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ANÁLISE
É difícil separar governo de campanha
HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
"Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem
defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais experimentadas de tempos em
tempos". Embora muitas vezes
suprimida, a primeira oração
da máxima celebrizada por
Winston Churchill (1874-1965)
não poderia ser mais exata: a
democracia está repleta de aporias e dificuldades.
Elas se materializam por todos os lados, da caravana do
presidente Luiz Inácio Lula da
Silva pelo rio São Francisco, à
ampliação dos gastos publicitários da Prefeitura de São Paulo,
passando pelo périplo nordestino de José Serra.
O conflito aqui se dá entre o
princípio da impessoalidade da
administração pública e a realização de eleições nas quais os
governantes tomem parte, seja
diretamente como candidatos,
seja de forma indireta como padrinhos de outros postulantes.
Só haveria solução para este
problema se se pudesse isolar
completamente o gestor do
candidato. Só que isso não é
factível nem mesmo desejável.
Especialmente no caso de
uma recondução, o que se espera do eleitor é que diga sim ou
não à continuidade do governo
com base em suas realizações.
A própria ideia de partido político perderia o sentido se o
prestígio de um dado administrador não pudesse ser repassado a seu companheiro de sigla.
As leis que criamos para lidar
com o problema mal disfarçam
sua intratabilidade. Tome-se,
por exemplo, o instituto da desincompatibilização. Na tentativa de evitar que o governante
use a máquina a seu favor, obrigamo-lo a renunciar ao cargo
seis meses antes do pleito.
A regra, evidentemente, não
vale no caso da reeleição. Aplicá-la, afinal, alijaria a própria
vontade popular, que o elegeu
para um mandato de quatro
anos prorrogáveis por mais
quatro, não de três e meio.
Daí resulta o seguinte paradoxo: um presidente que dispute a reeleição pode ficar no cargo, já um prefeito que o desafie,
embora detentor de uma máquina muito menos poderosa, é
obrigado a deixar o posto.
No atual estágio da democracia brasileira, é bem provável
que normas como essas, apesar
de suas incongruências, ainda
tenham uma função. A verdade,
porém, é que esse não é o primeiro nem o maior dos problemas da democracia. Temos de
conviver com eles, pois as alternativas são todas muito piores.
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