São Paulo, sexta-feira, 18 de abril de 2008

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Irritado, Lula cobra militares por crítica à política indígena

Em meio a crise em RR, comandante militar definiu ação do governo como "caótica"

Presidente antecipa reunião com Jobim, exige explicação da cúpula militar e pode suspender o anúncio de aumento de salários hoje

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

LETÍCIA SANDER
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva exigiu explicações do Ministério da Defesa para as posições do comandante militar da Amazônia, general Augusto Heleno, que anteontem acusou a política indigenista de "lamentável e caótica".
O general tem feito críticas públicas à sanção presidencial da demarcação da reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima. Contrariado com a reação do militar, Lula mandou sua assessoria ligar para o ministro da Defesa, Nelson Jobim, antecipando em meia hora a reunião que teriam para discutir soldos militares e exigindo a presença do comandante do Exército, general Enzo Martins Peri.
O encontro foi às 16h30, mas Lula cortou a discussão sobre o aumento, previsto para ser anunciado hoje, Dia do Exército, e exigiu que os dois cobrassem explicações de Heleno. O general já vinha reclamando da demarcação da reserva e foi incisivo em palestra proferida na quarta passada no Clube Militar, no Rio, dizendo que a política indigenista brasileira está completamente dissociada do processo histórico de colonização do país e que "precisa ser revista com urgência".
Nesse encontro, que teve a presença dos generais da reserva Leônidas Pires Gonçalves e Zenildo Lucena, ministros do Exército antes da criação do Ministério da Defesa, o militar não se referiu especificamente ao conflito envolvendo a reserva Raposa/Serra do Sol, embora tenha criticado a separação de índios e não-índios.
"Pela primeira vez estamos escutando coisas que nunca escutamos na história do Brasil. Negócio de índio e não-índio? No bairro da Liberdade, em São Paulo, vai ter japonês e não-japonês? Só entra quem é japonês? Como um brasileiro não pode entrar numa terra porque é terra indígena?", disse.
Cerca de 18 mil índios vivem na reserva, de onde deveriam estar sendo retirados os não-indígenas, principalmente os produtores de arroz que exploram a área há décadas. Essa retirada, porém, foi suspensa recentemente por ordem do STF (Supremo Tribunal Federal).
O advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, afirmou ontem que o general Heleno não expressa a opinião do governo: "Ele não é o comandante do Exército nem o ministro da Defesa, mas um general falando individualmente". O próprio general já havia feito a ressalva de que não tinha autoridade para falar pelo governo. O futuro presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, disse que as declarações do general não "pressionam" nenhuma decisão do STF.
Hoje, às 10h, em Brasília, Lula deverá participar da comemoração ao Dia do Exército, mas, com a crise entre o Planalto e a Força Terrestre, começou uma discussão no governo para saber se será ou não mantido o anúncio do reajuste.
Segundo nota divulgada pelo deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), militar da reserva, serão concedidas três parcelas de aumento, a primeira de 8% retroativos a janeiro e mais duas de 4%. Jobim estava ontem à noite reunido com técnicos da Defesa discutindo os índices e mandou cancelar a sua ida para o Rio Grande do Sul, ao meio-dia de hoje, para visitar fábricas de equipamentos militares.


Colaborou FELIPE SELIGMAN , da Sucursal de Brasília


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