São Paulo, terça-feira, 18 de outubro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ FUNDOS DE PENSÃO

Lúcio Funaro admite ter fundado Guaranhuns, mas diz que repassou a empresa em 2001

CPI atira para o lado errado, afirma corretor investigado

MARIO CESAR CARVALHO
JANAÍNA LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

O economista Lúcio Bolonha Funaro foi eleito o inimigo número um da CPI dos Correios. É acusado de ter dado um prejuízo de R$ 100 milhões a fundos de pensão, é apontado como o dono oculto da Guaranhuns, empresa que o lobista Marcos Valério teria usado para repassar R$ 7 milhões ao PL, é chamado de doleiro e considerado operador de Ricardo Sérgio, ex-tesoureiro do PSDB.
Em sua primeira entrevista, Funaro nega tudo: diz que não fez negócios com fundos de pensão, que já vendeu a Guaranhuns, nome similar ao da cidade onde nasceu o presidente Lula (Garanhuns, em Pernambuco), e que é só amigo de Ricardo Sérgio.
Afirma que se tornou alvo porque o seu sucesso incomoda o presidente da BM&F (Bolsa Mercantil e de Futuros), Edmir Pinto. Aos 31 anos, seu patrimônio é de cerca de R$ 15 milhões.
Segundo Funaro, a BM&F faz o que chama de "um jogo de despiste", no qual se misturam interesses políticos e comerciais.
Leia os principais trechos:
 

Folha - O sr. é o dono oculto da Guaranhuns?
Lúcio Bolonha Funaro -
Não. Eu fundei a Guaranhuns em 1999 e em 2001 eu a vendi para o José Carlos Batista que, ao contrário do que falam, é um profissional experimentado do mercado.

Folha - De onde o sr. tirou o nome Guaranhuns?
Funaro -
Foi uma casualidade. Eu estava de avião e passei por cima da cidade. Quando fui criar a empresa, me lembrei do nome que havia visto naquele mapinha do avião. Foi em 1999, o primeiro ano da reeleição do Fernando Henrique, e eu nem sabia onde o Lula tinha nascido. Eu não tenho nada a ver com o PT nem com nenhum outro partido.

Folha - Mas o sr. é amigo do Ricardo Sérgio?
Funaro -
Eu conheci o Ricardo Sérgio em 2003. Jogava tênis com ele. É um cara muito inteligente, mas nunca tive nenhum tipo de negócio financeiro com ele. Se 10% do que falam de mim fosse verdade, eu acho que deveria me candidatar a presidente do Brasil. Falam que eu mandava no PSDB na época do Ricardo Sérgio, que eu mando no governo Lula.

Folha - Falam que o sr. é caixa dois do Garotinho.
Funaro -
Não tenho nenhuma relação com o PMDB do Rio.

Folha - Mas o sr. fez negócios com Valdemar Costa Neto.
Funaro -
Não. Conheço o ex-deputado e temos amigos comuns.

Folha - O sr. é doleiro?
Funaro -
Não. E acho que a maior prova de que não sou doleiro é que meu nome não foi citado na CPI do Banestado, a maior investigação sobre doleiros.

Folha - Por que o nome do sr. foi associado aos fundos de pensão?
Funaro -
Estão vinculando meu nome porque sabem que não vão encontrar nada. A CPI, em vez de atirar no lado certo, atira no lado errado e vai acabar não descobrindo o que tem de descobrir.

Folha - E o que a CPI teria para descobrir?
Funaro -
A CPI teria que descobrir quem é, realmente, que opera os fundos de pensão. Ou se tem fraudes nos fundos de pensão ou se tem problema na SPC [Secretaria de Previdência Complementar]. Eles não estão fazendo isso.

Folha - Como seria possível rastrear eventuais operações irregulares com fundos de pensão?
Funaro -
É muito fácil rastrear isso. O presidente da CPI devia convocar o superintendente da BM&F, Edmir Pinto, e pedir que ele abrisse, efetivamente, todas as operações que ele acha que têm problemas. O que não pode acontecer é o que está acontecendo: vincular que eu ganhei e que outro fundo de pensão perdeu. Por que não vincula quais foram as operações do Banco Santos que deram prejuízo para fundos de pensão? Por que ele não abre essa caixa preta? É preciso olhar a caixa preta da Safic Corretora, que era de um conselheiro da BM&F e quebrou. Deixou um rombo no mercado, lesou um fundo da BM&F. Por que ele não abre a caixa preta de todas aquelas operações de opção flexíveis sem garantias que têm na BM&F? Por que ele não abre o problema de CPR [Célula de Produtor Rural] do Banco Santos? O Edmir devia se preocupar mais com a instituição BM&F, com a credibilidade dela, que está sendo seriamente afetada, do que com a minha pessoa. Eu abro mão do sigilo de todas as operações minhas pessoais, de todas as minhas empresas, autorizo a BM&F a divulgar todas. É muito mais fácil para a BM&F tomar esse tipo de atitude que ela está tomando, de prejudicar as corretoras pequenas. Por que não falam das corretoras grandes, como o caso que envolveu a Corretora Ipanema, o Santander?

Folha - O que tem nessa Safic?
Funaro -
Essa corretora administrava um pedaço do fundo da BM&F e quebrou. Eu acho que a BM&F devia se preocupar com a Santos Corretora de Valores e mandar uma carta me agradecendo porque eu socorri uma corretora, a Bônus-Banval, num dia que teve risco sistêmico.

Folha - O sr. sente-se perseguido pela BM&F?
Funaro -
A BM&F sempre quis vincular o meu nome ao do Naji Nahas, dizendo que eu operava para ele. Só que isso não corresponde à realidade. Nenhuma corretora que eu operei deixou um centavo de prejuízo. Ele divulga operações que eram minhas como sendo operações que na contraparte têm fundações. Mas não existe nenhum procedimento por parte da CVM até agora contra mim ou alguma empresa da qual eu participe. Nem existe investigação da PF ou do Ministério Público em que eu tenha sido notificado. O que acho que está ocorrendo é uma perseguição por eu ter ganho dinheiro no mercado.

Folha - Pelo que o sr. falou, a CPI acirrou a disputa entre corretoras.
Funaro -
Nós vivemos num mercado de corretagem que é extremamente prostituído, com altas taxas de devoluções por parte das corretoras para os clientes. Essas situações levam à disputa animalesca do cliente e isso levou a essa baixa de corretagem.
Acontecem duas coisas graves: o vazamento de informações sigilosas e vinculações de operações que não têm nada a ver uma com a outra. Pode ser que as informações tenham sido vazadas por parte da BM&F, da CVM ou da CPI. Cada um tem seu interesse.

Folha - Qual o interesse da BM&F?
Funaro -
É interesse político e comercial. É um jogo de despiste. A BM&F tem interesse em pegar algumas corretoras e falar "essas aqui são as culpadas" e tirar outras que deveriam estar no foco.

Folha - Não falta regulamentação para as corretoras?
Funaro -
O que falta é fiscalização. Por que não faz leilão de título público por meio de uma tela que toda corretora tenha? Oscilações maiores que 0,5% no preço unitário são obrigadas a ir para o leilão, marcado com uma hora de antecedência.

Folha - Isso reduz manipulação?
Funaro -
É lógico. Vamos supor que você tivesse pré-acordado que vai vender um título a R$ 2, quando ele vale R$ 6. Todo mercado ia ver. Você acha que o mercado ia deixar passar o título por R$ 2 se ele vale R$ 6?


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