São Paulo, domingo, 18 de setembro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ CONEXÃO FLORIANÓPOLIS

Najun Turner, que atuou com Collor, seria dono de empresa envolvida com Marcos Valério

PF investiga elo entre PT e doleiro da Operação Uruguai

JANAÍNA LEITE
MARIO CESAR CARVALHO

DA REPORTAGEM LOCAL

A Polícia Federal investiga se o doleiro que se tornou símbolo do desespero final do ex-presidente Fernando Collor, o uruguaio Najun Turner, atuou no esquema que o empresário Marcos Valério de Souza criou para alimentar o caixa dois do PT. O elo entre Turner e Valério seria uma empresa de Florianópolis, a Natimar, que opera no mercado de ouro e de dólar e foi usada para fazer pagamentos a deputados do PL.
A Polícia Federal tem indícios de que o doleiro pode ser o verdadeiro dono da Natimar. A mulher de Turner, Deusa Maria da Costa Silva, aparece em uma lista de pessoas que receberam dinheiro da Natimar, apresentada à CPI dos Correios pela corretora Bônus-Banval. O filho do doleiro, Uri Flato, também consta da relação. Deusa Maria recebeu R$ 117,8 mil na conta que mantém na agência do Banco Itaú no Itaim Bibi, zona oeste de São Paulo. Flato recebeu R$ 6 mil da Natimar.
A Bônus-Banval foi a corretora que fez pagamentos do PT ao PL.
Turner está preso desde 31 de março deste ano, após ser condenado a dez anos de prisão por crimes contra o sistema financeiro. Ficou conhecido em 1992, quando participou da montagem da Operação Uruguai, que tentava livrar o então presidente Fernando Collor do impeachment. Assessores do ex-presidente inventaram um empréstimo US$ 3,7 milhões para tentar acobertar o dinheiro do esquema PC.
Os registros da Natimar na Junta Comercial de Santa Catarina apontam o argentino Carlos Alberto Quaglia e a brasileira Nathalie Quaglia Ibanes como sócios-administradores da empresa. A PF desconfia que sejam laranjas.
Quaglia já foi condenado pela Justiça Federal a cinco anos de prisão pelo envio ilegal de US$ 990.319 e recorreu da sentença. Responde, também, a outros quatro processos, todos por remessa ilegal de dólares para o exterior.
Num dos processos, de 2001, Quaglia é co-réu junto com Najun Turner e Simon Azario Flato Turner. Os Turner são acusados pela remessa ilegal de R$ 165,2 milhões em apenas cinco meses de 2000.
Eles conseguiram enviar o dinheiro depois de uma sentença do juiz João Carlos da Rocha Mattos, que foi anulada posteriormente por suspeita de que a decisão fora obtida mediante pagamento.
Em depoimento à polícia, Enivaldo Quadrado, sócio da Bônus-Banval, contou que Marcos Valério usava a Natimar para investir em ouro e na BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros).
Contratada pela Bônus-Banval para uma auditoria nas contas da corretora, a Bordin Consultores identificou que duas empresas de Valério (Tolentino e Mello e 2S Participações) depositaram R$ 6,5 milhões na contacorrente que a Natimar mantinha na Bônus-Banval. O dinheiro, dividido em nove depósitos, feitos entre 26 de abril e 24 de maio de 2004, era destinado a aplicações em ouro físico e na BM&F.
O investimento era realizado em nome da Natimar. Quando o dinheiro voltava da BM&F, ia para a contacorrente da empresa catarinense na Bônus-Banval. Segundo Quadrado, o sócio-diretor da Natimar emitia cartas pedindo que fossem realizadas transferências em favor de terceiros, indicados por Marcos Valério. Esses extratos foram entregues à PF.
O volume de recursos movimentado pela Natimar é grande -Quaglia reconhece ter recebido US$ 14 milhões em empréstimos do exterior. A empresa, no entanto, avisou ao BC (Banco Central) que poderia receber US$ 49,4 milhões (cerca de R$ 113 milhões).
Foram sete registros entre fevereiro de 2003 e abril de 2005. Segundo o BC, o dinheiro vinha de duas offshores -a Discovery, do Paraguai, e a Arcoman Trading, do Uruguai.
O registro funciona como uma autorização prévia do BC. A diferença entre os US$ 49,4 milhões registrados no BC e os US$ 14 milhões reconhecidos pelo argentino tem uma explicação simples -algumas operações autorizadas podem não ter se concretizado.
O problema é que a sede da Natimar não combina com a de uma empresa que recebe seja US$ 14 milhões ou US$ 49,4 milhões. A empresa funciona numa casa de classe média baixa no bairro do Rio Vermelho, em Florianópolis, que o próprio dono da empresa define como "modesta".
Além disso, Quaglia é o único funcionário da Natimar e não tem telefone celular. A filial em São Paulo funciona num prédio que abriga empresas virtuais na região da avenida Nove de Julho. O aluguel de um conjunto custa cerca de R$ 1.500. É comum que os sócios da Natimar fiquem até três meses sem aparecer por lá.


Colaborou SHEILA D'AMORIM, da Sucursal de Brasília

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