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OPINIÃO
Internet e eleições
JOAQUIM FALCÃO
ESPECIAL PARA A FOLHA
NAS ÚLTIMAS eleições,
a Justiça não permitiu
internet na campanha
eleitoral. Agora, o Senado permitiu. A Câmara dará a palavra
final até o dia 3 de outubro. As
eleições nunca mais serão as
mesmas. Por múltiplas razões.
Primeiro, o eleitor estará
mais mobilizado e proativo.
Jornais, revistas, rádio e televisão estabelecem comunicações
de mão única. Deles para os
eleitores. A internet é comunicação de mão dupla. Ou tripla.
Dos eleitores com os candidatos, com os meios de comunicações e sobretudo entre si. Aliás,
todos entre si. E, como o projeto não estabeleceu qualquer
restrição às redes sociais -Orkut, Facebook, MySpace, UolK,
Twitter-, nessas redes a campanha já começou. Não é preciso o cidadão esperar convenções de partidos ou escolha de
candidatos.
Uma consequência do cidadão mais proativo é que deverão aumentar as denúncias infundadas contra candidatos e
partidos, bem como as defesas
apaixonadas. Aumentarão as
mentiras e os desmentidos. Todos ficarão mais expostos. Como a difusão é imediata, podem
chegar a milhares e milhões de
eleitores, o dano ou benefício é
também imediato.
Para os casos de injúria, calúnia e difamação haverá sempre
o recurso da ida à Justiça. Que
será sempre insuficiente. Porque é sempre a posterior.
Quem terá que distinguir a
mentira da verdade eletrônica
será o próprio eleitor. A disputa
ocorrerá na própria internet.
De blogs contra blogs. De site
contra site. De rede contra rede. A internet é uma arena. Um
longo aprendizado da cidadania responsável está apenas começando.
É verdade que rádio e televisão atingem mais brasileiros do
que a internet. E que ainda é pequeno o uso da internet em casa. Mas o crescimento da internet é o maior de todas as mídias.
A tendência é crescente e inevitável. Em julho, o número de
usuários cresceu cerca de 10%
em relação a junho. De 33 milhões para mais de 36 milhões.
Sem contar as lan houses. A liberação da internet terá consequência de mão dupla: aumentará a participação dos cidadãos
nas eleições e ao mesmo tempo
estimulará mais usuários no dia
a dia da internet.
Segundo, é que o voto do eleitor jovem vai crescer em importância. Eles são quem mais
usa internet. Representam
mais do que 20% dos eleitores.
A internet deve estimular a inclusão do jovem na política.
Seus valores e interesses referentes, por exemplo, a sexo, família, ecologia e cultura são diferentes. Os jovens são mais
atingidos na oferta e redução de
emprego. Partidos e candidatos
terão que ter propostas específicas para eles.
Terceiro, o uso da internet
como infraestrutura para o financiamento popular do candidato e do partido também deve
crescer. Não instantaneamente, é claro. Mas a internet agiliza a doação individual eletrônica através de transações bancárias, contas de telefone e cartões de créditos. São doações
mais fáceis, rápidas, legais e de
maior controle pela Justiça.
Esse foi o diferencial decisivo
na campanha de Obama. Sua
campanha custou US$ 744,9
milhões, dos quais US$ 500 milhões arrecadados via internet.
A contribuição média foi de
US$ 77 por cidadão. Ou seja,
R$ 145. O peso relativo das doações de campanha das empresas deve cair. Com microdoações pulverizadas, os candidatos estarão menos dependentes
de um grupo, ou daquela empreiteira.
Sem falar que será difícil a
Justiça controlar a interferência ilegal de sites localizados
em outros países. A internet é
global. O risco, pequeno talvez,
é de exportar a campanha eleitoral, para sites globais onde a
lei brasileira não chega.
Até agora o Senado manteve
a liberdade mais ampla, a não
ser para sites empresariais, onde, em nome da imparcialidade, limitou a propaganda em sites de pessoas jurídicas, que
não sejam provedores de internet e de informações ou sites de
pesquisa, e em sites de órgãos
governamentais. E regulou
também o acesso aos debates.
O desafio maior da lei ao regular os meios de comunicação na
campanha eleitoral é justamente este: por um lado, manter a experiência brasileira de
sucesso de controlar a participação excessiva do poder econômico e do poder dos governos nas campanhas. De outro,
assegurar voto livre e liberdade
de expressão a todos.
JOAQUIM FALCÃO é professor de direito
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