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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ FUNDOS DE PENSÃO
Lúcio Funaro admite ter fundado Guaranhuns, mas diz que repassou a empresa em 2001
CPI atira para o lado errado, afirma corretor investigado
MARIO CESAR CARVALHO
JANAÍNA LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
O economista Lúcio Bolonha
Funaro foi eleito o inimigo número um da CPI dos Correios. É acusado de ter dado um prejuízo de
R$ 100 milhões a fundos de pensão, é apontado como o dono
oculto da Guaranhuns, empresa
que o lobista Marcos Valério teria
usado para repassar R$ 7 milhões
ao PL, é chamado de doleiro e
considerado operador de Ricardo
Sérgio, ex-tesoureiro do PSDB.
Em sua primeira entrevista, Funaro nega tudo: diz que não fez
negócios com fundos de pensão,
que já vendeu a Guaranhuns, nome similar ao da cidade onde nasceu o presidente Lula (Garanhuns, em Pernambuco), e que é
só amigo de Ricardo Sérgio.
Afirma que se tornou alvo porque o seu sucesso incomoda o
presidente da BM&F (Bolsa Mercantil e de Futuros), Edmir Pinto.
Aos 31 anos, seu patrimônio é de
cerca de R$ 15 milhões.
Segundo Funaro, a BM&F faz o
que chama de "um jogo de despiste", no qual se misturam interesses políticos e comerciais.
Leia os principais trechos:
Folha - O sr. é o dono oculto da
Guaranhuns?
Lúcio Bolonha Funaro - Não. Eu
fundei a Guaranhuns em 1999 e
em 2001 eu a vendi para o José
Carlos Batista que, ao contrário
do que falam, é um profissional
experimentado do mercado.
Folha - De onde o sr. tirou o nome
Guaranhuns?
Funaro - Foi uma casualidade.
Eu estava de avião e passei por cima da cidade. Quando fui criar a
empresa, me lembrei do nome
que havia visto naquele mapinha
do avião. Foi em 1999, o primeiro
ano da reeleição do Fernando
Henrique, e eu nem sabia onde o
Lula tinha nascido. Eu não tenho
nada a ver com o PT nem com nenhum outro partido.
Folha - Mas o sr. é amigo do Ricardo Sérgio?
Funaro - Eu conheci o Ricardo
Sérgio em 2003. Jogava tênis com
ele. É um cara muito inteligente,
mas nunca tive nenhum tipo de
negócio financeiro com ele. Se
10% do que falam de mim fosse
verdade, eu acho que deveria me
candidatar a presidente do Brasil.
Falam que eu mandava no PSDB
na época do Ricardo Sérgio, que
eu mando no governo Lula.
Folha - Falam que o sr. é caixa
dois do Garotinho.
Funaro - Não tenho nenhuma
relação com o PMDB do Rio.
Folha - Mas o sr. fez negócios com
Valdemar Costa Neto.
Funaro - Não. Conheço o ex-deputado e temos amigos comuns.
Folha - O sr. é doleiro?
Funaro - Não. E acho que a
maior prova de que não sou doleiro é que meu nome não foi citado
na CPI do Banestado, a maior investigação sobre doleiros.
Folha - Por que o nome do sr. foi
associado aos fundos de pensão?
Funaro - Estão vinculando meu
nome porque sabem que não vão
encontrar nada. A CPI, em vez de
atirar no lado certo, atira no lado
errado e vai acabar não descobrindo o que tem de descobrir.
Folha - E o que a CPI teria para
descobrir?
Funaro - A CPI teria que descobrir quem é, realmente, que opera
os fundos de pensão. Ou se tem
fraudes nos fundos de pensão ou
se tem problema na SPC [Secretaria de Previdência Complementar]. Eles não estão fazendo isso.
Folha - Como seria possível rastrear eventuais operações irregulares com fundos de pensão?
