São Paulo, domingo, 17 de junho de 2007

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ELIO GASPARI

Vavá está sendo linchado


O homem do "arruma dois pau pra eu" é o biombo. Querem a jugular de Lula, o dos 60 milhões de votos

GENIVAL INÁCIO da Silva, o Vavá, está sendo covardemente linchado porque é irmão do presidente da República. Ele é acusado de tráfico de influência sem que até hoje tenha aparecido um só nome de servidor público junto ao qual tenha traficado qualquer pleito que envolvesse dinheiro do erário. Um fazendeiro paulista metido numa querela de terras queria reverter uma decisão unânime do Superior Tribunal de Justiça. Vavá recomendou-lhe um advogado. Isso não é tráfico de coisa alguma. Um empreiteiro queria obras e encontrou-se com ele num restaurante. Ninguém responde se Vavá conseguiu favorecer esse ou qualquer outro empreiteiro.
A divulgação cavilosa e homeopática de trechos de gravações telefônicas envolvendo parentes de Nosso Guia tornou-se um processo intimidatório e difamador capaz de fazer corar generais do Serviço Nacional de Informações, o SNI da ditadura. No caso de Vavá, as suspeitas jogadas até agora no ventilador não guardam nexo com os fatos. Não há proporção entre as acusações que lhe fazem e o grau de exposição a que foi deliberadamente submetido.
A Polícia Federal vasculhou sua casa (um imóvel de classe média em São Bernardo do Campo). A diligência foi apresentada como parte de uma Operação Xeque-Mate, destinada a desbaratar uma quadrilha envolvida em contrabando, tráfico de drogas e máquinas caça-níqueis. Não era pouca coisa. Pelo que se sabe até agora, coletaram cinco papéis. Entre eles, duas cartas que não foram entregues. Vavá tentou alavancar dois casos com empresas privadas (Vale e CSN). Nenhum dos pleitos chegou à direção das companhias.
Os grampos policiais estabeleceram um vínculo entre Vavá e dois mercadores de casas de jogo e atravessadores de negócios. Um deles, Nilton Servo, ameaçou "trucidar" a família de um desafeto. O outro, Dario Morelli, compadre de Lula, julgava-se protegido pelas suas amizades e disse que a polícia pensaria "duas vezes em fazer qualquer coisa". Foi preso. Os dois planejavam maracutaias e contavam com a ajuda do irmão do presidente, a quem dizem ter dado algo como R$ 15 mil nos últimos meses. Nas palavras de Servo, "o Vavá é para ser usado".
Numa conversa, Vavá fez-lhe um pedido: "Ô, arruma dois pau pra eu?"
Lula tem 15 irmãos e algo como cem parentes. Desde que Tomé de Souza chegou a Salvador, nenhuma família de governante teve tão poucas relações com o Estado como a dos Silva. Mais: nenhuma veio de origem tão modesta e continuou a viver em padrões tão modestos. (Noves fora o Lulinha da Gamecorp.)
Vavá meteu-se por sua conta e risco com os negócios de Servo e do compadre Morelli. Desqualificá-lo por lambari, deseducado ou pé-de-chinelo é parte do linchamento. Ele é um cidadão, ponto. Seus atos vêm sendo investigados e serão levados à apreciação da Justiça. Podia ser membro da Academia Brasileira de Letras, dava na mesma. Antes da conclusão do inquérito policial, Vavá foi irremediavelmente satanizado a partir de indícios, suspeitas e manipulações. Seu linchamento não busca o cidadão metido com vigaristas. Busca a jugular do irmão.
Durante a última campanha eleitoral, quando o comissariado petista chafurdou na compra de um dossiê contra os tucanos, demonizou-se a figura de Freud Godoy, um assessor de Lula, conviva de sua panelinha. Durante três dias ele pareceu encarnar toda a corrupção nacional. Freud foi arrolado em dois processos, um criminal e outro eleitoral. Dizer que foi inocentado é pouco. Ele nem sequer foi indiciado.
O pessoal do século 21 sabe que Jimmy Carter é um ex-presidente dos Estados Unidos (1977-1981), Prêmio Nobel da Paz de 2002. Passará para a história como um exemplo de retidão. Isso agora. Quando estava na Casa Branca, Carter foi atazanado pela exposição de seu irmão Billy, caipira alcoólatra que se tornou lobista (registrado) do governo líbio. Criou-se o neologismo Billygate. Morreu em 1988, aos 51 anos, falido. Virou poeira da História.
Ninguém quer a jugular de Vavá, como não se queria a de Billy Carter. O negócio é outro.

