|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SAIA JUSTA
Assessoria do presidente procura evitar discurso longo do ditador
Lula teme ato antiamericano de Fidel
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Nem a data de criação da Alca
(Área de Livre Comércio das
Américas) nem o protecionismo dos países ricos a seus agricultores na OMC (Organização
Mundial do Comércio). A
maior preocupação da diplomacia brasileira hoje se chama
Fidel Castro.
O ditador cubano propôs ao
governo brasileiro receber Luiz
Inácio Lula da Silva em Havana
neste mês com um comício para
"1 milhão de pessoas", segundo
um auxiliar do presidente. A
proposta assustou a equipe de
Lula. A princípio, o presidente
aceita, mas com duas condições.
A primeira é que o comício
não se transforme num ato antiamericano, já que Lula passará
por Cuba na sequência de uma
viagem aos Estados Unidos. A
segunda é mais prosaica, mas
fundamental: que o discurso de
Fidel não dure as três ou quatro
horas habituais.
A Folha apurou que o embaixador do Brasil em Cuba, o ex-deputado federal Tilden Santiago, já foi acionado pelo Planalto
para tratar da proposta de comício com as autoridades e mencionar particularmente a duração do discurso de Fidel.
Desde o início do ano, Cuba é
tratada de forma cautelosa pela
diplomacia brasileira e pelo PT,
que tem laços históricos e afetivos com o regime castrista.
Lula e Fidel são amigos. O ministro-chefe da Casa Civil, José
Dirceu, se exilou em Cuba
quando foi perseguido pelo regime militar de 1964. Dirceu disse na posse que a geração brasileira que chegou ao poder era
"devedora de Cuba" e que considera sua segunda pátria essa
ilha caribenha de 12 milhões de
habitantes.
Apesar disso, chegou a ser discutida no governo a conveniência de uma viagem a Cuba logo
após a ida aos Estados Unidos,
onde o presidente brasileiro
abrirá a 58ª Assembléia Geral da
ONU (Organização das Nações
Unidas). No início do ano, Fidel
ordenou uma onda de repressão com prisões e o fuzilamento
de três dissidentes que sequestraram um barco para tentar fugir para os EUA, o que deixou o
PT numa saia justa.
Gratidão
O governo ensaiou uma condenação das mortes, mas manteve intacta sua boa relação com
Fidel. Apesar de estar ciente da
possibilidade de se desgastar,
Lula resolveu bancar a viagem.
O presidente brasileiro avalia
que é uma demonstração de política externa independente e de
gratidão a Fidel. Em 1995, um
ano após Lula ter perdido uma
eleição presidencial para o tucano Fernando Henrique Cardoso, Fidel, em visita ao Brasil, fez
questão de ir a São Bernardo do
Campo, no ABC paulista, abraçar Lula em sua casa. Aquele foi
um ano duro para Lula.
Um auxiliar do presidente disse à Folha que ele acha até bom
que Fidel reúna centenas de milhares de pessoas na praça da
Revolução, palco tradicional de
enormes comícios em Havana.
No entanto, quer ter a certeza de
que não embarcará numa encenação para hostilizar os Estados
Unidos nem passar o constrangimento de ouvir Fidel discursar horas a fio. Do contrário, seria melhor um jantar daqueles
de varar a noite.
Texto Anterior: Conceição diz que vai "ajudar o governo" Próximo Texto: "Humilhei a esteira", diz presidente sobre exames Índice
|