São Paulo, quarta-feira, 16 de setembro de 2009

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ANÁLISE

Toda proposta de reforma tem vício de origem

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Há um vício de origem em toda e qualquer reforma eleitoral proposta e aprovada pelo Congresso: como são beneficiários diretos das regras vigentes, seus membros tendem a agravar as distorções que favoreceram sua própria eleição e a rejeitar eventuais melhorias que pudessem resultar num sistema mais aberto e, portanto, democrático.
Essa complicação primordial ajuda a explicar várias das dificuldades experimentadas pelo Legislativo, das pequeninas, como as reiteradas tentativas de tutelar os meios de comunicação de massa em período eleitoral, às graúdas, como a reforma política, que, embora seja frequentemente citada como redenção para todos os problemas do país, parece condenada a jamais sair do campo das belas intenções.
O mundo ideal de um candidato é aquele no qual ele possa dizer o que bem entende sem ter de recear o contraditório. Na impossibilidade de calar a crítica, vale pelo menos submetê-la a regras tão draconianas quanto possível, a fim de que expor eventuais disparates do pretendente a cargo público se torne uma aventura juridicamente incerta, à qual poucos estarão dispostos a arriscar-se. É nesse espírito que nossos parlamentares votam a nova Lei Eleitoral.
De modo análogo, é muito pouco provável que os legisladores venham um dia a aprovar uma reforma política que contribua para promover a coesão partidária e rompa com os laços do clientelismo. Eles, afinal, são os indivíduos que saíram vitoriosos no atual ambiente; é difícil que se empenhem de verdade em modificá-lo.
Curiosamente, os interesses de classe dos parlamentares sobrepõem-se até às divisões ideológico-partidárias. Provam-no a celeridade e desembaraço com que tramitam questões corporativas como a proposta de emenda constitucional que amplia o número de vereadores em todo o país ou os cíclicos e generosos aumentos salariais para o Legislativo.
Esse tipo de comportamento não é exclusividade do Congresso brasileiro, ainda que os vícios nos pareçam particularmente graves por aqui. Trata-se, afinal, de uma das aporias do sistema democrático com a qual é preciso conviver.
Assim, talvez seja melhor renunciar a voos muito altos -como o de uma reforma política com características de panaceia- e pressionar por mudanças pontuais não tão impossíveis de obter, como o fim definitivo da tutela de políticos sobre a internet.


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