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OLHAR ESTRANGEIRO
Só Freud explicaria
JUAN ARIAS
O eco que as eleições brasileiras estão tendo em meio
mundo -muito concretamente,
na Europa e nos Estados Unidos- indica que, desta vez, trata-se de algo mais do que uma
simples e rotineira eleição presidencial. Parece ser algo mais, talvez porque, nos últimos anos, vem
crescendo a consciência internacional de que o Brasil é algo mais
do que um mero país do continente americano. Do futuro do
Brasil, próspero ou miserável, talvez dependam não apenas outras
economias mundiais, mas também outros equilíbrios políticos.
Vem daí o fato de que a simples
possibilidade de uma guinada
para a esquerda, mesmo que moderada e revestida de burguesismo, provoque temores ou esperanças em diferentes setores. E é
sobre esses conceitos opostos que
se joga o resultado das eleições do
dia 27. Por um lado está a esquerda de Lula, à qual aderiram as
outras forças contrárias ao governo derrotadas no primeiro turno,
uma esquerda que desenrola a
bandeira de um Brasil novo, diferente, fundamentalmente ""de esperança".
Por outro, o centrismo de Serra,
que procura afastar o perigo de
uma vitória do PT num momento
econômica e politicamente dramático do mundo, momento esse
que convida mais à prudência e à
manutenção do conhecido, baseando-se mais no ""medo" do que
na ""esperança" de um futuro desconhecido.
Seria preciso ressuscitar Freud,
com suas teorias sobre os impulsos de vida e de morte, para que
ele pudesse analisar essas eleições,
ou, melhor, para que pudesse fazer uma radiografia do que mexe
com o coração e a mente de uma
população como a brasileira, que
se mostra mais madura do que
nunca nas eleições, com característica mais européia do que sul-americana e que já possui anos de
experiência de uma democracia
consolidada. Seria preciso Freud
para saber se essas mais de 100
milhões de pessoas que vão voltar
às urnas estarão dispostas a desafiar o medo do pior ou se optarão
pela segurança do conhecido, o
receio de pôr a perder aquilo que
já foi conquistado. Por qual das
alternativas -a esperança ou o
medo- vão apostar esses 50 milhões de pobres que são o coração
ferido do Brasil, sobre o qual Fernando Henrique Cardoso declarou que "é um país rico, mas injusto"?
Não há dúvida de que muita
coisa, dentro e fora do Brasil, vai
depender do sentido em que vai
pender o fiel da balança: se será a
favor da esperança prometida ou
do medo de que as coisas piorem
em relação a como já estão. Nos
próximos dias, neste momento
em que o cenário internacional
está marcado por temores de todo
tipo, o Brasil será observado por
todo o mundo.
Costuma-se dizer que o povo
brasileiro aponta para um futuro
mais desejado, com sua ausência
de racismo, de intolerância religiosa, de nacionalismo e de terrorismo, com o caráter doce de sua
população, que prefere apostar
na felicidade do que no desespero,
e está claro que essas eleições serão importantes para o resto do
mundo porque vão mostrar qual
é a aposta realmente feita pelos
brasileiros.
A eleição vai mostrar se eles são
capazes de, contrariando ventos e
marés, apostar na difícil "esperança", que é sempre uma incógnita, ou se optarão pela fácil prudência, moderadora de temores
em tempos de tempestade. Ambas
são virtudes cardeais. Ambas são
aspectos legítimas da disposição
humana. Cada povo escolhe o
que lhe é mais natural.
Tradução de Clara Allain
JUAN ARIAS, correspondente no Brasil
do jornal espanhol "El País", escreve
mensalmente nesta seção, às quintas
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