Funaro - É muito fácil rastrear isso. O presidente da CPI devia convocar o superintendente da
BM&F, Edmir Pinto, e pedir que
ele abrisse, efetivamente, todas as
operações que ele acha que têm
problemas. O que não pode acontecer é o que está acontecendo:
vincular que eu ganhei e que outro fundo de pensão perdeu. Por
que não vincula quais foram as
operações do Banco Santos que
deram prejuízo para fundos de
pensão? Por que ele não abre essa
caixa preta? É preciso olhar a caixa preta da Safic Corretora, que
era de um conselheiro da BM&F e
quebrou. Deixou um rombo no
mercado, lesou um fundo da
BM&F. Por que ele não abre a caixa preta de todas aquelas operações de opção flexíveis sem garantias que têm na BM&F? Por que
ele não abre o problema de CPR
[Célula de Produtor Rural] do
Banco Santos? O Edmir devia se
preocupar mais com a instituição
BM&F, com a credibilidade dela,
que está sendo seriamente afetada, do que com a minha pessoa.
Eu abro mão do sigilo de todas as
operações minhas pessoais, de todas as minhas empresas, autorizo
a BM&F a divulgar todas. É muito
mais fácil para a BM&F tomar esse tipo de atitude que ela está tomando, de prejudicar as corretoras pequenas. Por que não falam
das corretoras grandes, como o
caso que envolveu a Corretora
Ipanema, o Santander?
Folha - O que tem nessa Safic?
Funaro - Essa corretora administrava um pedaço do fundo da
BM&F e quebrou. Eu acho que a
BM&F devia se preocupar com a
Santos Corretora de Valores e
mandar uma carta me agradecendo porque eu socorri uma corretora, a Bônus-Banval, num dia
que teve risco sistêmico.
Folha - O sr. sente-se perseguido
pela BM&F?
Funaro - A BM&F sempre quis
vincular o meu nome ao do Naji
Nahas, dizendo que eu operava
para ele. Só que isso não corresponde à realidade. Nenhuma corretora que eu operei deixou um
centavo de prejuízo. Ele divulga
operações que eram minhas como sendo operações que na contraparte têm fundações. Mas não
existe nenhum procedimento por
parte da CVM até agora contra
mim ou alguma empresa da qual
eu participe. Nem existe investigação da PF ou do Ministério Público em que eu tenha sido notificado. O que acho que está ocorrendo é uma perseguição por eu
ter ganho dinheiro no mercado.
Folha - Pelo que o sr. falou, a CPI
acirrou a disputa entre corretoras.
Funaro - Nós vivemos num mercado de corretagem que é extremamente prostituído, com altas
taxas de devoluções por parte das
corretoras para os clientes. Essas
situações levam à disputa animalesca do cliente e isso levou a essa
baixa de corretagem.
Acontecem duas coisas graves:
o vazamento de informações sigilosas e vinculações de operações
que não têm nada a ver uma com
a outra. Pode ser que as informações tenham sido vazadas por
parte da BM&F, da CVM ou da
CPI. Cada um tem seu interesse.
Folha - Qual o interesse da BM&F?
Funaro - É interesse político e comercial. É um jogo de despiste. A
BM&F tem interesse em pegar algumas corretoras e falar "essas
aqui são as culpadas" e tirar outras que deveriam estar no foco.
Folha - Não falta regulamentação
para as corretoras?
Funaro - O que falta é fiscalização. Por que não faz leilão de título público por meio de uma tela
que toda corretora tenha? Oscilações maiores que 0,5% no preço
unitário são obrigadas a ir para o
leilão, marcado com uma hora de
antecedência.
Folha - Isso reduz manipulação?
Funaro - É lógico. Vamos supor
que você tivesse pré-acordado
que vai vender um título a R$ 2,
quando ele vale R$ 6. Todo mercado ia ver. Você acha que o mercado ia deixar passar o título por
R$ 2 se ele vale R$ 6?
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