São Paulo, terça-feira, 18 de setembro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

INVESTIGAÇÃO

Declarações mostram que ex-prefeito, após ser processado por improbidade, fez permuta para ficar com ações

Maluf troca imóveis por empresas, indica IR

ROBERTO COSSO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A análise das últimas cinco declarações de Imposto de Renda do ex-prefeito Paulo Maluf (PPB), obtidas pela Folha, mostra que ele trocou imóveis de sua propriedade por quotas de empresas.
Segundo identificaram especialistas ouvidos pela reportagem, uma grande operação de permuta de bens foi realizada pelo ex-prefeito em 1996, último ano dele à frente da Prefeitura de São Paulo. Nesse ano, Maluf já sofria diversas ações de improbidade administrativa, movidas pelo Ministério Público do Estado de São Paulo.
Em junho, a Folha revelou que Maluf e seis parentes dele são beneficiários de pelo menos US$ 200 milhões -mais de R$ 510 milhões- aplicados em Jersey, um paraíso fiscal no canal da Mancha.
Nenhuma das declarações de IR de Maluf informa a existência de depósitos dele no exterior.

Transação
Em 20 de dezembro de 1996, Maluf assinou "instrumento particular de permuta" por meio do qual abriu mão da propriedade de diversos imóveis em troca de ações da holding RNTL Participações, avaliadas em R$ 7,1 milhões.
O ex-prefeito transferiu a propriedade de 10% de uma área de 58.186,20 m2 entre a avenida Francisco Matarazzo e as ruas Adolfo Pinto, Tagipuru e Germaine Burchard, na zona oeste de São Paulo; de 10% de uma área de 5.249,05 m2, na avenida Francisco Matarazzo; e de 10% de uma área de 104 m2, também na avenida Francisco Matarazzo.
Maluf também cedeu quotas das empresas Santabar Comercial e Marieste Comercial, além de ações da Imobiliária Santa Therezinha S/A. As empresas eram avaliadas em R$ 2,7 milhões no Imposto de Renda do ex-prefeito.
A permuta foi feita com Roberto Maluf e sua mulher, Lina Saigh Maluf, com Nelly Maluf Jafet, Therezinha Maluf Chamma e Nelly Maluf Chama.
Na declaração de Imposto de Renda de Maluf referente ao ano-base de 1997, aparecem as ações da RNTL Participações S/C Ltda. declaradas em nome dele e de sua mulher, Sylvia Maluf.
A declaração referente a 1998 mostra que as ações da RNTL Participações foram incorporadas por outra holding, a Pasama Participações, também de Maluf.
O negócio permitiu ao ex-prefeito tomar o controle total da Eucatex, empresa fundada por seu irmão Roberto Maluf, há 50 anos.
Roberto era o principal quotista da RNTL, que controlava 51,5% das ações com direito a voto da Eucatex. Maluf e seus filhos controlavam os outros 48,5% por meio da Pasama.
A transação foi realizada por causa dos problemas de relacionamento entre Flávio Maluf (filho do ex-prefeito) e Roberto Maluf (irmão de Paulo). Flávio assumiu a presidência da Eucatex em junho de 1996 e fez reformas administrativas que descontentaram o tio, que ficou na presidência do Conselho de Administração.

Justiça eleitoral
O valor do patrimônio de Maluf informado ao fisco é bem menor que o valor informado à Justiça eleitoral. Em 2000, quando registrou sua candidatura à Prefeitura de São Paulo, declarou possuir R$ 74.967.594,69.
A grande diferença entre as duas informações ocorre porque a lei tributária exige a declaração dos bens pelo valor histórico. A Justiça eleitoral admite também valores estimados de mercado.
A casa de Maluf, por exemplo, na rua Costa Rica, é declarada por R$ 4,7 milhões à Justiça eleitoral e por R$ 1,8 milhão ao fisco.
O promotor Nilo Spinola Salgado Filho disse à Folha que qualquer operação com bens de réus em ações de improbidade administrativa que levem à insolvência do acusado são nulas se forem realizadas após a citação no processo. Essa figura jurídica, chamada de "fraude à execução", é o principal argumento usado por juízes que negam o bloqueio de bens em ações de improbidade -justamente pela possibilidade de, constatada eventual má-fé, considerar nulas as transações.
Maluf sofre ações de improbidade desde 1994. Já foi condenado em primeira instância em mais de dez ações, uma delas em mais de R$ 1 bilhão. Apenas uma condenação é definitiva, e o ex-prefeito já sofre execução para devolver R$ 500 mil aos cofres públicos.
Maluf teve o sigilo fiscal quebrado pela Justiça, no fim do mês passado. A declaração de IR dele poderá ser utilizada para a avaliação de seus bens na ação de execução que ele sofre, movida pela Promotoria da Cidadania.



Texto Anterior: MST: Liminar determina retirada de fazenda
Próximo Texto: Outro lado: Advogado de ex-prefeito diz que operação é "perfeitamente legítima"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.