhados depois da meia-noite, pois viram bichos perversos. Expostos à luz do sol, derretem.
Quando Eduardo Jorge estiver derretido, o governo terá diante de sua vidraça a pedreira do que será a CPI das Privatizações. É aí que está o seu problema. Por ordem cronológica, primeiro a da Light, de setembro de 1996. Ela teve dois editais, e o segundo refrescou os compradores. Um trabalho acadêmico realizado na UFRJ estimou que o segundo edital resultou num abatimento de R$ 850 milhões. Uma coisa é certa: um dos dois editais estava errado. Qual?
Segue-se a privatização da Vale. Uma CPI poderá permitir o esclarecimento da paternidade do consórcio que arrematou a empresa. Quanto à maternidade, não há muito a procurar. Pariu-o a arca dos fundos de pensão de empresas estatais. O consórcio destinava-se a impedir que o empresário Antonio Ermírio de Moraes e a Anglo-American ficassem como únicos interessados. Passados três anos, o consórcio esfacelou-se. Começou a esfacelar-se poucas semanas depois do leilão. Documentadamente, uma facção queria fatiar a empresa por meio de sucessivas liquidações de seu patrimônio. Quem acionou os fundos de pensão falava em nome do Palácio do Planalto.
Resta a privatização das teles. Das fitas do BNDES, resta uma pergunta: se FFHH autorizou o uso do seu nome para impedir que a Previ atrapalhasse o leilão, por que a Previ não foi enquadrada? Se isso tivesse acontecido, a Viúva teria embolsado R¹ 1 bilhão a mais pela rede que forma hoje a Telemar.
Todos esses casos são aborrecidamente velhos. O que é novo, a cada dia, é a ilusão do Planalto de que estejam peremptos. Como os Gremlins, basta que alguém os molhe depois de meia-noite. Virarão coisas horríveis. Cesar Maia acertou o pé de Ciro Gomes Crédito: Andy Warhol + Folha Imagem + Alex Freitas Legenda: Na montagem, Cesar Maia e Ciro Gomes no corpo de Elvis Uma das coisas que mais aborrece Ciro Gomes é ser comparado com Fernando Collor. Trata-se de um paralelo injusto. O próprio Ciro já resumiu os problemas de Collor: "A farsa de sua campanha e a corrupção de seu governo". Do governo passado de Ciro não se pode falar em corrupção. Pressupor que, eleito, venha a corromper-se, é insultá-lo.
Dizer que sua campanha tem ingredientes de farsa é pura verdade. Há nela uma incompreensível virulência contra os políticos e contra os partidos. Nos dois casos, só contra os que não o apóiam. Percorrendo o Rio com Cesar Maia, seu candidato a prefeito, Ciro atacou a idéia de Luiz Paulo Conde, que deseja armar a Guarda Municipal. Disse o seguinte: "Haverá tentativas demagógicas de fazer as pessoas acreditarem que botando um revólver no coldre do guarda municipal ou aumentando o efetivo, uma visão estreita da repressão, pode-se atenuar a violência. Isso é falso. Cesar tem uma visão muito mais experiente e lúcida".
Nem a idéia de Conde é necessariamente demagógica, nem Cesar Maia tem uma visão mais experiente nem mais lúcida. Aos fatos: No final de janeiro de 1996, quando Maia era prefeito do Rio, armou os guardas municipais que tomavam conta da residência oficial da Gávea Pequena. Dois deles viram uma camionete Mitsubishi passar três vezes pelo portão da casa.
Desconfiaram do veículo, mandaram que parasse. O motorista estava sem rumo, não sabia por onde passava nem distinguiu o fardamento. Os guardas fizeram quatro disparos e um deles atingiu o vidro traseiro do carro. Os guardas acabaram presos por porte ilegal de armas e foram liberados depois de pagar fiança. O que disse o prefeito? "Numa situação dessas, eles devem ser mais enérgicos. Eu vou pedir que a Guarda Municipal tenha mais energia na sua ação." Mais: informou que o motorista da Mitsubishi não tinha documentos e acusou-o de ter consigo um pacotinho de maconha. O delegado que cuidou do caso desmentiu essas duas afirmações. Era apenas um comerciante perdido na noite.
Ciro Gomes não precisa desqualificar Luiz Paulo Conde para trabalhar a candidatura de Cesar Maia. Ao atacar Conde, Ciro não estava obrigado a saber dos tiros da guarda de Cesar Maia, mas tinha razões para se lembrar do que dissera de seu atual candidato durante a campanha de 1996. Cobrado, explicou que chamara de "populista à direita" o projeto de governo da prefeitura de Maia, não a sua figura política. Antes fosse. Em 1996, atacou Cesar Maia pessoalmente. Assim: "Cesar Maia é uma pessoa desonesta e manipuladora. Ele especulou com o dinheiro público".
Se Ciro Gomes não quer que a farsa tome conta de sua campanha, deve respeitar a memória e a inteligência alheias. Um novo estilo na praça: o 0800 Crédito: Basquiat Os manuais de treinamento e os velhos fantasmas que acompanham o gênero humano produziram um novo estilo. É o 0800. Necessário para o exercício de alguns ofícios (como o de atendente de telesserviços), vira uma praga quando atinge níveis mais elevados na hierarquia das empresas.
