São Paulo, quinta-feira, 17 de outubro de 2002

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AGENDA DA TRANSIÇÃO/DESIGUALDADE SOCIAL

Pobreza cai nos "grotões", mas desigualdade regional persiste


Pólos agrícolas do Centro-Oeste e migração de indústrias para microrregiões do Nordeste, atraídas por salários baixos, tornam-se pontos quentes de aumento de renda do país, mas desigualdade regional quase não se alterou durante anos FHC


FÁTIMA FERNANDES
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Gerais de Balsas, no sul maranhense, não tem mais de 110 mil habitantes. É vizinha de Chapadas das Mangabeiras, que reúne oito minúsculas cidades e só três habitantes por quilômetro quadrado.
Pequenas e pouco povoadas, essas cidades aparecem, assim como Parecis (MT), no topo da lista das que registraram os maiores crescimentos de renda na década de 90.
Essas três microrregiões são espaços de prosperidade. Transformaram-se em fortes pólos agrícolas, sobretudo para a produção de soja, milho e algodão, além de exportadoras. Viraram pontos de atração de mão-de-obra.
Nelas, a renda média dos chefes de família subiu de 6% a 8,5% por ano de 1991 a 2000, segundo levantamento do IBGE, com base na renda média mensal dos chefes de família em 1991 e em 2000, atualizado pelo INPC de julho de 2000. Na média das 558 microrregiões do país (que reúnem 5.507 municípios), essa taxa ficou em 2,63%.
Especialistas em estudos regionais e urbanos, porém, são unânimes em destacar que, apesar da expansão de renda nessas áreas, as desigualdades de riqueza entre as regiões brasileiras são as mesmas do início dos anos 90, ou seja, ainda há um abismo entre o Norte e o Sul do país.
"Está claro que essas regiões não conseguiram romper com sua herança de pobreza nos anos do Real", diz Sônia Rocha, diretora do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
No entanto a expansão de microrregiões no Nordeste e no Centro-Oeste é algo para ser considerado. Das 558 microrregiões, 374 comemoram a elevação na renda além da média -a maioria delas está nessas duas regiões. Em 181 microrregiões, a renda cresceu menos do que os 2,63% da média. Em apenas três delas a renda caiu.
Só para comparar, nas microrregiões que englobam capitais do país, só Porto Alegre registrou taxa acima da média, de 2,71%. Em Curitiba, a renda cresceu 2,58%; em Belo Horizonte, 2,32%; em Recife, 2,27%; em Salvador, 1,77%; e em São Paulo, 1,66%.

Investimento privado
O crescimento da renda no país é resultado sobretudo do controle da inflação. Especialistas dizem que o salto na renda em regiões como Gerais de Balsas, Chapadas das Mangabeiras e Parecis e outras é ainda resultado de investimentos privados na produção de soja e de milho para o mercado externo.
"A desvalorização do real favoreceu a exportação de grãos e tornou mais competitiva a produção de algodão no Maranhão, que tem de competir com o produto importado", diz Clélio Campolina Diniz, diretor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais.
O Maranhão também se fortaleceu com a transferência de empresários para o Nordeste em busca de terras mais baratas, afirma José Raimundo Vergolino, professor da Universidade Federal de Pernambuco.
"Na região de Barreiras, os agricultores chegaram antes até da energia elétrica e das estradas. Só mais tarde é que o governo resolveu levar infra-estrutura ao local. O mesmo aconteceu em Gerais de Balsas."
Estudiosos do Nordeste consideram que a instalação de indústrias de calçados, de tecidos e de roupas -devido aos incentivos e à mão-de-obra barata- também teve efeito positivo na renda local.
Grendene e Vulcabrás foram parar no Ceará. A Azaléia, na Bahia. O grupo Vicunha transferiu quase tudo para o Nordeste. A Coteminas construiu fábricas na região. A Ford inaugurou uma unidade em Camaçari (BA).
O salário bruto, na prática, é inferior ao pago pelas indústrias nos locais em que estavam antes instaladas, mas o novo investimento ajuda a elevar a renda local.
Outro indicador do fôlego para as regiões Centro-Oeste e Nordeste é o desempenho do PIB regional. No Centro-Oeste, o PIB per capita subiu 6,18% em 99 sobre 95 -uma taxa elevadíssima. No Nordeste, subiu 5,34%, bem mais do que a média do país, de 1,43%. No Sudeste, o crescimento foi só um pouco acima da média (1,49%). No Sul, foi menor (de 1,17%). No Norte, houve queda de 6,44%, puxada pelo declínio da Zona Franca de Manaus (AM), com a abertura da economia e do extrativismo de madeira.
Para obter as taxas, o Ipea usou dados do IBGE e fez a atualização com base em publicação do BC. Os melhores resultados nas rendas do Centro-Oeste e do Nordeste são visíveis por meio dos indicadores de pobreza. Em 93, 62,2% da população nordestina ganhava até meio salário mínimo por mês. Em 99, esse percentual caiu para 50,1%. No Centro-Oeste, a redução foi de 31,4% para 23,6%.

Previdência rural
A participação do governo Fernando Henrique Cardoso na expansão da renda de algumas microrregiões é um tema polêmico entre especialistas em estudos regionais e urbanos.
Para alguns, boa parte do crescimento da renda no Nordeste é consequência dos programas destinados às famílias mais pobres, como a Previdência para os trabalhadores da área rural, que começou a ser paga em 1992. O número total de beneficiários da Previdência cresceu nos anos FHC, passando de 15,2 milhões em 94 para 20 milhões em 2001.
Para outros, na fase tucana só foram desenvolvidos projetos de pequena expressão para as regiões mais pobres -com a exceção de alguns programas voltados para o aumento do turismo. Na prática, aqueles em ação já estavam em andamento antes da era FHC. "O presidente não colocou nem mil metros de irrigação no Nordeste", afirma Vergolino.


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