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ELIO GASPARI
A Anac quer bater na torcida da Varig
O programa Smiles tem 5,6
mi de credores (ou bobos?)
que não receberam sequer
uma palavra de conforto
A AGÊNCIA Nacional de Aviação
Civil, Anac, comporta-se como um esquadrão que durante um jogo sobe à arquibancada para
bater na torcida do time que está perdendo. Foi isso que fez seu presidente, Milton Zuanazzi. Ele classificou
os benefícios do programa de milhagem Smiles como brindes e acrescentou que se trata de "um contrato
entre as partes" que só vale enquanto
a companhia estiver em atividade.
Tudo bem, e se ela for passada adiante?
Confortando a galera que mofa nos
aeroportos porque os vôos sumiram,
Zuanazzi deu uma aula: "O usuário
tem que compreender que isso é uma
conseqüência de qualquer empresa
que está em crise". A Anac e o doutor
é que são pagos para compreender as
conseqüências da crise de uma concessionária de rotas aéreas. Uma
companhia saqueada ao longo de décadas deve R$ 5,8 bilhões (ervanário
equivalente a todas as despesas com
a agricultura familiar em 2004), cancela cerca de cem vôos em apenas
uma semana, e o doutor da agência
reguladora dá lições de compreensão
à patuléia.
O programa de crédito de milhas
da Varig tem 5,6 milhões de consumidores habilitados. Brinde é aquele
xampu que o hotel deixa no banheiro. O Smiles, como diz o próprio Zuanazzi, é um contrato. Se a Varig acabar, acontece um mico geral, da Viúva à Boeing e delas à turma do Smiles.
É o jogo jogado. A questão está em saber o que acontecerá com a carteira
da milhagem se a empresa for vendida.
O que se está mercadejando não é
uma empresa aérea, mas um bouquet de concessões de rotas, uma
propriedade do povo brasileiro. O
bem público é leiloado como coisa
particular enquanto o interesse privado de alguns milhões de pessoas é
desprezado. O crédito do Smiles é
moral. Um valor respeitado por algumas pessoas, mas nem todas. Os sábios estudam uma solução para os
credores da Varig, para seus funcionários, para a biografia dos maganos
que saquearam a empresa e dos aeroburocratas que levaram bolas por
baixo das pernas. Vale tudo, até censurar um sindicato de trabalhadores.
Como sempre, os impostos devidos à
Viúva viram sorvete. Como sempre,
o velho e bom BNDES financiará o
comprador, oferecendo-lhe ainda o
selo de garantia de suas arcas.
Falta quem demonstre algum interesse pelos passageiros que ajudaram a fazer da Varig o que ela foi. Se
há um grupo que só deu alegrias à
empresa, foi o das pessoas que juntaram milhas no programa Smiles. Não
se trata de uma escumalha incômoda, muito menos idiota.
Austrália e Brasil
Duas afinidades históricas que
aproximam o Brasil e a Austrália, a
respeito das quais as pessoas bem
educadas não gostam de falar:
1) A cachaça
Desde 1787, quando a primeira
frota inglesa, carregada com 736
ladrões e vigaristas, aportou no
Rio de Janeiro, a cidade matou a
sede dos colonizadores da Austrália. Penaram terríveis ressacas,
mas levaram mudas de cana de
açúcar para a colônia penal. Quase
todos os comboios que transportaram 160 mil desgraçados para a
Austrália fizeram escala no Rio.
2) O canibalismo
Os aborígenes australianos, assim como os índios brasileiros, comiam gente. Tudo indica que os
caetés comeram o bispo Sardinha,
mas não há registro de celebridade almoçada na Austrália. Para
quem acha que os indígenas, por
canibais, foram marcados pela inferioridade, aqui vai uma surpresa: Alexander Pearce, um irlandês
que roubara seis pares de sapatos,
fugiu de uma colônia australiana,
em 1822, com outros sete companheiros. Durante os dois meses
que andaram pelo mato inóspito,
comeram-se. Sobrou Pearce. Capturado, contou tudo, mas ninguém acreditou. Meses depois,
voltou a fugir e um outro preso teve a péssima idéia de acompanhá-lo. Quando Pearce foi apanhado,
mereceu crédito porque levava no
casaco a janta do dia.
