São Paulo, domingo, 17 de julho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ NOVAS VERSÕES

Comissão relaciona confissão do empréstimo a manobra feita em 1992 por assessor de Collor

Para CPI, Valério e Delúbio forjam "Operação Uruguai 2"

RANIER BRAGON
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Parlamentares da CPI dos Correios classificaram de "Operação Uruguai 2" a nova versão apresentada pelo publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza e pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares para explicar os saques milionários feitos em dinheiro nas contas das empresas de publicidade SMPB e DNA, das quais Marcos Valério é sócio.
Reservadamente, a versão já é tratada de "Operação Paraguai" até entre governistas da comissão. À semelhança do empréstimo simulado com banqueiros uruguaios para explicar a origem do dinheiro que financiava gastos do ex-presidente Fernando Collor de Mello, a explicação de Marcos Valério e Delúbio teria problemas para ficar de pé, avaliam congressistas já debruçados nas primeiras informações da quebra do sigilo bancário do publicitário e de suas empresas.
O Banco Central fixou prazo até terça-feira para o envio das informações que faltam dos bancos. As atenções estão voltadas para o Banco Rural, que concentra a maior parte da movimentação bancária de Marcos Valério, assim como os saques feitos em dinheiro vivo. "A gente tem condições de pegar tudo", disse o presidente da CPI, senador Delcídio Amaral (PT-MS).
O publicitário e o ex-tesoureiro do PT prestaram nos últimos dias depoimentos à Procuradoria Geral da República em que contam história semelhante: o publicitário teria contraído empréstimos em bancos, cerca de R$ 40 milhões, em nome de suas empresas, e repassado o dinheiro a pessoas indicadas por Delúbio.
"Acho que esse é um jogo armado para tentar desviar o foco real do problema. Na prática, estão querendo reeditar a Operação Uruguai, ou seja, encontrar uma justificativa para a origem e o destino dos recursos, justificativa que não corresponde à realidade. Querem limpar a operação", afirmou o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA).
O deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), um dos sub-relatores da CPI, vai na mesma linha. ""Operação Uruguai 2", foi a primeira coisa que eu associei hoje, porque, de repente, surgiu assim uma história muito bem contada entre ele [Valério] e o Delúbio", disse. "Isso cheira a Operação Uruguai", afirmou.
Fruet diz acreditar que os empréstimos repassados por Valério rendiam a ele contas para suas empresas em órgãos do governo. "Pelo volume de contratos que ele [Valério] fez, acredito que foi uma clara simulação: ele fazia o empréstimo e passava o dinheiro para o PT e, em contrapartida, conseguia contas publicitárias."
Operação Uruguai foi o nome dado ao empréstimo de US$ 3,7 milhões forjado com banqueiros de Montevidéu para justificar a origem do dinheiro que financiou a campanha do ex-presidente Fernando Collor de Mello ao Planalto e seus gastos no cargo.
Deputados da oposição suspeitam que a fonte de Valério seria desvio de recursos públicos ou dinheiro de empresários que obteriam vantagens do governo.

Semelhanças
O relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), questionado sobre as semelhanças dos empréstimos Valério com aqueles da Operação Uruguai, concordou: "Até terça-feira teremos os nomes dos bancos, a relação das pessoas que sacaram e evidentemente nós iremos imediatamente tentar associar a nomes do PT", disse o deputado.
A CPI ouve o depoimento de Delúbio na quarta-feira. Um dia antes, deve receber a lista das pessoas que sacaram o dinheiro vivo na agência do Banco Rural em Brasília. A lista está em poder da Justiça mineira.
Marcos Valério é acusado pelo deputado Roberto Jefferson de ser o "operador" do suposto "mensalão", que consistiria no pagamento, pelo PT, de mesadas a deputados do PP e do PL.
Outro integrante da comissão, o deputado Maurício Rands (PT-PE), também diz desconfiar da história. "Não acho verossímil. Se houve, foi uma coisa isolada do ex-tesoureiro [Delúbio], não foi uma coisa de partido", afirmou.
De acordo com Fruet, a CPI vai agora para cima dos bancos que teriam feito os supostos empréstimos a Valério. A suspeita é que eles possam ter usado Valério como forma de escamotear o repasse de dinheiro ao PT.
"Vamos em cima dos bancos que fizeram os empréstimos, para saber por que esse bancos fizeram os empréstimos, se cobraram, se executaram. Vamos especular: dá para cogitar que foi uma forma de os bancos darem dinheiro para o PT", disse.

Caixa 2
Integrantes da CPI também consideraram "grave" a afirmação de Delúbio à Procuradoria de que todas as campanhas do PT, à exceção da de Luiz Inácio Lula da Silva, receberam doações não declaradas à Justiça Eleitoral, esquema conhecido como "caixa dois".
"É uma coisa tão grave que a gente não saberia nem qual é a solução. Se isso for verdadeiro, ele está dizendo que todos os mandatos obtidos são mandatos comprometidos", disse Serraglio.
"Ele confessou crime eleitoral. É um chute no estômago de todo petista. Imagine isso na campanha eleitoral", declarou Fruet.
O líder do PP, deputado José Janene (PR), insistiu ontem em que o partido não se beneficiou da suposta arrecadação de dinheiro pelo caixa dois pelo PT. "Tenho absoluta convicção de que o partido não teve benefício nenhum nisso", disse o deputado.
O PP é um dos partidos da base governista que teria recebido recursos repassados por Delúbio.

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