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RACISMO
Decisão contra Siegfried Ellwanger, acusado de propagar idéias anti-semitas, deve servir de referência para casos semelhantes
Por 8 a 3, STF mantém condenação de editor de livros
SILVANA DE FREITAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu ontem, por 8 votos
contra 3, que propagar idéias anti-semitas por meio da edição de
livros é crime de racismo e manteve a condenação do editor do Rio
Grande do Sul Siegfried Ellwanger, acusado de incitar o ódio contra o povo judeu.
Embora os ministros tenham levado em conta questões específicas desse caso, como o próprio
teor das obras editadas, eles firmaram o entendimento do tribunal sobre o tema. Por isso, a decisão servirá de referência para
eventuais processos semelhantes.
O ministro Marco Aurélio de
Mello disse que esse foi o julgamento mais importante de que ele
participou em 13 anos no STF. Para o presidente do tribunal, Maurício Corrêa, a decisão é a mais
"emblemática do ponto de vista
dos direitos civis" desde a promulgação da Constituição de 88.
O processo foi julgado em cinco
sessões plenárias, desde dezembro de 2002, e adiado sucessivamente por pedidos de vista. Ontem votaram Marco Aurélio de
Mello e Sepúlveda Pertence.
O advogado de Ellwanger, Werner Becker, argumentou no pedido de habeas corpus que os judeus não constituem raça e, por
isso, o anti-semitismo não seria
racismo. O STF apreciou essencialmente duas questões: se os judeus constituem ou não uma raça
e se publicar livros com idéias anti-semitas representa simples
exercício da liberdade de expressão ou extrapola esse direito.
Os três votos favoráveis à anulação da sentença de condenação
foram de Moreira Alves, que se
aposentou em abril último, Carlos
Britto e Marco Aurélio.
Alves, que foi o relator do habeas corpus, acolheu a tese de que
judeu não é raça. Para os outros
dois, o princípio constitucional da
liberdade de expressão pode legitimar a edição de livros, ainda que
neles haja idéias reprováveis.
Em defesa da absolvição, Marco
Aurélio citou a polêmica declaração do ministro da Segurança Alimentar, José Graziano, contra a
migração de nordestinos para São
Paulo, classificando-a de "cena
constrangedora para o governo".
"Inexistem no Brasil os pressupostos sociais e culturais aptos a
tornar um livro de cunho preconceituoso contra o povo judeu verdadeiro perigo atentatório à dignidade dessa comunidade."
A Constituição estabelece o racismo como crime imprescritível
e inafiançável (artigo 5º, inciso
XLII). Se fosse acusado de outro
tipo de discriminação, Ellwanger
seria beneficiado pela prescrição
do crime. O Ministério Público o
acusou de incitar ódio, desprezo e
preconceito contra judeus. A denúncia é de 1991. Inicialmente a 8ª
Vara da Justiça Criminal de Porto
Alegre o absolveu. Mas o TJ-RS
acolheu um recurso do Ministério
Público e o condenou a dois anos
de prisão, convertidos em prestação de serviços comunitários.
Alguns dos livros editados são
"O Judeu Internacional", de
Henry Ford, "Hitler - Culpado
ou Inocente?", de Sérgio Oliveira,
e "Holocausto judeu ou alemão
- Nos bastidores da mentira do
século", dele mesmo. Para julgar
o habeas corpus, muitos ministros leram algumas dessas obras.
"A Justiça puniu exemplarmente alguém que fomenta o ódio e o
preconceito, que, além de ofensivo e imoral, é proibido pela Constituição", disse Henry Sobel, presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista.
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