DE NOVO
Não custar repetir, ainda que pareça coisa de chato: em fevereiro de 2004, Lula mandou sua primeira mensagem ao Congresso. Lula prometia: "A regulamentação da atividade dos bingos vai organizar o setor e assegurar recursos para o esporte". (Página 177)
No dia seguinte, numa reunião no Planalto, o secretário da Presidência, Luiz Dulci, disse que esse parágrafo não estava na versão que passou por sua mesa. Veio de onde?

ARTE DA MARTA
O conselho de Marta Suplicy às vitimas das esperas nos aeroportos ("relaxe e goze"), não foi apenas grosseiro e infeliz, foi também uma brincadeira baseada numa das piadas mais estúpidas da cultura machista.
Completa, ela é assim: "Se o estupro é inevitável, relaxe e aproveite". Seu criador foi o homem da previsão do tempo de um noticiário da TV americana. Chamava-se Tex Antoine. Perdeu o emprego.

GRAMPOS ILUSTRES
Nosso Guia não é a primeira vítima da associação de políticos com exploradores de máquinas caça-níqueis. Em setembro de 1964, em plena campanha eleitoral, o presidente americano Lyndon Johnson ligou para um colunista amigo, reclamando de William Miller, candidato a vice-presidente na chapa do republicano Barry Goldwater:
"Esse sujeito é escória. Cá entre nós, pegamos ele. Não meta o meu nome nisso. (...) Ele está ligado a um bando desses operadores de caça-níqueis. Ganhou US$ 58 mil na venda de um boliche. O f. da p. não declarou esse dinheiro".
Sabe-se disso porque Johnson preservou as fitas das conversas que tinha ao telefone.

BOA NOTÍCIA
Pela primeira vez, alguém que acompanhou a prática de malfeitorias na Infraero começou a contar o que sabe. Apareceu o caminho das pedras, dos loteamentos de espaços públicos e de serviços de apoio, até obras de concreto-areia.
Os companheiros, que podiam ter corrigido os problemas a partir de 2003, prolongaram o que era doce.

CUIDADO
A Agência de Vigilância Sanitária entrou numa encrenca. Em abril passado, ela liberou o remédio Acomplia, vendido como pílula mágica de emagrecimento. Coisa de mãe: a pessoa começa a emagrecer pela barriga. Na semana passada, uma comissão de especialistas da Food and Drug Administration, recomendou, por 14x0, que o Acomplia (rimonabant, um primo distante da maconha) ainda não seja vendido nos Estados Unidos. Querem mais estudos, pois o princípio ativo da droga age sobre o cérebro, e, na fase de testes, sua dose de 20 mg indicou uma sensível piora em quadros depressivos e o aparecimento de idéias de suicídio.
A maioria das pessoas que toma Acomplia emagrece e passa bem, obrigado. A União Européia aprovou o consumo da marca em junho de 2006, mas, diante da decisão da FDA, anunciou que vai reestudar a licença. Em 1997, a Anvisa ficou mal na foto quando demorou para proibir a venda de drogas como o Isomeride, proibidas nos EUA e na Europa. A agência demorou para limpar as prateleiras das farmácias. O emagrecedor provocava ataques cardíacos.
Serviço: o estudo, com 37 páginas em inglês e mediquês, está no sítio da FDA, basta procurá-lo pela palavra "rimonabant".


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