Dez características dos 0800:
1) Prefere o telefone à conversa pessoal, fax ao telefone e e-mail ao fax.
2) Quando recebe um e-mail, informa ao interlocutor que cuidou do assunto remetendo-o a uma terceira pessoa, da qual a vítima nunca ouviu falar e, provavelmente, jamais ouvirá uma palavra.
3) Delega às secretárias tarefas primitivas e/ou desconexas.
4) Emposta a voz imitando um sintetizador. O 0800 tem obsessão pela impessoalidade.
5) Quando lhe é mostrado que uma situação é irracional, responde que ela deriva do cumprimento das normas. Jamais um 0800 diz que, graças às normas, o problema foi resolvido. É um porta-voz dos procedimentos.
6) Assim como na Idade Média as pessoas atribuíam tudo o que podiam à vontade divina, o 0800 atribui o que pode (sobretudo os problemas) ao computador.
7) Não distingue a atenção que dá a uma pessoa da atenção que dá ao terminal. É capaz de passar dez minutos teclando, com o olhar fixo no monitor (nunca no interlocutor). Ao final, diz algo que nada tem a ver com o que se estava tratando.
8) O 0800 classe A não delega responsabilidades. Só tarefas, cuidando para que as pessoas não saibam o que estão fazendo.
9) Vale-se de um dialeto capaz de desidratar o sentido de velhos conceitos. Um 0800 de boa cepa fala de uma maneira no trabalho e de outra fora dele. Administra silêncios. Quanto mais tempo um 0800 consegue ficar calado depois de ouvir uma pergunta, mais 0800 ele é.
10) Exercita uma impessoalidade eletrônica, mas há uma coisa que lhe dá alegria, libertando-lhes emoções. É o momento em que informa ao interlocutor que uma determinada coisa não pode ser feita ou que um determinado problema não tem solução.
Não confundir o 0800 com o embromador. Ele está sinceramente convencido de que faz o certo. Um bom 0800 é pontual, trabalhador e atencioso. Por isso tem um estilo.

ENTREVISTA
Milton Temer (62 anos, deputado federal, PT-RJ)
- Greta Garbo acabou no Irajá e o senhor, com sua denúncia da formação de um cartel de bancos para unificar a cobrança da taxa de juros sem levar em conta a queda determinada pelo Banco Central, acabou virando notícia no "The Wall Street Journal"? Isso não lhe abala a alma petista?
- Isso mostra quão longe a finança brasileira está do capitalismo. O "The Wall Street Journal" defende o capitalismo e está disposto a morrer lutando pela livre concorrência. É um conservador que se preza. Para muitos banqueiros brasileiros, a concorrência é uma eventualidade. Eles gostam do Estado protegendo-os e têm horror a competição. A minha denúncia é simples. No dia 20 de junho o Banco Central baixou a taxa de juros de 18,5% para 17,5%. No dia 24, o "Jornal do Brasil" noticiou que os dirigentes dos maiores bancos de varejo do país, reunidos em São Paulo, combinaram que não baixariam suas taxas até que pudessem sentir "maior consistência" na decisão do BC. Isso é formação de cartel. Sugere que o Banco Central tomou uma decisão irresponsável e imprudente, baixando os juros por motivos políticos. Representei à Secretaria de Direito Econômico, ao Cade e ao Banco Central, perguntando-lhes quais providências administrativas tomaram para investigar se os bancos resolveram administrar a taxa de juros de comum acordo, transformando o Conselho de Política Monetária num teatrinho. Se os bancos americanos fizerem isso, o "The Wall Street Journal" chama a polícia.
- Já teve alguma resposta?
- Ainda não. Coisas desse tipo podem demorar algumas semanas. Tenho esperanças com a SDE e com a Cade. Com o Banco Central o negócio é diferente. Há cerca de um ano o presidente Fernando Henrique Cardoso disse que algumas taxas cobradas pelos bancos caracterizavam "apropriação indébita"'. Oficiei ao BC, perguntando-lhe quais providências tinha tomado. Responderam-me que nada haviam feito, pois as taxas diferenciadas faziam parte do processo de concorrência. Na hora em que o Banco Central tem coragem de sugerir que o presidente da República fez uma afirmação leviana, ou na hora em que você tem um leviano na Presidência da República, pouco resta a fazer pelo caminho do BC.
- O senhor já teve alguma notícia da reação do Banco Central?
- Oficial, ainda não. Soube que um de seus diretores mostrou-se empenhado no assunto, mas não conseguiu achar a minha representação. Dá vontade de rir. Há um mistério no sistema de classificação de documentos no BC. Parece que por lá funciona um mecanismo seletivo de desaparecimento do que não convém. Já sumiram as pastas do processo do Banco Nacional. Agora, não acham a minha representação. Se o BC tem interesse, posso ajudá-lo, O número do seu protocolo é 000431-2/3. Deu entrada no dia 27 de junho, às 15h58. Recado dado
O PFL fez saber a FFHH que há uma pedra no caminho das relações do partido com o Planalto. É a escolha do próximo presidente da Câmara dos Deputados. Pelo lado tucano, corre o deputado Aécio Neves. Pelo PFL, Inocêncio de Oliveira. Para evitar o choque, não custaria oferecer um ministério a Aécio.



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