São Paulo, domingo, 18 de maio de 2008

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Elio Gaspari

Uma grande semana para a boa pintura


Francis Bacon, Lucien Freud e suas inquietantes figuras arrasaram nos leilões de arte de Nova York

QUANDO DISSERAM ao pintor inglês Francis Bacon (1909-1992) que ele era o maior pintor vivo, sua resposta foi breve: "Considerando a concorrência, isso não é um elogio". Ao preço de US$ 86 milhões, um tríptico de Bacon, pintado em 1976, acaba de se tornar o quadro mais caro de um artista contemporâneo vendido num leilão. Quem viu o primeiro "Batman" haverá de lembrar. Bacon é o autor daquele quadro que o Joker (Jack Nicholson) não deixa destruir durante seu ataque ao museu de Gotham City.
Marginal e jogador, Bacon usava lingerie feminina, maquiava-se e retocava o cabelo com graxa de sapato. Anticomunista radical, acordou numa ressaca certo de que os russos haviam invadido Londres. Noutros porres, pintou algumas de suas obras-primas.
No mesmo leilão em que Bacon valeu US$ 86 milhões, uma mulher gorda e tenebrosa, pintada por seu amigo Lucien Freud (neto do criador da marca) conseguiu US$ 33,6 milhões, tornando-se a obra mais cara de um artista vivo comprada num leilão. Freud tem 85 anos. Ele e Bacon têm uma característica comum: atravessaram a metade do século 20 sem se aproximar da arte abstrata. Faz pouco tempo foi reeditado no Brasil o livro do crítico inglês David Sylvester intitulado "Entrevistas com Francis Bacon". É uma viagem ao processo de criatividade de um grande artista.
Quem tiver meia hora de domingo para perder com Bacon e Freud pode visitá-los na internet. Melhor do que perder tempo com mentiras sobre os dossiês do Planalto. Ambos estão no sítio O Século Prodigioso. Bacon tem uma excelente página oficial mas, infelizmente, o texto é em inglês: www.francis-bacon.com.

OS MINISTROS SÃO FREGUESES DOS TRIBUNAIS

O drible pareceu fácil. Lula criou um plano de desenvolvimento da Amazônia e entregou-o ao ministro Roberto Mangabeira Unger, que transita do nada ao futuro. Fez isso porque supunha que bastava chamar a ministra Marina de "mãe do PAS" e o ego da senhora estaria amaciado. Nosso Guia se esqueceu da tenacidade das pessoas alfabetizadas aos 16 anos ou que, como Marinete, sua irmã, foram empregadas domésticas. A "metamorfose ambulante" enganou-se. Dando a impressão de que o colonialismo pernóstico do jornal inglês "The Independent" tem alguma razão: "[A Amazônia] é importante demais para ser deixada aos brasileiros".
Não tendo perdido o juízo, a ministra preferiu perder o pescoço. Feito o estrago, as patrulhas do Planalto espalharam que Marina Silva foi indelicada, pois foi-se embora sem pedir demissão. Faz tempo que Madame Natasha ensina: "Só em português que se pede demissão".
Nos outros idiomas, demissão se dá. Marina Silva exonerou o governo e nisso não houve indelicadeza.
Num sinal dos deuses, dona Marina fechou a conta no mesmo dia em que o ex-ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, foi denunciado pelo Ministério Público por gestão fraudulenta, corrupção passiva e formação de quadrilha. Seria exagero concordar com o professor Mangabeira quando ele disse que "o governo Lula é o mais corrupto da nossa história", mas Rondeau é o sétimo ministro de Lula levado à barra dos tribunais pelos procuradores da República. Seu gabinete ultrapassou a taxa de 10% de maganos acusados de malfeitorias. (O ministério de Lula já teve 65 titulares.)
Estão nos tribunais Antonio Palocci, José Dirceu, Luiz Gushiken, Humberto Costa, Benedita da Silva e o doutor Silas. Walfrido Mares Guia está denunciado por conta de práticas anteriores ao atual governo. Essa é a turma que saiu porque não podia ficar. Marina Silva é de outro plantel, o dos que foram embora porque não quiseram permanecer.

GRAMPO
No ano passado, a Polícia Federal grampeou 49 mil telefones. Como o total nacional ficou em 409 mil, de cada 100 grampos, 12 estão na jurisdição do ministro Tarso Genro.

TELEPRIVATARIA
Os comissários Guilherme Lacerda, presidente da Funcef, e Wagner Pinheiro, da Petros, não gostam que se mencione a vulnerabilidade dos fundos de pensão de empresas estatais que se envolvem com a banda empresarial da teleprivataria. Louvam suas gestões e dizem o seguinte: "Em 2003, os atuais gestores dos fundos de pensão encontraram uma situação extremamente desfavorável nos investimentos relacionados à privatização da telefonia. Não havia perspectivas de saída dos investimentos, já estava instaurado um contencioso dos quotistas com o gestor dos investimentos feitos por meio de uma estrutura complexa de governança, e a avaliação era de que eram remotas as chances de se recuperar o que foi investido na época da privatização".
Considerando-se que as teles da Viúva foram leiloadas em 1998, os doutores avisam que, durante cinco anos, seus antecessores na direção da Funcef e da Petros meteram-se em pepinos, conflitos e maus negócios. Os doutores, que hoje apadrinham a fusão da Oi/Telemar com a Brasil Telecom, acham que tudo mudou com a chegada deles.
Lacerda e Pinheiro talvez não tenham percebido, mas informaram que o índice de vulnerabilidade histórica da Funcef e da Petros está em 50%. Resta esperar mais uns cinco anos para se ouvir o que dirão seus sucessores.

A BASE DE BUSH
Em dezembro passado, Thomas Shannon, secretário-adjunto para a América Latina do Departamento de Estado, passou pelo Brasil e fez uma bonita frase: "Base militar é coisa do século passado".
Lorota. Diante da decisão do governo equatoriano de não renovar o contrato da Base de Manta, o embaixador americano em Bogotá, William Brownfield, sugeriu que a traquitana seja transferida para a Colômbia. A base de Manta é um centro de vigilância aeronaval para reprimir o tráfico de cocaína. Seus navios já foram usados para capturar embarcações que levavam imigrantes clandestinos para os Estados Unidos.
Os americanos de Manta têm o privilégio da extraterritorialidade e não podem ser processados nem julgados de acordo com as leis equatorianas.

CONTA PESADA
O projeto de política industrial de Nosso Guia inclui a criação de um Fundo de Garantia para a Construção Naval. Coisa de R$ 400 milhões, mais a promessa de R$ 50 bilhões em encomendas da Petrobras nos próximos sete anos.
Tomara que dê certo, porque esse é o terceiro programa do gênero cacifado pela geração de brasileiros que têm mais de 50 anos. O primeiro veio no governo de JK e o outro, no de Ernesto Geisel. Em nenhuma época, em nenhum país, uma só geração carregou fardo semelhante.
No projeto dos anos 70, o governo se tornou avalista de sete estaleiros. Os navios não foram construídos e as dívidas viraram papéis podres. Mais tarde, bombados pelos juros, tornaram-se moeda boa para a compra de estatais da privataria. E assim o banqueiro Julio Bozano ficou com a Usiminas, o porto de Tubarão e a Cosipa.


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