São Paulo, quinta-feira, 16 de setembro de 2004

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CANDIDATOS NA FOLHA/MARTA

Prefeita afirma preferir pedir voto diretamente a eleitor malufista a ter o ex-prefeito em seu palanque; para petista, "se a imprensa fosse mais neutra", teria obtido aprovação de 42% no início do governo

"Maluf no meu palanque, não", diz Marta sobre segundo turno

Tuca Vieira/Folha Imagem
Marta Suplicy durante sabatina promovida pela Folha


JOSIAS DE SOUZA
COLUNISTA DA FOLHA

"Maluf no meu palanque, não." Em tom enfático, a prefeita Marta Suplicy (PT) disse ontem que, passando para um eventual segundo turno da eleição municipal, não irá promover nenhum tipo de entendimento com o ex-prefeito Paulo Maluf (PP). Prefere pedir votos diretamente "a cada eleitor do Maluf". Em campanha pela reeleição, Marta expôs sua posição durante sabatina promovida pela Folha. Falava a um público de cerca de 300 pessoas no Teatro Folha. A manifestação foi provocada por uma pergunta vinda justamente da platéia.
O espectador perguntou à prefeita se admitiria a hipótese de compor-se com Maluf no segundo turno. Cobrou uma resposta "direta", sem tergiversações, "na lata". Daí o timbre enfático empregado por Marta que, em resposta a uma pergunta anterior, fora bem menos taxativa: "Minha posição em relação ao Paulo Maluf é clara. Nunca mudei nada do que disse", limitara-se a dizer.
As declarações de Marta surgem num instante em que os bastidores da política paulistana encontram-se envenenados pela suspeita da existência de um entendimento de bastidores unindo o petismo ao malufismo. Uma suspeita tonificada na última segunda-feira.
Também ouvido na série de sabatinas da Folha, Maluf derramou-se em elogios ao PT. Evitou deliberadamente criticar o trabalho de Marta. Comprometeu-se em dar seqüência a vários programas implantados durante a administração da atual prefeita.
A propósito, perguntou-se a Marta por que ela não explora em sua campanha o teor das investigações do Ministério Público em torno de supostos investimentos mantidos por Maluf no exterior. "Tenho a impressão de que a campanha não polarizou em torno desse assunto porque ele está na Justiça", disse a prefeita. Acrescentou que as apurações avançaram graças à contratação, às expensas da prefeitura, de um escritório de advocacia no exterior.
Sabatinada na última sexta-feira, Luiza Erundina (PPS) já havia ateado fogo à atmosfera eleitoral ao declarar que os contornos da atual gestão municipal tornaram Marta Suplicy "igualzinha" a Paulo Maluf. A despeito da desfeita, Marta abriu os braços para Erundina ontem: "Ela é sempre bem-vinda", disse, ao comentar a hipótese de receber a adversária num eventual segundo turno.
A sabatina de ontem, a exemplo das anteriores, ocorreu no Teatro Folha. Começou às 15h05 e foi até 17h07. Marta respondeu a perguntas do psicanalista Contardo Calligaris (colunista da Ilustrada) e dos jornalistas Clóvis Rossi e Gilberto Dimenstein (colunistas e membros do Conselho Editorial da Folha), Renata Lo Prete (editora do "Painel") e Nilson Camargo (editor responsável do "Agora").
A seguir, alguns dos tópicos que foram abordados no encontro:
 

PESQUISAS ELEITORAIS
Perguntou-se a Marta a opinião dela a respeito de um aparente paradoxo exposto nas pesquisas de opinião. De acordo com sondagem feita pelo Datafolha, a gestão da atual prefeita é bem avaliada (ótima ou boa) por 42% dos paulistanos. A despeito disso, levantamento realizado pelo mesmo instituto a colocou em segundo lugar na disputa eleitoral (33%), atrás de José Serra (PSDB).
Repetindo estratégia que havia sido adotada por Maluf, Marta enxergou nas páginas dos jornais, em especial da Folha, a razão do descolamento dos dois índices. Ela recomendou a leitura da coluna escrita sobre o tema, no domingo, pelo jornalista Marcelo Beraba, ombudsman da Folha.
"As matérias do seu jornal são negativas em relação ao meu governo", disse Marta, dirigindo-se à banca de entrevistadores. "Temos pouca oportunidade de mostrar para o seu leitor o que estamos fazendo. Se tivéssemos uma imprensa mais neutra, esse índice de 42% de aprovação teria surgido desde o início do governo, e não agora, na campanha."
Minutos depois de atacar a Folha, Marta exibiu reportagem publicada ontem no jornal como algo que a deixara "muito satisfeita" por ter declarações elogiosas de usuários de ônibus.

TERRORISMO ELEITORAL
Marta foi confrontada com o conteúdo de outra reportagem publicada ontem pela Folha. O texto informava sobre os receios do ministro José Dirceu (Casa Civil), que disse que a ultrapassagem de Serra sobre Marta nas pesquisas fizera "acender uma luz vermelha" na campanha.
Ela foi questionada se foi esse sinal de alerta que a fez julgar necessário chamar a atenção para a suposta atmosfera de crise que sobreviria a uma eventual vitória tucana. Marta tentou situar suas declarações anteriores, apelidadas de "discurso do terror". "Hoje temos duas forças políticas na cidade, dois grandes partidos. Têm divergências notórias sobre como devem ser encaminhadas as questões da cidade. A minha candidatura tem afinidade com o governo federal. A outra [de Serra] vai usar a prefeitura para influir na disputa [presidencial] de 2006."