Reserva
Toda aproximação do México
com o Mercosul será puro teatro.
Para a diplomacia do presidente
Vicente Fox, a prioridade está em
manter o Brasil longe do projeto
da Alca. Os mexicanos (e os canadenses) não gostam da idéia de um
regime que dê a Pindorama benefícios semelhantes aos que eles
desfrutam no mercado americano
por conta do Nafta.
Bancada do Gulag
Bafejado pela onipotência (e
impunidade) que a possível reeleição de Lula promete, o comissário Ricardo Berzoini sonha com
a criação da lista fechada de candidatos para a Câmara. Coisa assim: a patuléia vota no partido,
mas a caciquia é quem decide
quem vai para Brasília. Protótipo
de uma seleção petista se a novidade estivesse em vigor neste
ano:
Deputados federais por São
Paulo: João Paulo Cunha, Antonio Palocci, Professor Luizinho,
José Genoino e Angela Guadagnin. Pelo Rio de Janeiro: Marcelo
Sereno. (Roberto Jefferson viria
na lista doPTB.) Por Goiás: Delúbio Soares. Pelo Ceará: José Nobre, com sua cueca.
Geraldo Ratchett
Durante a convenção do PSDB,
em Belo Horizonte, Geraldo
Alckmin teve a companhia de Aécio Neves, José Serra, FFHH e
Tasso Jereissati. Ganhou o apelido de Mr. Ratchett. Samuel Ratchett era o milionário americano
de "Crime no Expresso Oriente",
obra-prima de Agatha Christie. O
cidadão tomou 12 facadas enquanto dormia. O detetive Hercule Poirot, tendo percebido que
o criminoso não saíra do trem,
desvendou o mistério. Seria injusto dizer como, mas certamente os companheiros de viagem de
Alckmin conhecem a história.
Na lista de passageiros do trem
havia cinco homens (noves fora
seis mulheres). Na mesa do PSDB
havia quatro grão-duques. Há um
à solta.
Tunga na gaveta
Lula e Geraldo Alckmin namoram propostas de reforma da Previdiencia que significam uma nova tunga (a terceira em dez anos)
no bolso dos trabalhadores. Falta-lhes coragem para levantar o
assunto durante a campanha.
SEU JORGE TEM UM ADMIRADOR DE PRIMEIRA
O samba "Tive razão", de
Seu Jorge, entrou na lista de
15 músicas prediletas do repórter americano Anderson
Cooper. Ficou na companhia de Charlie Parker e Nina Simone.
O prestígio de Anderson
Cooper é a melhor novidade
jornalística da televisão
americana. Tem 39 anos e
começou correndo mundo
com uma câmera na mão.
Ralou confusões na Somália, na Bósnia, em Ruanda e
no Irã. Celebrizou-se pela
ira santa com que acompanhou o estrago do furacão
Katrina para a CNN. Interpelava hierarcas empulhadores, pedindo que falassem sério. Ganhou o apelido
"emo-anchor", mas blindou
sua vida pessoal. Tem um finíssimo senso de mau humor e horror a lero-lero.
Nasceu na família Vanderbilt, do magnata das ferrovias e, como bebê, foi fotografado por Diane Arbus.
Estudou em Yale e na Universidade de Hanói.
Jorge Mário da Silva, o
Seu Jorge, nasceu em 1970,
na Baixada Fluminense, numa casa de um cômodo. Começou a vida como borracheiro. Teve um irmão assassinado numa chacina. O
de Anderson pulou do 14º
andar da cobertura da família, num bairro chique de
Nova York.
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