São Paulo, quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

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JANIO DE FREITAS

Defesa da reforma

Se alguma irregularidade envolvesse Jungmann, nada conviria mais a ele e menos às instituições que sua renúncia

PROMETER a renúncia ao mandato, se algo confirmar sua presença no uso ilegal de R$ 33 milhões do Ministério do Desenvolvimento Agrário, ao seu tempo de ministro no governo Fernando Henrique, não é a resposta mais apropriada do deputado Raul Jungmann para a acusação que lhe caiu em cima.
A resposta é inconveniente em dois sentidos. O primeiro, no interesse do próprio Jungmann. Antes de se transferir para a Procuradoria da República em Brasília, onde encontrou oferta abundante para sua disposição, a procuradora Raquel Branquinho deu ao Rio, durante anos, a comprovação de uma persistência incansável. Do seu colega no caso só se pode presumir afinidade com a procuradora. Logo, discursos e entrevistas podem ter certos efeitos, mas, para a Procuradoria, tendem a soar mais como desafio e pouco ou nada como defesa. Aos documentos, deputado Raul Jungmann.
Também no interesse do eleitorado a oferta do mandato é inapropriada. Não que haja, a priori, inclinações a suspeitar da conduta do então ministro. Até ao contrário, a denúncia foi surpreendente. Mas, se alguma irregularidade envolvesse Jungmann, nada conviria mais ao deputado e menos às instituições do que sua renúncia ao mandato. Renunciante, já poderia concorrer nas eleições seguintes. Com a perda do mandato por decisão da Câmara, seriam oito anos de impedimento a cargos eletivos.
Já que a disputa pela presidência da Câmara realça a discussão sobre a reforma dos (maus) costumes parlamentares, vem em hora certa mais uma evidência de que o fim das renúncias protetoras é indispensável. O acaso faz com que a nova evidência venha do deputado Raul Jungmann, que se tem mostrado defensor ardoroso da reforma.

A tradição
Nem a cansativa extensão da nota do Banco Brasil ("Painel do Leitor", 16 jan.) foi suficiente para permitir-lhe negar, ainda que com ligeireza e indiretamente, o perdão de mais de R$ 1 bilhão de dívidas de um grupo de usineiros de cana. Esse é, com toda a certeza, um caso merecer de CPI, que, no entanto, dificilmente virá: diretos e indiretos, os interesses de parlamentares nos financiamentos, renegociações e "repactuações" do Banco do Brasil têm tornado muito raras as investigações dos fatos importantes no Banco do Brasil. Fatos em quantidade inversamente proporcional à sua investigação pelo Congresso.
O Banco do Brasil tem esta velha tradição: as grandes dívidas são proteladas, têm juros privilegiados, e a vantagem final de que, se submetidas ao calote, não é raro transformarem-se em ganho líquido do devedor. Doação do BB, que seus devedores comuns, os industriais e comerciantes às voltas com duplicatas, os acionistas e os cofres públicos cobrem sem saber. É que estão no outro extremo da tradição: para eles, as tábuas da lei.


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