BILHETE ÚNICO
Marta deixou-se demorar nas observações sobre a "guerra" que travou com a "máfia dos transportes" por ocasião da implantação do bilhete único. "Foi um grande desafio", disse. "Enfrentamos greves e ameaças [...] Agora, quando vejo na televisão o outro candidato mostrando o bilhete único, uma coisa que nós fizemos, ficou meio assim...".
Indagou-se a Marta Suplicy quanto custou à prefeitura a implantação do bilhete único. Não tinha a resposta. Insinuou que a pergunta embutia uma pegadinha. Como a banca de entrevistadores insistisse na legitimidade da questão, recorreu ao secretário municipal de Transportes, Gerson Luiz Bittencourt, e ao ex-secretário da pasta Jilmar Tatto (hoje secretário de Governo), que a observavam desde a platéia. Mas também não responderam.

MEA-CULPA NA SAÚDE
Em exposição feita antes de ter sido crivada de perguntas, Marta Suplicy disse ter encontrado a saúde do município em estado de "terra arrasada". Acha que fez muita coisa nesse setor. Mencionou, por exemplo, "a redução à metade dos casos de HIV", a contenção de uma "epidemia" de dengue, a "queda nos índices de mortalidade materna em 31%" e a ampliação das equipes de saúde da família "de 200 para 500".
Como se desejasse justificar as críticas que vem recebendo, a prefeita disse: "Como ainda há muito por fazer, parece que nada foi feito". Ainda assim, disse ter tomado uma decisão em relação a esse assunto: "Vou parar de fazer mea-culpa". A resolução seria abandonada poucos minutos depois.
Perguntou-se a Marta o que ela faria de diferente se pudesse reiniciar a sua administração na prefeitura. Ela pensou e disse: "Eu teria feito coisas diferentes na saúde. Demorei dois anos para tomar iniciativa. Deveria ter feito antes".

PRESTAÇÃO DE CONTAS
Ainda na exposição inicial, Marta disse que leva uma vantagem sobre os oponentes. Como está à frente da prefeitura há praticamente quatro anos, pode privilegiar a "prestação de contas" em detrimento das "promessas". Julga ter muito a mostrar. Orgulha-se de ter dado "prioridade" à população desassistida.
"Quando assumi, sabia que teria de conviver com uma cidade com enorme pobreza", disse Marta. "Havia mais de um milhão de desempregados, sem perspectiva de solução a curto prazo. Tudo o que fiz foi pensando em tornar a cidade mais justa."
A prefeita mencionou vários projetos que gostaria de aprofundar num segundo mandato.

CEUS-EDUCAÇÃO
Nada parece dar mais satisfação à prefeita do que discorrer sobre os escolões que inaugurou na periferia de São Paulo. Refere-se ao programa em tom grandiloqüente: "Com o CEU, nós largamos a pedra fundamental do combate ao ciclo da pobreza".
Marta acha que, com mais quatro anos de mandato, pode acabar com a exclusão social na cidade de São Paulo. "Quatro anos bastam?", estranhou um dos entrevistadores. Marta esclareceu que se referia apenas às crianças. Acha que pode "eliminar a favela" que contato com peças de teatro, apresentações musicais, atividades esportivas e de lazer.
"Não entendo por que o meu adversário [José Serra] quer acabar com tudo isso", provocou Marta Suplicy.
Sabatinado na véspera, o tucano Serra apresentara as suas razões. Disse a prefeitura só conseguiu acomodar nos CEUs 5% dos alunos. Em contrapartida, as escolas especiais consomem, de acordo com o candidato tucano, 40% da verba destinada à educação.
Quando Marta foi submetida a uma questão que envolvia os custos dos CEUs, também não tinha o custo global. Mas trazia alguns números na ponta da língua: "Cada CEU custa entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões, dependendo da região. A manutenção custa mais uns R$ 500 mil [por mês]". A prefeita acrescentou: "O orçamento para educação tem sido de 31%. Mas no ano passado gastamos 32,2%. Considero que todo esse dinheiro foi muito bem gasto". Repetiu a promessa de construir mais 24 CEUs.

LIXO
Marta disse que não vai voltar atrás em sua decisão de homologar a licitação do lixo. Na véspera, Serra dissera que considera "plausível" que haja corrupção no processo. De resto, considerou impróprio que uma prefeita "em fim de mandato" formalize um "contrato de R$ 10 bilhões, por 20 anos". As declarações do tucano, mereceram uma "leitura muito criteriosa" por parte da prefeita petista. "Pensei em processar, mas eles são cuidadosos", disse.
Segundo ela, o processo continua sob análise de uma comissão de licitação. Se o contrato for considerado correto, não hesitará em assiná-lo. Desdenhou das críticas de Serra. Afirmou que há a necessidade de investir R$ 1,1 bilhão nesse setor. "A prefeitura não tem dinheiro." E a iniciativa privada não toparia realizar as inversões se não lhe fosse proporcionada a concessão por 20 anos. Marta disse que prefeituras do PSDB fizeram o mesmo tipo de contrato. Mencionou a de Vitória (ES).

SEPARAÇÃO CONJUGAL
Perguntou-se a Marta se achava que perdeu votos pelo fato de ter-se separado do senador Eduardo Suplicy para casar-se com Luis Favre, "um estrangeiro". Ela disse que o PT fez uma pesquisa de opinião para aquilatar os efeitos da separação. Não mencionou o casamento. "Quando você é casada com o senador mais amado do Estado e se separa, isso choca as pessoas. Imaginei que fosse chocar mais", disse. "Mas a pesquisa mostrou um amadurecimento da população de São Paulo", prosseguiu Marta. "As pessoas disseram: "O que ela faz na vida pessoal é problema dela. O que interessa é o que ela vai com a cidade". Quanto a isso, acho que dei a resposta com o meu trabalho."


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