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ELIO GASPARI
Dorme-se no Rio,
acorda-se em Kubanacan
A gente finge que não está
percebendo, mas a ordem
constitucional brasileira arrisca-se a sofrer o tranco da necessidade de uma intervenção federal
no Estado do Rio de Janeiro. Pode-se ter votado em Rosinha Garotinho, pode-se até torcer pelo
seu êxito. O que não se pode é ir
dormir cedo, depois de assistir à
novela "Kubanacan", para se
acordar no dia seguinte com o
general Camacho na Secretaria
de Segurança (Humberto Martins na novela, Anthony Garotinho na vida real).
Há Estados onde os bandidos
fogem dos quartéis pela porta da
frente. Também há Estados onde
os presídios de segurança máxima recebem pizza-delivery e um
secretário de Estado visita delinquentes. Talvez haja Estados onde a Secretaria da Fazenda tenha um propinoduto que começa na Suíça, e a patuléia, por
muito esperta, faz que não sabe
onde termina. O que não há,
nunca houve, é um Estado onde
todas essas coisas acontecessem
ao mesmo tempo, numa só administração.
O que o casal Garotinho, com
suas idéias folgadas e roupas
apertadas, está fazendo ao Rio
de Janeiro é uma tristeza. O Rio
já foi governado por empreendedores como Carlos Lacerda, democratas como Negrão de Lima,
homens probos como o almirante Faria Lima. Se hoje a sua política não é a mesma, a culpa não
é só dos Garotinho. Infelizmente,
são deles o último ato e a conta.
Vale lembrar que o PT-Federal
antecipou sua opção preferencial
pelo poder em 1997, quando, no
interesse de Benedita da Silva,
impôs a candidatura de Garotinho à sua militância. Um dia alguém pesquisará o tamanho dessa transigência, na qual Lula jogou seu prestígio e defenestrou
Vladimir Palmeira em benefício
do casal. (Os adversários dos Garotinho eram chamados de "radicais".) Garotinho não estava
de todo errado em 1999, quando
chamou o PT de "partido da boquinha". O comissário José Dirceu certamente há de recordar o
que lhe disse dona Rosinha na
reunião em que se afastaram.
Rompidos, o PT-Federal e o casal Garotinho impõem à população do Rio de Janeiro a potencialização de seus defeitos. O casal
tem um prazer quase sádico de
repetir que o problema do tráfico
é federal. O PT-Federal tem um
prazer teatral em fazer de conta
que não ouve. Trata a governadora do Rio de Janeiro com a deferência que o rei da Inglaterra
dava à rainha de Tonga.
Ambos são espertos o suficiente
para saber que não estão fazendo o outro de bobo. Enganam a
escumalha, que lhes paga os salários.
O Estado do Rio de Janeiro caminha para a intervenção federal porque suas instituições estão
se esfarelando. Se dona Rosinha
fosse apenas uma governadora
incapaz de distinguir cobrança
de ICMS no destino de destino de
ICMS cobrado, um bom secretariado teria sido solução. Desdenhou esse caminho. Deu a Secretaria de Segurança ao marido,
que se julga no direito de lecionar ignorância informando que
houve homicídio até no Jardim
do Éden.
A intervenção federal -mecanismo previsto na Constituição- seria uma batata quente
para Lula. Um governo que não
sabe o que fazer com o professor
Cristovam Buarque dificilmente
saberá o que fazer com o Rio. À
primeira vista, é melhor deixar a
situação piorar muito nas mãos
de um adversário do que melhorar um pouco nas mãos de um
aliado. Esse caminho seria funcional se a eleição fosse no ano
que vem. Pena, quem acaba logo
é "Kubanacan". O Rio terá mais
três anos e meio de Rosinha Garotinho.
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