São Paulo, domingo, 18 de dezembro de 2005

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ELIO GASPARI

Um livro muito bom: "O Mundo é Plano"

Um negócio da China: começar 2006 lendo "O Mundo é Plano", do jornalista Thomas Friedman, do "New York Times". É uma cápsula de 460 páginas para um vôo por um caminho novo, inteligente e empreendedor.
"O Mundo é Plano" mostra que há uma nova globalização por aí. Ela achatou o planeta e explodiu as noções de distância, tempo e trabalho. Recriou a China e a Índia. Ao contrário da globalização financeira dos anos 90, nessa há lugar para brasileiros. Na primeira, ganhava quem tinha dinheiro. Agora, pode ganhar quem tem educação, quer aprender mais e acredita no seu trabalho.
A contabilidade de um mercado no Texas é processada em Bangalore, na Índia. A enciclopédia aberta Wikipedia recebe mais consultas que a Britannica. Um garoto de Bangu e uma menina de Bancoc vêem, ao mesmo tempo, dez preciosos desenhos de Van Gogh expostos em Nova York. O buscador Google atende a 1 bilhão de consultas por dia. O sistema de voz sobre o IP transformou as tarifas de ligações interurbanas em micos de operadoras anacrônicas, como as brasileiras.
O mundo de Friedman é plano, mas nele a familiaridade com a língua inglesa é uma cordilheira de obstáculos. Como o inglês não será substituído pelo português, pouco há a fazer. Na província de Dalian, na China, há 22 universidades, com 200 mil estudantes. Todos, até mesmo os alunos de letras, passam um ano estudando inglês (ou japonês) e ciência da computação.
Friedman prenuncia um mundo dirigido pelos zippies. Esse personagem está em qualquer cidade do mundo, tem entre 15 e 25 anos e uma fé absoluta na sua capacidade. O hippie dos anos 60 era americano ou europeu. O zippie de hoje é indiano, chinês ou russo. É nessa hora que se abre espaço para Pindorama. Se os jovens brasileiros começarem a brigar para que haja mais computadores em suas casas, suas escolas e seus locais de trabalho, a brincadeira terá começado.
Como Friedman é antes de tudo um repórter, a primeira metade do livro, descritiva, é melhor que a segunda, catequética. Mesmo quando ele diz coisas com as quais não se concorda, é muito melhor lê-lo do que ouvir um companheiro chamando caixa dois de "recursos não contabilizados".
"O Mundo é plano" não arruma emprego para os seus leitores, mas ensina como eles acabam, onde reaparecem e como reapareceram.

Milionário malcriado
Na tarde de terça-feira, o ministro Antonio Palocci se reuniu por duas horas na sede da Fiesp com 15 grandes empresários. Pelo menos dez pegaram pesado nas perguntas.
Benjamin Steinbruch, da Companhia Siderúrgica Nacional, comparou o comportamento de Palocci ao de um "autista". Repetiu a palavra mais duas vezes. O ministro absorveu o insulto.
Problema dele. Steinbruch foi impertinente e mal-educado. Se a diretoria da Fiesp não consegue dar modos aos seus $ócio$, talvez seja melhor franquear suas conversinhas conventiculares ao público em geral.
Sob a luz do sol, cada um diz o que quer e, quando é o caso, houve o que não quer.

Natal barato
Um veterano conhecedor do comércio das grandes cidades brasileiras desconfia que o Natal deste ano traz uma lição: "Quem gastava R$ 100 vai gastar R$ 70 e quem gastava R$ 20 está gastando R$ 30. O PT deveria mandar filmar a superlotação das ruas de comércio popular".

O Lula de Nunes
O livro "A Esperança Estilhaçada - Crônica da Crise que Abalou o PT e o Governo Lula", de Augusto Nunes, assemelha-se à Presidência de "nosso guia". Ambos dão aos passageiros as emoções de um trem fantasma. Enquanto o jornalista encanta os leitores pela forma como usa o idioma, o outro massacra-o. O trem fantasma de Nunes tem outras duas vantagens sobre o de Lula. Por piores que sejam as histórias que conta, há bom humor na narrativa e quando se chega à página 124 a viagem acaba. Com Lula ela irá, no mínimo, até o Réveillon de 2007.

A voz de Dirceu
Quem ouviu o ex-ministro José Dirceu falar de seu livro de lembranças assegura que, até a semana passada, o senador Aloizio Mercadante ficava mal na fotografia.
Lula parece intacto.
Tarso tardio
O grão-companheiro Tarso Genro foi em cima de José Dirceu. Escreveu que ele representou uma direção "unipessoal e mítica". Num bom exemplo do dialeto genrês, argumentou: "O ex-ministro (...) agiu sempre de forma auto-referente e com baixa capacidade de escuta".
Tarso sustenta que o maior erro de Dirceu foi ter contribuído para a construção do mito do "grande estrategista". A patranha poderia ter sido contraditada, mas muita gente boa achou melhor não mexer com o ego do comissário.
Um exemplo: em dezembro de 2003, Dirceu anunciou que o governo patrocinaria uma reforma universitária durante a qual "o pau vai comer". Diante dessa impropriedade unipessoal e mítica, Tarso Genro disse o seguinte: "Ele usou uma metáfora que é muito comum no nosso meio de debates internos do partido. É uma metáfora sadia".

Detergente Cerqueira
O advogado Marcelo Cerqueira propõe um engenhoso desinfetante para a campanha eleitoral do ano que vem. Trata-se de oferecer aos eleitores um acordo interpartidário pelo qual cada candidato se compromete a manter uma conta bancária pública, com o registro on-line das doações que vier a receber. Além disso, obriga-se a não realizar shows eleitorais nem distribuir brindes. Quem quebrasse a palavra seria exposto ao público e ao julgamento de seu partido. Para isso, bastam vontade, papel e caneta.

Marquetagem e petróleo não se misturam

O comissariado do Planalto e Duda (Dusseldorf) Mendonça planejam uma grande campanha de publicidade. Querem comemorar a produção de 1,85 milhão de barris diários de petróleo que levará o Brasil à marca histórica da auto-suficiência.
Esse é o resultado de um esforço de quase um século e de 31 anos de exploração da província petrolífera do litoral de Campos. Como Lula tende a achar que a história do Brasil começou no dia 1º de janeiro de 2003, deve ser lembrado de que seu mandarinato equivale a cerca de 6% dos 53 anos de vida da Petrobras.
O campo de Garoupa foi descoberto duas semanas antes da eleição de 1974, numa época em que o Brasil sofria os efeitos do primeiro choque do petróleo. O presidente Ernesto Geisel se reuniu, no dia 5 de novembro, com técnicos da empresa no palácio da Alvorada. Os engenheiros disseram que os testes não estavam concluídos e as 16 pessoas que participaram do encontro mantiveram o assunto em segredo. Dez dias depois, o governo tomou uma surra na eleição. No final de novembro, quando Geisel recebeu dados convincentes, anunciou a descoberta de uma das maiores reservas de petróleo do mundo. A oposição achou que era propaganda enganosa, para esvaziar o resultado eleitoral.


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