São Paulo, sexta-feira, 17 de agosto de 2007

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Vaiados por 12 alunos no Rio, Lula e Cabral reagem com ironia

Presidente diz que os estudantes que furaram bloqueio da segurança são "desprovidos de consciência política"; para o governador, eles são "pequeno-burgueses"

Stuart Cunningham e Torsten Kanzow
Após furar da segurança, grupo de 12 estudantes universitários vaia o presidente Lula e o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), que, em discurso, hostilizaram os manifestantes

RAPHAEL GOMIDE
ENVIADO ESPECIAL A CAMPOS

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), trocaram hostilidades com 12 estudantes universitários, enfeitados com nariz de palhaço, que furaram o bloqueio da segurança e os vaiaram durante inauguração em Campos dos Goytacazes (a 278 km do Rio).
Os jovens foram chamados de "desprovidos de consciência política" por Lula e de "pequeno-burgueses exercendo o mau humor de quem reclama de barriga cheia" por Cabral.
No primeiro compromisso público de Lula no Estado do Rio depois da vaia no Maracanã na abertura do Pan, no dia 13 de julho, sua segurança tentou barrar os poucos opositores presentes e suas faixas de protesto foram recolhidas.
No bairro de Guarus, reduto do rival Anthony Garotinho -ex-governador do Rio e presidente regional do PMDB em litígio com Cabral Filho-, Lula inaugurou uma escola técnica sob aplausos de alunos do Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica) e adolescentes do programa federal Jovem Aprendiz, convocados para o ato, em contraste com pequena vaia e apitaço de 12 estudantes da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf).
O governador perdeu o controle quando começou a discursar e viu -e ouviu- o grupo vaiando-o. De modo ríspido, pediu que fossem vaiados pela platéia presente -majoritariamente favorável a ele e Lula.
"Vocês vão ser vaiados aí, meia dúzia vaiados pela multidão. Vamos dar uma vaia para eles! Uhh, uhh!", estimulou o governador. "Pronto! Agora deixem eu falar, companheiros! Meia dúzia de meninos pequeno-burgueses exercendo o mau humor de quem reclama de barriga cheia... Fica quieto aí, deixa eu falar, rapaz!", disse.
Na literatura marxista, os pequeno-burgueses oscilam entre o proletariado e a burguesia, atuando como agente complementar desta última na opressão da primeira.
Após a afirmação de Cabral, os jovens continuaram a vaiar e a fazer gestos obscenos. O governador fez o discurso mais breve entre todos os presentes, 2 minutos e 30 segundos.
Ao tomar o microfone, Lula comentou a crítica de Cabral aos manifestantes.
"Antes de começar a falar, Sérgio, antes de cumprimentar o povo de Campos, eu queria dizer, ô Sérgio: Você nunca mais fique nervoso com o pessoal que protesta ali. Porque esse pessoal é tão jovem e tão desprovido de consciência política, que vem protestar com nariz de palhaço! Palhaço é uma coisa alegre, fantástica... Eles precisam arrumar uma outra coisa para protestar, porque daqui a pouco vai haver um movimento dos palhaços, que são a alegria de milhões de crianças, contra o tratamento dessa gente", disse o petista.

Sem ovos
Os 12 alunos do DCE (Diretório Central dos Estudantes) da Uenf levaram ovos para atirar nos políticos, mas desistiram de usá-los ao verem a segurança barrar até narizes de palhaço de plástico e suas faixas pedindo bandejão na universidade e contra a reforma universitária.
Os estudantes entraram "camuflados" na multidão, com os narizes de palhaço escondidos. Segundo o vice-presidente do DCE, Daniel Soares, 20, o órgão não está vinculado a nenhum partido político nem à UNE.
"O segurança abriu a faixa, leu e disse que não podia entrar por causa do conteúdo. Só entravam aquelas que diziam "Lula é bonitão'", reclamou Frederico Graniço, 19, aluno de ciências sociais que gritou "fascista" e "censura" no protesto.
Os alunos se disseram surpresos com a reação de Lula e Cabral. "Nossa surpresa foi que esses caras são táticos e políticos profissionais. Vi que Cabral não estava conseguindo se concentrar, gaguejava porque estava prestando atenção na gente. Aí ele perdeu a compostura, chamou vaia para a gente. A partir do momento em que eles falaram da gente ao microfone, ganhamos", afirmou Graniço.

"Que democracia é essa?"
Dois coordenadores do Sinasef (Sindicato Nacional de Educação Federal), Paulo César Ferreira e Guiomar Valdez, professores do Cefet, contaram terem sido impedidos de entrar com cartazes contra Lula. Uma delas, com os dizeres "Governo Lula: Corrupção 1000%, reajuste para os servidores federais da Educação, 0%", foi tomada por seguranças.
"Que democracia é essa em que só pode entrar faixa para elogiar? É isso que pensa um presidente que a vida toda protestou? Estamos sem reajuste há 12 anos e não pude entrar por pensar diferente. Fui excluído como cidadão, professor da casa e sindicalista", reclamou Ferreira. "Fomos barrados porque não viemos celebrar. Só estamos fazendo protesto pacífico", disse Guiomar.


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