São Paulo, segunda-feira, 18 de junho de 2007 |
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Clã mistura público e privado em AL
Em Murici, controlada há mais de uma década pelos Calheiros, poder público favorece negócios da família
JOSÉ MASCHIO DA AGÊNCIA FOLHA, EM MURICI A família Calheiros, liderada politicamente pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, e financeiramente pelo deputado federal Olavo Calheiros Filho, ambos do PMDB-AL, comanda há três mandatos a Prefeitura de Murici. Na política local, detêm maioria na Câmara Municipal, com sete dos nove vereadores aliados ao prefeito Renan Calheiros Filho, o Renanzinho (PMDB). Até 2005, o município foi governado por Remi Calheiros, irmão do presidente do Senado, por dois mandatos consecutivos. O domínio político do clã Calheiros por mais de uma década resultou em práticas suspeitas, em flagrante uso do poder público em prol dos negócios privados da família. A Folha detectou casos em que recursos públicos serviram a interesses particulares da família. Em agosto de 2000, Murici sofreu uma grande enchente, que deixou desabrigados e fez com que o então governo FHC destinasse verbas federais para a construção de casas para os atingidos. Na mesma época, Olavo Calheiros enfrentava problemas para retirar famílias das áreas da usina Bititinga 2, hoje fazenda Boa Vista, de sua propriedade. O prefeito na época era Remi Calheiros. A solução encontrada pelos Calheiros foi "indenizar" 26 famílias com casas construídas pelo governo federal no conjunto habitacional Antenor Marinho de Melo. Petrucia Alves do Nascimento, 57, é um das pessoas que receberam casas pagas pela União. "Nós trabalhamos 15 anos na usina e seu Olavo disse que não queria a gente mais lá. Ofereceu essa casinha e a gente veio. Fazer o quê, a gente é pobre e não tinha para onde ir". Ela foi transferida para o conjunto habitacional em outubro de 2005, com outras 11 famílias. Antes, outras 14 famílias já haviam se mudado. Antônio Felismino dos Santos, 60, deixou a fazenda Boa Vista em 2004 para trabalhar na fábrica de refrigerantes Cony, da mulher de Olavo. Em 2006, a fábrica foi vendida e Santos espera desde então por uma casa no conjunto. "Eles prometeram que minha indenização vai ser uma casinha." Coleta de lixo A Folha obteve documentos que mostram outro exemplo dessa mistura entre público e privado. Em 4 de julho de 2006, a prefeitura contratou a empresa Alves Máquinas para locação de três caçambas para coleta de lixo. No contrato, publicado em 7 de julho no Diário Oficial de Alagoas, o aluguel é no valor de R$ 104 mil. A sede da empresa é na rua Durval de Gois Monteiro, 56, mesmo local que o ex-prefeito Remi usa para seu lazer. Nos fundos da empresa, há uma piscina e um salão de festas. No CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), a empresa aparece em nome de José Alves Filho, o "Zé Chaveiro", uma espécie de agregado dos Calheiros, que cuida dos animais que a família cria. Lei do silêncio Os aliados da família Calheiros na cidade -a maioria da população- adotaram a lei do silêncio em defesa do senador Renan Calheiros. Tanto os habitantes como as autoridades municipais evitam o contato com a imprensa e não comentam a crise política que envolve o senador. Um exemplo é a reação do pai do veterinário Guálter Peixoto, citado por Renan -em sua primeira versão- como o responsável pelas negociações dos animais que teria vendido para arrecadar R$ 1,92 milhões entre 2003 e 2006. Ao receber a reportagem, Manoel Peixoto, 76, disse que não sabia o endereço ou o telefone do filho, que "poderia estar em Maceió". "Você bateu em endereço errado. Eu não posso falar nada sobre esse assunto. Isso é coisa muito maior que eu. Fico mudo." Na quinta-feira, a informação na prefeitura era que Renan Calheiros Filho estava na cidade, mas que não falaria com a imprensa. Assessores disseram que o prefeito não usa celular, por causa de grampos. No sábado, a versão era que Renanzinho viajara para Recife. Um auxiliar do prefeito, que atendeu em sua casa, disse: "Vocês estão perdendo tempo. Nesta cidade, ninguém vai abrir a boca contra qualquer um dos Calheiros". Texto Anterior: PF cruza dados para analisar veracidade de notas Próximo Texto: Familiares de Renan não deram retorno aos pedidos de entrevista sobre o caso Índice |
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